Acredito que o escritor, dentre suas competências, ou até mesmo dentre seus objetivos, está o de, de alguma forma, transformar a forma de pensar ou de refletir daquele que o lê. Não é fácil, contudo, tratar dos temas mais cruéis da vida humana de forma a levar uma certa leveza no que diz.
Fiquei pensando que tema trazer neste período, o qual passamos com tantas incertezas, vivendo momentos de tão baixa vibração em grande parte do povo brasileiro. Nestes últimos tempos, poucas foram as pessoas que conseguiram manter, em sua mente, em seu entorno, um ambiente leve e de fé no porvir.
Estava procurando um tema que não nos trouxesse tristeza, nem queria falar de política, apesar de achar que tudo que fazemos tem um tom político, mas queria um tema que pudesse nos falar mais perto ao coração e sempre, que trato de assuntos que vêm do coração, não consigo separá-lo do sagrado. Sim! O sagrado que envolve o amor, e sem amor, somos tão vazios, tão sem graça, tão sem rumo!
Fui aos livros de arte do meu filho (de vez em quando paro para conhecer um pouco mais de arte, a clássica que não tive oportunidade de conhecer em outros tempos) e me deparei com um livro do artista Gustav Klimt um precursor da vanguarda vienense que teve o auge de sua carreira entre os séculos IX e XX.
Klimt tinha paixão por temas que envolvessem o feminino. Suas telas retratam o erótico e a sensualidade que as mulheres provocavam na sociedade austríaca da época.
Suas telas nos levam a uma viagem, que pode refletir a beleza que existe no interior de cada um de nós. Assim, me deparei com uma bela tela que ele a denominou de “A Esperança” – 1903.
“Trata-se da pintura de uma mulher grávida nua de perfil. A cabeça está inclinada para frente. O rosto voltado para o expectador, a quem lança um olhar desafiante; as mãos se cruzam num gesto protetor sobre o ventre. Com cabelo vermelho, pele branca e pelos pubianos visíveis, a modelo responde ao protótipo da mulher fatal, o que confere ao tema uma interpretação ambivalente. Apenas a evidência da gravidez e a coroa de flores sobre a cabeça – símbolo de pureza – contrapõe-se ao valor erótico associado a esse tipo de mulher”.
Enfatizo, no entanto, que a esperança representada pela gravidez, a proteção que a mulher mostra ao proteger a criança em seu ventre. A esperança que ela carrega, traduzida naquela criança que ainda não nasceu, mas que, para ela, significa a mudança, a força e a determinação da mulher.
Acredito que todos nós, neste momento, assim como a mulher que Klimt pintou, precisa gerar, como se gera uma criança, a esperança que ela representa. Ao contrário da incerteza da forma do caráter ou da personalidade da criança que nasce, precisamos deixar nascer em nós, a esperança de uma criança robusta, inteligente e que poderá ser o símbolo de nossa liberdade.
A fé e a esperança, são símbolos do sagrado. Sem elas nos tornaríamos seres amargos e tristes. Já passamos, nestes dois últimos anos, por momentos que ora parecíamos termos perdido a esperança, ora, pensávamos que não tínhamos mais forças.
Fiquei refletindo o quanto é importante não deixarmos morrer essas duas companheiras, que de certa forma nos sustentam, nos alimentam. É por elas existirem, que o lavrador lança a semente ao chão, muitas vezes, em terra árida, aparentemente, sem nenhuma possibilidade que ela venha a nascer e se tornar uma árvore que se torne robusta. É a Esperança que o alimenta. É a esperança que o impulsiona a plantar e a acreditar, que a chuva virá, e aquela sementinha jogada ao solo, nascerá.
Nós, e não me refiro só ao povo brasileiro, pois acredito que o mundo nestes últimos dois anos, passou por um teste de força e de alimentação da Esperança; a Humanidade, diziam alguns, após essa pandemia, se tornaria melhor. Não sei se nos tornamos melhores, mas chegou a hora dos que ainda não fizeram seu plantio, começarem a preparar a terra e lançar a semente da esperança que deverá nascer em cada um de nós.
Assim, como o agricultor que planta sua semente, acreditando que a chuva virá, que o tempo será favorável ao nascimento de sua semente e ele terá uma excelente colheita, cada um de nós precisa voltar a acreditar. Não estou atrelando essa Esperança à mudança de governo de nosso pais, precisamos que aquela previsão da Humanidade se tornar melhor após pandemia, possa se concretizar.
Ainda contamos com uma enormidade de pessoas que carregam ódio, e nas quais a violência trabalha seu psiquismo para que nada dê certo. Esses se esquecem, que se não der certo para eles, não dará certo para outros também.
Nos livros que falam da vinda de Jesus, seus autores se referem à mudança na atmosfera da Galileia, pois a Espiritualidade Maior procurava limpar o ambiente para achegada do filho Deus que estava para chegar. Mas essa não é apenas uma missão dedicada à Espiritualidade. Coincidência ou não, está se aproximando o tempo que se comemora a chegada do Jesus à Terra, e, como na figura que Klimt pintou, que pode também representar a figura de Maria, carregando em seu ventre, seu filho amado, que veio para transformar o mundo trazendo seus novos ensinamentos devemos carregar dentro de nós a esperança. Ao contrário da Santíssima Mãe, em sua pureza, a figura humana e até mesmo dúbia da mulher de Klimt nos mostra que todos nós somos capazes de gerar o sagrado e o divino dentro de nós, ainda que na forma desse sentimento tão nobre.
Não se deixem levar pelo desânimo, sabemos que existem irmãos nossos, que estão precisando, assim como a planta lançada ao solo, ser cuidada. Para encontrarmos alguns desses irmãos vivendo numa zona de guerra, e para vivenciar essa guerra, não precisamos ir a Síria, alguns estão em guerra bem próximos a nós. É evidente que não posso ajudar diretamente aos irmãos que estão do outro lado do mundo, mas posso ajudar a alguém que esteja bem perto de mim.
Vamos contribuir para a melhora desse ambiente de tristeza e de ódio que ainda paira sobre nossas cabeças, sendo plantadores de sementes, mas não sementes que precisam ser lançadas à terra, vamos contribuir para lançar a semente da esperança no coração de pelo menos uma pessoa, de uma família. Vamos deixar de falar de pessimismo, de desavença, de tristeza, mas vamos tentar preparar nosso coração para receber a semente da esperança e da fé.
Se eu ajudar a uma só pessoa, a uma só família, pode parecer que aquele grãozinho de areia não faz falta à beira mar, mas se esse grãozinho sair do olho de alguém e contribuir para que ele pare de chorar estaremos plantando, sim, a Esperança no coração de alguém. E em nosso coração que também precisa ser cuidado.
Vamos ser protagonistas de um mundo mais harmonioso, onde a esperança seja de fato “esperançada” por cada um de nós. Precisamos ajudar a Espiritualidade Amiga, com nosso padrão mental, ajudando, assim como aconteceu na Galileia para a chegada de Jesus, para nos tornarmos melhores para nós mesmos, e para o mundo.
Compreendendo, por fim, a grandeza do amor, alcança-se as cumeadas do trabalho pelo bem geral, empenhando-se na conquista de si mesma, do seu próximo, da vida em geral. Tudo quanto pulsa e vibra interessa-lhe, retira-a da pequenez e conduz à grandeza, trabalhando-lhe o íntimo que se expande e se harmoniza em um hino de confraternização com tudo e com todos, passando a fazer parte vibrante da vida. (p29)
Gostaria de concluir esse texto com poema de um poeta paraibano que para muitos, só falava de tristeza, de coisas mórbidas. Lhes trago Augusto dos Anjos com seu modo de falar desse nosso tema. Ele diz:
A Esperança
A esperança não murcha, ela não cansa,
Também como ela não sucumbe a Crença,
Vão-se sonhos nas Asas da Descrença
Voltam sonhos nas asas da Esperança
Muita gente assim não pensa;
No entanto, o mundo é uma ilusão completa,
E não é a Esperança por….
(Augusto do Anjos)