Irei começar nossa reflexão de hoje, relembrando uma cena que aconteceu em minha casa há uns quatro anos. Nossa família traz a felicidade da longevidade, ou seja: vivemos muito. Para alegria de uns e tristeza de outros, temos muitos na família que nasceram ainda no início do século XX e seguem sua caminhada ainda século XXI, modéstia à parte, muito bem. É evidente, que alguns desenvolveram Alzheimer, outros demências variadas, mas ao final da história, entre os que partiram com idade avançada e alguns que estão ainda por aqui no processo de aprendizagem, podemos dizer, que estamos muito bem, obrigada.
Voltando ao acontecido em minha casa, estávamos todos numa bela prosa, regada por um bolinho e um excelente cafezinho, coisas que o sertanejo cultiva muito bem. E aqui aproveito o ensejo para dizer, que deveria ser um costume a ser adotado em muitas famílias, uma vez que são nestas tardes de um bom “café com bolo” que muita coisa de família vem a público, inclusive nessa tarde nos encontrávamos reunidos: pessoas jovens e outras já passando dos 60 e, para abrilhantar ainda mais a conversa, estava minha tia, hoje com 96 anos.
No vai e vem da conversa uma jovem advogada, (faço questão de enfatizar o grau de escolaridade para não dizer que se tratava de alguém sem conhecimento) falando do costume de sua casa no interior, onde a noite se sentam à calçada para olhar as estrelas e falar da vida dos vizinhos ou dos familiares, como a maioria dos “velhos”, segundo a linguagem da jovem, faz, e comentava que ela não aguentava ficar lá pelo sertão muito tempo, pois dentre as coisas vivenciadas, essa era uma das que ela não suportava. Pois “os velhos” começavam a cochilar e a roncar, e ela não tolerava aquilo. A frase “os velhos”, foi pronunciada várias vezes, e eu comecei a ver que minha jovem tia de 96 anos, foi ficando incomodada com a linguagem da advogada, até chegar o ponto que ela perguntou à jovem: “Você não sabe chamar as pessoas mais velhas de idosas, não?”
Naquele momento, não posso negar que vibrei com a atitude de minha tia. No entanto, este é padrão que vem se repetindo com a maioria dos jovens que além de não respeitarem os mais velhos, por falta de educação, cultura ou mesmo bom senso, não respeitam o idoso como alguém que detém um grande cabedal de experiencia, nem mesmo de conhecimento.
Durante minha carreira profissional, trabalhei com verdadeiros gênios octogenários e confesso, foram meus melhores professores.
Segundo a Associação Brasileira de Alzheimer, o Brasil possui cerca de 1.200.000 indivíduos com demência. Calcula-se que, atualmente (dados de 2012), existem cerca de 30 milhões de pessoas com a doença de Alzheimer. Este número deverá aumentar para 65.7 milhões em 2030 e 115.4 milhões e 2050. Não é preciso dizer que esses jovens, que acreditam que sua juventude física e mental seja imutável, certamente estarão entre esses números no futuro.
Ainda, para esses, hoje, jovens, que ridicularizam os idosos atuais, é bom lembrar que se eles se cuidarem e tiverem sorte, virão a ser os idosos, os velhos, do futuro. Um novo levantamento realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2021, aponta que pessoas com 60 anos ou mais representam 14,7% da população residente no Brasil. Em números absolutos, são 31,23 milhões de pessoas. Estima-se que em 2050, em todo mundo o número de idosos com mais de 60 anos poderá chegar a dois bilhões de habitantes. No Brasil, a expectativa é que passemos de 64 milhões, representando 29% da população brasileira.
Se faz necessário dizer que o envelhecimento demográfico e o individual devem ser diferenciados. Segundo dados da Fiocruz, o primeiro é decorrente da mudança da estrutura etária da população e acontece com o aumento da proporção de pessoas consideradas idosas. O Envelhecimento demográfico pode ser reversível a partir de, por exemplo, a entrada de imigrantes jovens, o aumento da fecundidade e/ou aumento da mortalidade a idades avançadas.
Segundo o mesmo documento, o envelhecimento individual, embora seja concebido como um processo, está associado ao conceito de velhice e fragilização. É importante termos a consciência de que a idade por si só, não é preditor de fragilidade e “velhice”. Esse processo muda de pessoa para pessoa.
A maioria dos países usa a marca de 60 ou 65 anos para definir uma pessoa como idosa. No Brasil, o Estatuto do Idoso define como idoso a pessoa que alcança 60 anos de idade.
Parâmetros que, em minha opinião e convivência com pessoas longevas, esses critérios já se encontram ultrapassados, ou que, pelo menos, fossem desenvolvidos outros fatores de avaliação para serem analisados e, se identificar a velhice sem prejudicar muitos que, apesar da idade, se encontram com perfeita capacidade cognitiva e em plenas condições de desenvolverem suas atividades físicas e intelectuais.
Acredito, apesar de repetir, não ser médica nem da área de saúde, mas com nosso conhecimento empírico, posso dizer, sem sombra de dúvidas, que muitos dos rótulos atribuídos às pessoas com mais de 60 anos podem vir a contribuir, em muitos casos, como desencadeadores, tanto na sociedade como em particular, para muitos que, no dia seguinte ao completarem 60 anos, dependendo do ambiente em que vivem, passam a serem vistas com olhares de desconfiança no que diz respeito às suas capacidades, sejam intelectuais, cognitivas e físicas. É comum encontrarmos idosos em seus, 60, 70, 80 ou mesmo 90 anos que não sentiram nenhuma perda de sua capacidade. No entanto, esse paradigma da velhice imposto por órgãos ou estudiosos sem o devido aprofundamento, pode vir a contribuir para causa de transtornos que podem trazer consequências inimagináveis, ás pessoas e a sociedade.
Para Maria Fernanda Lima Costa estudiosa da Fiocruz, o envelhecimento pode ser encarado de duas maneiras como tragédia que destrói os sistemas sociais ou como uma oportunidade, na medida que as pessoas idosas tenham uma vida saudável .
O Termo Envelhecimento Ativo, adotado por instituição ao final da década de 1990, é definido como um “processo de otimização das oportunidades de saúde, participação e segurança, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida à medida que as pessoas fiquem mais velhas.
Na prática, em nossa sociedade se faz necessário particularizar o Brasil e seus estados federativos, e perguntar: Diante desse quadro de envelhecimento de nossa população, quais instrumentos percebemos, no sentido de promover ou mesmo de contribuir para que essa população, apesar de idosa, possa continuar sendo produtiva, saudável e feliz?
Se manter produtiva e manter vínculos sociais e familiares saudáveis e respeitáveis, significa contribuir para que nós, ao chegarmos às idades estabelecidas para velhice, possamos ainda contribuir, não só economicamente, mas com a importância da convivência intergeracional, e com um impacto social como um todo.
Outra questão que precisamos analisar é que da mesma forma que jovens demonstram desrespeito a seus pais, professores e avós, esquecem que é exatamente por falta de conhecimento, desrespeito, etarismo (que é o preconceito relacionado à idade) que poderão ser responsabilizados pela exclusão de pessoas ainda produtivas e com capacidade de convivência social, e na maioria das vezes, esses excluídos podem desenvolver patologias irreversíveis do ponto de vista psíquicos, que aí sim, poderão desenvolver incapacidades que só poderiam aparecer em idade bem mais avançada.
Do ponto de vista do poder público, precisa-se, urgentemente, serem pensadas políticas públicas não só de acolhimento para inválidos, mas processos pedagógicos acessíveis a maioria da população, como forma de retardar as consequências do envelhecimento, além de aproveitar no bom sentido, o conhecimento adquirido desse público, para ser repassado aos jovens. Dessa forma, o saber repassado pela oralidade, pode em muito contribuir para o vazio de muitos jovens que por falta de atenção e cuidado, se voltam para as drogas e outros vícios. Em todas as fazes de nossa existência, sabemos da necessidade e das consequências que falta de afetividade e carinho pode trazer a qualquer pessoa, independente da idade. É evidente, que o idoso, seja mais prejudicado neste sentido, mas todos nós precisamos repensar nossa forma de ser e de agir no enfrentamento aos problemas advindos da idade.
Não poderia deixar de reconhecer as conquistas advindas do o Estatuto do Idoso criado através da Lei No 10.741, DE 1º de outubro 2003, já foram garantidos muitos avanços, no entanto, reafirmo que cabe as instâncias de poder, a revisão e atualização dessa Lei quando sabemos que grande responsabilidade de provocar um movimento de apoio ao idoso é do poder público com grande participação da sociedade, e, que não só campanhas que duram pouco, e tem pouca eficácia. Se velho é seu preconceito, novas precisam ser nossas atitudes que demonstrem acima de tudo humanidade para com todos.