
Por: João Vicente Machado Sobrinho;
A onda política em direção ao colapso que arrasta com ela o pluripartidarismo brasileiro, não é coisa do acaso, nem pode ser atribuída às exigências geográficas das dimensões do Brasil enquanto país, nem tampouco à sua complexidade social.
O colapso iminente, é o resultado da escolha de modelos políticos equivocados, que simplificam e reduzem o papel dos partidos políticos, transformando-os em instrumento de negociações, de governança ou de poder. Essa prática perniciosa, esvazia a identidade das agremiações partidárias, desviando-as de quaisquer compromissos estruturais com a democracia.
Aquilo que deveria ser um sistema de representação plural, converteu-se em compadrio e balcão de negócios permanente. As casas legislativas e o poder executivo em todas as instancias, além dos demais poderes de estado foram transformadas em um comércio. Muitos agentes políticos, com a certeza da impunidade, operam sob a lógica da barganha, do favor e da conveniência imediata.

O mais intrigante nisso tudo é que, apesar do número exagerado de partidos – o Brasil tem vinte e nove – todos eles, em essência, são rigorosamente iguais. Ou seja, só mudam as siglas, os pressupostos políticos e ideológicos, são rigorosamente os mesmos.
Partido político, por definição, é uma organização burocrática que tem por objetivo conquistar o poder do Estado. Ou seja, são partes da sociedade que convergem em pensamento, que legitimadas por meio de ideologia e representação, devem expressar os interesses das classes sociais às quais pertencem e propõem representar. Os partidos liberais podem ser classificados como: burgueses, social democratas e fascistas. Enquanto partidos liberais que são, operam dentro de um arremedo de democracia representativa e estão sempre buscando ir além dela. Para tanto usam o artifício do golpe de Estado, para conquistar o poder de forma autoritária e ditatorial.
A classificação das agremiações partidárias em esquerda, centro e direita, ao contrário do senso comum de que é uma ideia de comunista, foi originada por ocasião da Assembleia Nacional, realizada após a Revolução Francesa. Essa terminologia, na época contemporânea ainda pertinente porem, mesmo na complexidade moderna, exige uma análise mais detalhada. A origem histórica dos partidos políticos modernos, formados no século 19 na Europa, influenciou sobremaneira o modelo dos partidos políticos dos países de capitalismo tardio, como é caso do Brasil.

Existem também alguns países que possuem apenas um partido legal. Isso acontece, quando uma parte amplamente majoritária da população conquista o poder de fato, através de uma revolução, e transforma-o em poder de direito. Então, optam por um modelo político de gestão em que a ideologia política e econômica passa a ser única, como acontecia na Rússia e agora acontece: na China, na Coreia do Norte, no Vietnã, no Laos, além de nações como Uzbequistão e Turcomenistão.
A ideia do partido único, ao contrário de ser uma ideia socialista como é senso comum, nasceu de forma pioneira e embrionária na Revolução do México em 1910. As revoluções nem sempre têm como lema ideias socialistas, como foi o caso da revolução mexicana, para a qual e por oportuno abriremos um parêntese seguido, de uma breve reflexão.
Ora, a obra prima de Karl Marx que é o livro Das Capital – O Capital – se compõe de três Volumes. O lançamento do Vol. I de 1867 foi lançado pelo próprio Marx. Somente foi completado, em lançamentos póstumo feitos por Engels em 1885 Vol. II e 1894 Vol. III.
Portanto, é provável que a pioneira Revolução Mexicana, não tenha se espelhado na filosofia marxista no seu caráter socialista instintivo, ainda no ano de 1910, quando ainda estava a sete anos da Revolução Russa, e havia apenas dezesseis anos do lançamento da obra de Marx, O Capital.

Os líderes intelectuais da Revolução Mexicana, como proprietários rurais, provavelmente conheciam de modo superficial as ciências filosóficas. Eram eles:
Francisco Madero, um rico fazendeiro, que defendia a ideia de sufrágio efetivo e a não reeleição;
Ricardo Flores Magón, intelectual que defendia a ideia da revolução social e anti capitalista com as palavras de ordem Terra e Liberdade;
Venustiano Carranza, um general governador de províncias e responsável pela eventual Constituição Mexicana de 1917.
Por sua vez, os líderes guerrilheiros da Revolução Mexicana foram camponeses marginalizados pelo grande latifúndio e foram lideranças brotadas do meio do povo mexicano. Eram eles:
Emiliano Zapata: líder camponês que lutava por direito à terra e água para os agricultores, exigia reforma agraria com terra e liberdade para todo povo camponês.
Doroteu Arango, ou Pancho Villa: um líder carismático do Norte do México que confiscou terras dos latifundiários para doar aos camponeses e teve a subida ousadia de invadir o Texas, com o propósito de sublevar o povo e retoma-lo de volta ao México, invadido que fora pelos Estados unidos da América do Norte-USAN.
A Constituição Mexicana de 1917 nunca mudou e é uma das mais antigas do mundo ocidental, apesar de ter sido totalmente desfigurada através de mais de setecentas reformas.
Heróis nacionais do México, Pancho Villa e Emiliano Zapata Os líderes revolucionários mexicanos, foram ambos assassinados. O México apesar de ainda ter tido um governo avançado como Lauro Cárdenas, nos dias atuais continua padecendo de um atraso endêmico.

Voltando ao pluripartidarismo partidário, agora temos elementos suficientes para questionar a astucia dos seus inventores. Por outro lado, podemos também perceber que essa profusão de partidos, ao contrário do que aparenta, nunca foi nem é um modelo de democracia liberal, como a Suécia, Islândia e alguns outros países nórdicos.
Ora, no Brasil temos vinte e nove partidos políticos registrados, que a rigor têm um só projeto político-ideológico e um único modelo liberal capitalista de desenvolvimento. Até hoje não deu certo.
Essa quantidade enorme de siglas partidárias, -vinte e nove ao todo- têm como única finalidade, acomodar interesses diversos de bancadas diversas. São algodão entre cristais e formam uma verdadeira colcha de retalhos de interesses da classe dominante, e interagem de forma cruzada: ruralistas, evangélicos, empresários, empreiteiras, da bala, da bola, feminina, da educação, do jaleco, LGBTQIA+, parentes, sindical etc.
As bancadas já citadas, interagem entre si de forma compensatória. De modo que se a bancada A tiver uma matéria do seu interesse, as demais bancadas apoiarão a proposta, sob o compromisso de troca de apoios futuros.

Foi usando essa chantagem fisiológica, que o Congresso Nacional, as Assembleias Legislativas e as Câmaras de Vereadores se assenhorearam dos respectivos orçamentos, de forma ilegal, abusiva, egoísta e absurda. É o caso do famigerado orçamento secreto, das emendas impositivas, dos fundos partidários e outros adereços nada republicanos. Vejamos um trecho do Orçamento da União, que foi aprovado para o exercício de 2026:
“Foram apresentadas 7.180 emendas parlamentares individuais e coletivas, sendo 5.784 de deputados, 1.086 de senadores, 248 de bancada estadual e 62 de comissões permanentes. No total, foram atendidos cerca de R$ 50 bilhões em emendas, valor semelhante ao de 2025. Outros R$ 11,1 bilhões em emendas, segundo o relator, foram acolhidos dentro da programação dos ministérios e serão gerenciados pelo Poder Executivo.
No Plenário, o deputado Bohn Gass (PT-RS) criticou o aumento do valor das emendas no Orçamento. “Se tivesse menos recursos nas emendas parlamentares, o PAC estruturalmente poderia ajudar ainda mais o nosso país. Pois vejam a contradição. Nós vamos ter mais de R$ 60 bilhões para emendas de deputados, de senadores, de comissões, de bancadas. O PAC é R$ 52 bilhões,” (grifo nosso) afirmou. Fonte: Agência Câmara.

Para o ano de 2026, a dotação financeira destinada às Universidades Federais foi de R$ 6,43 bilhões. Segundo a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior-ANDIFES, a liberação foi reduzida no percentual de 7,05%, e vai prejudicar a manutenção básica das 69 universidades federais, por ser nominalmente inferior à de 2025
Tudo isso é feito segundo a maioria dos parlamentares, em nome da democracia. Em sã consciência, alguém considera essa prática como democracia? O que foi feito com os interesses da população que eles dizem representar?
Essa prática não só enfraquece o papel legislativo e fiscalizador do congresso, como também: entroniza o fisiologismo como prática institucional; a ascenção do cinismo político e do autoritarismo disfarçado, convertendo o executivo em presidencialismo de concessão.
Todavia, é essencial termos sempre em mente que no colapso do pluripartidarismo o que desaparece não é a política — desaparece o sentido público da política.
O Brasil vive hoje um momento em que os partidos existem muito mais para negociar poder do que para formular projetos de país.
O balcão de negócios instalado no Congresso e reproduzido pelo Executivo não é um desvio ocasional, mas uma engrenagem estruturada que mina a democracia por dentro. Enfrentar esse modelo, exige mais do que reformas eleitorais pontuais: exige uma mudança radical de valores, de ideias, de coerência programática e de compromisso com o interesse coletivo.
Com a continuidade do atual modelo de desenvolvimento político e econômico, a política seguirá sendo refém da ciranda fisiológica — e o povo, espectador de um jogo para o qual não foi convidado a jogar.
A solução que as condições subjetivas até agora não permitiram adotar, é mudar de modelo.
“Quando a dor de não estar vivendo for maior que o medo da mudança, a pessoa muda.”
Sigmund Freud

Referências:
O mito do Desenvolvimento Econômico – Celso Furtado.;
O Estado e a Revolução: Doutrina do Marxismo Sobre o Estado e as Tarefas do Proletariado na Revolução | Amazon.com.br;
Partido político: o que é, função, tipos, do Brasil;
Congresso Nacional aprova Orçamento de 2026 com R$ 6,5 trilhões em despesas – Notícias – Portal da Câmara dos Deputados;
Fotografias:
MDB é a maior legenda em número de filiados, segundo dados do TSE – DIAP – Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar;
A esquerda do “movimento” e a direita da “ordem” | BILHETES;
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