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João Pessoa

“Só Mãe”

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Por: Karen Emília Formiga;

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A preferência por dissertações sempre foi um lugar seguro para desenvolver a escrita até o desafio de ser articulista se apresentar e eu precisar escrever em primeira pessoa.

Como já dito em outro texto, esse não era um lugar muito confortável, em que eu sentisse segurança, para uso das palavras.

E foi precisando sair da zona de conforto que cheguei até aqui. Mesmo que empurrada para tal.
“Você vai voltar a escrever, sim”, disse um amigo que assina a total responsabilidade por ter um texto em primeira pessoa, neste espaço tão respeitável.

Justifiquei, por meses, que não tinha nada que eu pudesse falar que já não estivesse sendo falado, esse amigo insistia: “fale sobre a maternidade. Da sua ótica. Da sua experiência. Com a sua perspectiva”.

Relutei. Hesitante.
(Re) luto ainda. Ainda não sei se conseguirei ser uma articulista em primeira pessoa.

Hoje, no nicho específico que nos propomos a escrever, semanalmente, esse artigo é mais um texto em primeira pessoa que aventurei andar por terras, agora profícuas para que cresça: artigo em primeira pessoa sobre maternidade e as questões envoltas a ela.

Era para ser só um daqueles projetos que os outros acreditam e enxergam melhor que nós mesmos que darão certo e acabamos por abraçar a ideia. Mas que tiramos da possibilidade a vontade de fazer dar certo, mesmo considerando minha modéstia nem falsa e nem verdadeira – só real – de quem escreve, mas porque ama as palavras e, até aqui, não pretendia ser lida por outrem.

Contudo, a maternidade é um daqueles assuntos que quanto mais se lê, mais temos vontade de conhecer outras opiniões. Dada sua natureza empírica e seu total afastamento da exatidão da ciência. Nesse setor, não há o que é certo e errado. Foi esse cenário que me fez concordar com o meu amigo insistente: da minha ótica, eu posso escrever em primeira pessoa e compartilhar a minha experiência no exercício pleno da maternagem.

Se você é mãe e quer conhecer a rotina de uma outra mãe, é possível que esse texto seja útil. Se você não é mãe, mas convive com uma, talvez aqui tenha algo que seja aproveitável.
Comecemos, então…

Aqui, inicia-se uma imersão profunda e que envolveu uma série de decisões para que a função “só” mãe existisse.

Não foi e nunca será um caminho fácil. É uma decisão que precisa ser renovada sempre, que precisa ter claros e bem estabelecidos os motivos que levou a escolha para maternidade exclusiva.

Com votos de uma boa leitura, espero que você encontre aqui alguma boa perspectiva, que possa somar na sua própria vivência.
Boa leitura do primeiro capítulo!
(…)

Depois de quatro anos em que decidimos, meu companheiro e eu, suspender os planos que envolviam a minha carreira profissional, para priorizar os filhos que nos chegavam (e/ou ainda chegariam), foi preciso fazer um currículo.

Já fazia todo esse tempo- um pouco mais de quatro anos – que nada sobre a minha formação acadêmica, cursos, trajetórias de especialidades e caminhos profissionais era um assunto pensado ou falado por nós.

Como decidido lá atrás, o maior peso de escolha e decisão foram facultados a mim, já que os cuidados com o lar e o exercício pleno da maternidade ficaram sob minha responsabilidade- pelo menos a maior parcela de funcionamento desses setores.

Para chegarmos a esse desfecho na nossa escolha, essa alternativa não só foi uma prioridade, como, também, foi o pilar mais robusto do modelo familiar que escolhemos adotar: serei “só” mãe. Uma mãe presente na primeira infância dos filhos que teremos.
Uma mãe que estará em casa. Sempre.

Não é difícil imaginar os muitos comentários e perguntas curiosas que enfrentamos ao decidir por uma formatação familiar vista como ultrapassada, dentro de uma sociedade que preza por igualdade de direitos: o homem provedor do lar, a mulher, esposa e mãe.

Distante das nossas realidades e projetos as opiniões do que deveríamos fazer foram (e ainda são) intrusas, inconvenientes e quase sempre sem respaldo para ser. Quem sabe em outro artigo até trarei nuances sobre as muitas falas vetorizadas a nós.

Mas para não nos desfocar da necessidade de elaboração do currículo, fato recente e novo no dia a dia já tão estabelecido e numa rotina já tão confeccionada: precisei de um currículo.

Ali, sentada na frente do computador, sem horário para o banho, comida, desenho, castelos de bloquinhos de madeiras, leituras, mamadas… sem pensar o que faria para o almoço, que horas começaria a soneca da tarde, quanto tempo tínhamos para ir ao parquinho antes do jantar, comecei a escrever as coisas que eu já tinha feito dentro da esfera profissional.

Com a ajuda do meu companheiro, lembrei de alguns segmentos que já tinha percorrido e revisitei mentalmente outras fases da minha vida: como a sala de aula, lugar, inclusive em que conheci a pessoa que hoje me acompanha na jornada de vida.

Como se tratava de um currículo para apresentação e não exigia a formalidade de um currículo lattes, por exemplo, a última frase deste documento está assim disposta: hoje, mãe em tempo integral.

Não é preciso dizer que escrever “mãe em tempo integral” me fez pensar por horas sobre isso. Também não é nenhuma surpresa que a atual “experiência profissional” foi recepcionada com igual admiração.

Confundida com um trabalho, a maternidade é, indubitavelmente, o maior papel desempenhado por uma mulher. O que mais a anulará enquanto pessoa, o que mais exigirá de sua personalidade, o que mais pedirá por uma evolução da sua maturidade e o que mais, provavelmente, a transformará. Haverá uma outra pessoa em seu lugar: uma mãe surgirá nas muitas versões que apresentamos ao mundo. Acredite, nenhum outro papel exigirá mais de você.

É fácil se perder nesse novo momento de vida. Não se reconhecer. Ter inúmeras dificuldades. Acreditar que não é capaz de exercer com expertise um título que exige destreza desde o primeiro momento em que outra vida está sob seus cuidados.

Mas a raiz de todas as frustrações relacionadas à maternidade repousa na visão deturpada que muitos pregam de ela ser um trabalho. Não há como competir uma carreira profissional galgada em cursos, formações acadêmicas e títulos com o exercício do maternar.

Se afastarmos da maternidade a roupagem de trabalho, em que se espera uma contraprestação, uma ascensão e uma trajetória brilhante, ela ganha alicerces do que ela realmente é: uma missão, um propósito, talvez até um sacerdócio.

Sem atrelar à maternidade ao seu propósito de vida, longe de compreender que exercitar a maternidade e formar indivíduos do zero deve antes passar pela necessidade de deixar o mundo um lugar melhor, o resultado será uma competição desenfreada, dessas que estamos acostumadas a ver, sobretudo em redes sociais.

Dificilmente, será possível conseguir transformar a maternidade em um trabalho, porque pela sua própria natureza, ela não é.

Colocar “mãe em tempo integral” no currículo afastou toda a possibilidade de voltar a trilhar uma trajetória acadêmica, por enquanto. Aquela trajetória que exige de mim horas longe da gerência e dos cuidados com o que me é, realmente, importante.

E foi só por isso: de quatro anos para cá, eu já não fiz um caminho sozinha nos cursos que vinha me propondo a fazer.

Agora, sou mãe em tempo integral e nada ficou mais claro e nada, também, reafirmou que a decisão tomada quatro anos atrás ainda é reafirmada, todos os dias: “só” mãe.

E quanta complexidade há numa frase tão pequena, que ocupou todos os espaços da minha vida e da minha página de um currículo.

Somente outra mãe é capaz de entender que a minha decisão não foi fácil de ser tomada: destruir a profissional, sem saber se um dia ela voltará a existir para ser “só” mãe é algo grandioso demais.

Tanto quanto o exercício pleno da minha função atual – a maternidade é o maior papel que desempenhei, até aqui.

E que, com certeza, desempenharei em toda minha trajetória enquanto pessoa.
Nada poderá ser capaz de ser mais forte, mais intenso e ter maior peso:
“Só” mãe.

Escrever isso em um currículo, ainda que informal para uma breve apresentação, consolidou minha carreira materna.

E, como dito, reafirmou o meu compromisso com a única coisa que realmente me importa, agora.

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