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Respeite meu forró, minha história, minha terra

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Essa semana, diante da polêmica gerada por uma atitude, no mínimo, desrespeitosa e antiprofissional, numa demonstração de falta de cultura dos que promovem o “Maior São João do Mundo”. Como grande parte dos paraibanos e de muitos nordestinos, que se chocaram com a triste atitude de, após um contrato para apresentação de um artista da monta de Flavio José, e o que ele representa para nossa cultura, resolvi dar minha contribuição, mesmo já havendo colocando nas redes sociais.

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Como bem disse o Cantor Dorgival Dantas, que usou seu espaço no São João de Caruaru, para nos dizer:

“Você que é Nordestino, não diga só no Instagram, na rede social. Você que é nordestino de coração, precisa elogiar, engradecer os grandes do seu estado, para colocar o Nordeste onde ele merece estar a todo momento (JC. COM.BR.)

Resolvi falar do tema não mais como reação justa e necessária em favor de nosso forró, nossos artistas e nossa cultura. Preferi falar do quanto esse tipo de música tem morada em nosso coração e em nosso dia a dia, não só com os artistas de agora que lutam arduamente, numa luta de titãs do Sertanejo de outras regiões. Nada contra a eles. Como bem disse Elba Ramalho também nas redes sociais, “o céu cabe todas as estrelas”. É evidente, mas alguns querem diminuir o tamanho e a importância de algumas estrelas nesta constelação.

Bem, como disse que faria minha defesa de um outro jeito, quero falar da forma que costumo falar dos temas que resolvo abordar. Como alguns que já me conhecem através desse espaço, sabem que sou paraibana e pombalense com muito orgulho. Mas como grande parte de nossa gente, para sobreviver, principalmente em tempos de seca e das “vacas magras”, meu pai também, tomou a decisão de ir embora dessa terra. Não, não saiu montado em um pau de arara, como muitos utilizam dessa triste imagem para diminuir mais a qualidade e aumentar o sofrimento do homem nordestino que é, sim, sofredor, passa por humilhações e preconceitos fora de seu lugar. Eu sei, já passei na pele, e vivi tudo isso.

Para quem não conhece a música e a cultura nordestina, é importante que saiba que ela é extremamente rica e, musicalmente falando, essa riqueza fica bastante visível quando observamos artistas como Luiz Gonzaga. O cantor fez sucesso por todo o Brasil e popularizou a música nordestina no País.

Baião se trata de um gênero de música e dança popular do Nordeste que utiliza principalmente viola caipira, triângulo, flauta doce e acordeão. E foi por popularizar esse ritmo que Luiz Gonzaga ficou conhecido como o Rei do Baião.

Mas nessa polêmica me veio à mente uma das cenas que mais me marcaram, com relação a saudade de sua terra, relacionando música e poesia. Nesta história, o protagonista da música foi o grande Luiz Gonzaga.

Nos anos de 1970, nossa mãe veio visitar a família, ficando nosso pai para cuidar dos filhos. Diga-se de passagem, que meu pai não era nenhum homem ligado a cultura, de nenhuma espécie, mas não deixava de ser um homem sensível às suas raízes.

Em final de tarde, na qual eu voltava do trabalho, ao abrir a porta, vejo pai deitado no sofá da sala ouvindo um único disco de vinil de forró que tínhamos, por sinal, ainda o guardo com muito carinho, ele escutando a música Asa branca, as lágrimas corriam no canto de seu olho.

Deixei-o vivendo aquele momento que traduzia melancolia, saudades, talvez de sua terra natal, de mãe, não sei. Mas gostaria de prestar minha homenagem a esse Rei, que através de uma das poesias que reputo como um verdadeiro relato da história de vida de um povo que por razões que não se fazem necessárias serem abordadas agora, carregou tanto sofrimento e que tem tantas marcas em suas almas.

Preciso transcrever parte da poesia, pois sem ela, não podemos despertar as nossas mais profundas emoções, que ela consegue arrancar de nós.

Quando oiei’ a terra ardendo
Qual fogueira de São João
Eu preguntei’ a Deus do céu, uai
Por que tamanha judiação?
Eu preguntei’ a Deus do céu, uai
Por que tamanha judiação?

Esta estrofe só tem sentido para quem é realmente nordestino, e ao se deitar em uma rede embaixo de um pé de oiticica, por exemplo, e ao olhar para o imenso céu azul, além de sentir na pele, o calor do ambiente em seu entorno, consegue ainda, ver ondas de calor a se espessarem pelo ar. Não tem imagem mais desoladora, apesar da fé e da esperança e de, ao final desse cenário está lá o “céu” azul, como se Deus dissesse: passando tudo isso, você chegará até mim!

Hoje longe, muitas légua
Numa triste solidão
Espero a chuva cair de novo
Pra mim vortar’ pro meu sertão
Espero a chuva cair de novo
Pra mim vortar’ pro meu sertão
Quando o verde dos teus óio’
Se espaiar’ na prantação’
Eu te asseguro, não chore, não, viu
Que eu vortarei’, viu, meu coração
Eu te asseguro, não chore, não, viu
Que eu vortarei’, viu, meu coração

O voltar “pro meu sertão”, não tem nada que possa ser comparado. Nem ao maior dos prazeres carnais, pode traduzir a sensação de voltar pro seu lugar, ver o verde das plantas que voltaram a florescer, o cheiro do mato que se entranha em suas narinas. E te provoca a sensação de ter mergulhado nas águas do paraíso.

Ah, caríssimos leitores, sei que estas palavras são tão singelas, mas quem conhece nossa realidade, se reconhece como o vivente desse tempo e dessa terra. Se reconhece, através da voz do Rei do Baião, como cada nordestino que partiu em busca de uma vida melhor, mas a vida, o prazer e as recompensas de todo sofrimento, só chegam ao fim quando se pisa no solo de seu lugar, mesmo que “traga a roupa no saco e como cadeado, um nó”.

Portanto, não preciso falar muito, mas apenas tentar resgatar do coração de cada nordestino, que viva aqui ou fora de seu lugar, que sua terra, sua gente, sua cultura e seu sofrimento, precisam ser respeitados. Nosso povo, precisa ser valorizado. E, não é numa simples noite de dança, ou ouvindo uma música que não fala de nossa história e de nossas emoções, que você descobrirá a felicidade de dançar abraçadinho com quem se ama, mesmo que seja numa sala de reboco.

 

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