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InícioAntonio Henrique CourasO Rei está morto. Longa vida ao Rei

O Rei está morto. Longa vida ao Rei

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Nos últimos dias, algo vem realmente me chamando a atenção. Com a morte da Rainha Elisabeth II da Inglaterra e a ascensão do Rei Charles III, algum debate surgiu, ainda que em meios fora dos veios principais da mídia: a questão da sucessão.

E eu resolvi aproveitar o “timming”, como dizem os ingleses, para falar que a transferência de poder, apesar de parecer uma ritualística quase extinta e relegada às monarquias empoeiradas, é uma questão de fundamental importância ainda nos dias de hoje.

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Com a morte de Elisabeth II, seu primogênito, um homem, herdou o trono de São Jorge. Nunca houve dúvidas a respeito de sua sucessão, mas historicamente nem sempre foi assim. Sempre houve debates a respeito de quem herdaria coroa, como no caso da sucessão de Dom Pedro I do Brasil e IV de Portugal. No Brasil a coroa passou para seu filho “varão” mais velho, Pedro, contudo em Portugal a situação não foi tão simples. Quem deveria herdar o título de Rei de Portugal? Sua filha Maria da Glória (irmã mais velha do futuro Pedro II do Brasil) ou o irmão do Imperador, Dom Miguel? Quem, nesse caso teria mais direito ao trono? A filha ou o irmão? Casa-se os dois por via das dúvidas mas ainda assim a guerra civil não foi evitada em terras lusas.

 

O debate que aqui pretendo tecer é que uma sucessão que não seja incontrovertidamente clara, sempre pode gerar debates, discussões, e não impossível, guerras. Saindo das disputas monárquicas do velho continente, atravessemos o Atlântico para a posse do atual presidente estadunidense Joe Biden, em 2020. Caso o leitor não esteja familiarizado, ou caso não se recorde do ocorrido, relembro: incitados pelo “futuro ex-presidente” Donald Trump, milhares de seus acólitos compareceram ao Distrito de Columbia, capital do país, no dia em que as duas casas legislativas empossariam o novo presidente eleito, e oponente político de Trump. Como resultado da malfadada tentativa de golpe do candidato derrotado, cinco pessoas foram mortas, pelo menos 68 pessoas presas, 14 agentes policiais feridos, um dos quais veio a falecer posteriormente.

Me refiro aqui a esse tema não como um defensor de um sistema monárquico em que a linha sucessória vai sendo formada a cada nascimento e com décadas de antecedência de uma possível sucessão. Até mesmo porque uma das últimas monarquias absolutas do mundo, a Arábia Saudita, teve vários episódios de derramamento de sangue entre primos, tios e irmãos até que se decidisse quem será o futuro rei. Nós aqui em terras tupiniquins também temos nossas regras de sucessão: Presidente eleito através de eleições livres e diretas, e na ausência desse a linha de sucessão é composta pelo Vice-Presidente, Presidente da Câmara dos Deputados, Presidente do Senado e, por fim o Presidente do Supremo Tribunal Federal que deverá convocar novas eleições.

A sucessão mais importante que temos, sem dúvida, não é aquela que se dá em caso da ausência de um presidente eleito, é aquela que ocorre com o fim do mandato de um presidente legitimamente eleito pelo povo que transfere seu cargo para outro presidente também legitimamente eleito pelo povo. Desde 2010 não testemunhamos essa cerimônia quando o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva transferiu a faixa presidencial para Dilma Rousseff. Desde então, com a cassação do mandato da presidente Dilma Rousseff, o cargo de presidente foi passado para seu vice, Michel Temer, que apenas tomou posse do cargo diante do congresso nacional jurando obediência à constituição, e em 2019 transferiu o cargo a Jair Bolsonaro.

Com as eleições da próxima semana, talvez o Brasil eleja um novo presidente, e se assim o for, como em qualquer momento de transição de poder, os nervos ficarão à flor da pele. Seja após uma vitória no primeiro ou no segundo turno, deverá haver um período de transição em que os governos de dois antagonistas políticos terão que, talvez, caminhar lado a lado para que haja, em janeiro uma passagem pacífica do poder.

O atual presidente da república já chegou a inferir que talvez “faça pantim” como dizem os nossos de não passar a faixa presidencial para um possível sucessor. Bem, a cerimônia desde que foi instaurada por Hermes da Fonseca, só deixou de ser feita uma vez, quando o presidente Sarney tomou posse sem a presença do General Figueiredo. Mas a passagem da faixa não é alfo essencial para a transição de poder. Afinal de contas, a Constituição só exige a posse do novo presidente diante das câmaras legislativas e o juramento à constituição (como feito pelo ex-presidente Temer em 2016).

O fato é que após uma derrota nas urnas, qualquer que seja o presidente aboletado no Palácio do Planalto, no dia 1° de janeiro o inquilino será posto para fora de boa ou má vontade. O dizer “Rei morto, Rei posto” é verdadeiro ainda que nas repúblicas. E um candidato derrotado, tem tanto dizer em seu sucessor quanto um rei sepultado. Faixa passada ou não, presença do ex-presidente ou não, não importa o “pantim” do falecido, como diz a canção, “o novo sempre vem”.

 

 

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