Quem tem o campo na identidade não se perde em um apartamento

Por: Bodão Ferreira;

Sei que o campo está sendo esvaziado
E negligenciado a cada dia
Sem escola, assistência ou garantia
E a sair o povo se vê forçado
Mas o elo jamais é apagado
Pois, memória e afeto são alentos
E árvore do pertencimento
Também nutre as raízes com saudade
Quem tem o campo na identidade
Não se perde em um apartamento

Na janela eu plantei manjericão
Na calçada, capim santo e cidreira
Não tem espaço pra um pé de macaxeira
Mas as ervas de chá não faltam, não
Tem arruda que é pra proteção
Erva doce e hortelã, medicamento
Pra temperar, tem cebolinha e coentro
Encima do cimento da cidade
Quem tem o campo na identidade
Não se perde em um apartamento

Até que se acabe esse comodato
Me apego nos mais velhos, na sabença
Na cidade se tem bem mais doença
Pela falta de acesso a terra e mato
Se da mata não temos mais contato
E não se vê cultivando um alimento
Com certeza, todo esse afastamento
Deixa a baixa a nossa humanidade
Quem tem o campo na identidade
Não se perde em um apartamento

Não tem buzina de carro nenhum
Que soe como a natural fanfarra
Da orquestra mateira das cigarras
Nos pés de cabantã com um “zum, zum, zum”
O mangangá na flor do urucum
Tem mais força que um motor possante
O sabiá sem ter auto falantes
Compõe, canta e performa qualidade
Quem tem no campo a identidade
Não se perde em um apartamento

Querem que eu acompanhe a cultura
De ver comida enrolada em plástico
Uns temperos que é só veneno gástrico
Sem diversidade de gosto e textura
Eu ainda prefiro tanajura
Que até pra surgir faz um evento
Não tem aplicativo e nem invento
Que ultrapasse comida de verdade
Quem tem o campo na identidade
Não se perde em um apartamento

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