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Só podia ser mulher

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Por: Karen Emília Formiga;

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Apesar da minha inquestionável resistência para escrita em primeira pessoa, esse artigo se apresentará quase todo como um relato do cotidiano.

Semana passada, eu não consegui entregar o artigo em tempo hábil para edição e publicação. Adoecemos todos: marido, filhos e até os bichos de estimação.

Dessas gripes muito fortes e que nos tira do prumo – rotina e a mínima organização que lutamos tanto para manter deixa de existir para dar lugar aos remédios com hora certa e as infindáveis lavagem de nariz com uma conta alta na farmácia.

E foi indo comprar mais um lote de soro fisiológico num estabelecimento desses que tem estacionamento quase colado na rua que escutei a célebre frase tantas vezes proferida por algum incompetente no trânsito: “só podia ser uma mulher”.

O rapaz se referia a uma moça que estacionou, segundo ele, de forma errada, ocupando a vaga para dois carros.

Olhei para aquela situação que irritava tanto o exímio motorista e achei mais prudente a forma como a moça estacionou. Bem mais coerente do que como ele queria que ela tivesse estacionado.

E voltei para casa pensando em quantas vezes eu já ouvi um “só podia ser uma mulher” de forma pejorativa.

Tentei encaixar aquela frase na semana caótica que eu estava passando e, sim, só podia ser uma mulher…

Somente uma mulher consegue, ainda que gripada, doente com a cabeça latejando e todo o restante do corpo igualmente adoecido, dar conta de cuidar dos filhos, do marido e dos bichos de estimação.

E expandi a mesma frase proferida com tanto desdém para outras mulheres que, como eu, estavam dando muito mais do que podiam, só naquela semaninha complicada.

Sim. Somente uma mulher consegue se desdobrar em mil e editar textos com crise de coluna para que seu trabalho não apresente furos consideráveis de organização.

Somente uma mulher é capaz de gerenciar conflito entre adolescentes e o avô, que não queria deixar os netos saírem para um happy hour com os amigos, e com destreza e sabedoria, é capaz de encontrar a melhor solução para as muitas demandas que lhe são apresentadas no decorrer da rotina.

Sim. O rapaz do estacionamento da farmácia tinha razão: só podia ser uma mulher a pensar na forma mais segura de estacionar, ainda que na cabeça imediatista dele ela estivesse ocupando Diaz vagas, enquanto o que ela pensou, tenho certeza, foi no jeito mais criterioso é responsável de deixar o carro enquanto resolvia algo, que podia nem ser para ela, na farmácia.

Sim. Sim. Só podia ser uma mulher, a trabalhar com diagnóstico de um câncer reincidente na tireoide, proveniente da sua carga laboral demasiado extenuante e, depois, tinha que ser uma mulher após a cirurgia para retirada do nódulo, estar pronta em tão pouco tempo para voltar ao exercício de sua função.

É verdade! Tinha que ser uma mulher a parir. Somente elas poderiam fazer isso, poderiam desafiar a medicina, médicos e equipes inteiras que lhes disseram que ela jamais conseguiria um parto normal, dada suas cesarianas anteriores.

Somente uma mulher pariria duas vezes em parto natural, depois dessa regra estabelecida por alguém que desconsiderou a força e a potência do que é ser uma mulher.

Só podia ser uma mulher a denunciar o seu marido agressor e terminando um casamento de anos, mesmo sendo famosa e jogando na mídia a violência física, patrimonial e psicológica que sofreu. E somente uma mulher se refaria depois de um golpe desse.

Sim, sim. Em absoluto – somente uma mulher consegue levar os filhos para a escola, andar por quilômetros para fazer faxina e garantir o sustento dos que dependem dela.

Só podia ser uma mulher a apresentar um jornal com a filha agarrada nas suas pernas por baixo da bancada do seu trabalho.

Só uma mulher conseguiria. Ninguém mais.
Certeza que somente uma mulher escancararia as nuances do quanto ela já foi chamada de “louca” por aquele chefe que deu em cima dela, tantas vezes e ela se calou para não perder o sustento de sua família.

Só podia ser uma mulher a ter domínio de seus conhecimentos e, depois de ser espezinhada pela sua mente assombrada e fragilizada, renasceria muito mais forte para lutar pelos seus.

Claro que somente uma mulher cumpriria pena em razão do delito do companheiro e somente elas entregariam o filho bebê para que outras pessoas cuidassem, afastando dos filhos as penas as quais elas estão impostas pela lei.

Somente uma mulher pode ser assassinada pelo seu companheiro, com quem dividiu a cama e a vida por anos, apenas pelo fato de ser mulher e está subjugada a esta condição.

Só podia ser uma mulher a ter tantos atributos e habilidades múltiplas genuinamente intrínseca a sua condição de fêmea.

Somente uma mulher é capaz de amamentar. Um, dois ou até mais filhos simultaneamente, mesmo com déficit nutricional.

Somente uma mulher tem a capacidade de pensar uma vacina tão rapidamente porque o vírus letal disseminaria a população mundial em pouquíssimo tempo. Somente uma mulher conseguiria fazer pensar que a velocidade era um fator indispensável à equação – ciência + conhecimento = vacina, que salvaria a vida de tantos.

Sim. Só podia ser uma mulher a escrever poesias e integrar academia de letras, entre tantos homens que menosprezaram seus talentos.

Somente uma mulher conseguiria ver um filho morto e somente ela ficaria com Ele até o fim de Sua missão.

É, moço! Você tinha lá sua razão: só podia ser uma mulher.

Um adendo: quando foi sugerido para que a escrita dessa semana contemplasse o dia internacional da mulher, tive inúmeras dificuldades para colocar em palavras a grandeza e importância desta data. Achei que não conseguiria tecer algum raciocínio capaz de ser tão magnífico quanto o dia.

Foi esse mesmo motivo que me levou a escrever um texto despretensioso e que acredito não estar à altura da comemoração de tantos marcos, mas que se pretendeu ser um abraço para cada mulher que vi ser um gigante exemplar e que muito contribuiu para minha própria caminhada.

A todas elas, minha gratidão por suas existências.

Feliz dia das mulheres para todas elas!

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