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O Alzheimer e nossos sentimentos

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Estamos em setembro e quantas enfermidades e acontecimentos foram deixadas para ser faladas este mês. Esta semana, que por minha conta e responsabilidade vou chamar da semana de reflexão e conhecimento sobre o Alzheimer. Sou filha, sobrinha de três tias e tenho incontáveis parentes que são acometidos por essa doença. Com isso, quero dizer que alguns já se foram, outros continuam por aqui vivendo a experiencia dessa doença, mas sobretudo, que todos nos ensinaram.

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Neste artigo resolvi falar de nossa experiencia com estes amados parentes, com quem por determinação divina, pudemos compartilhar essa experiencia. Em um artigo já escrito nesta coluna, falei um pouco da parte que a medicina ensina sobre a doença. Mas já foi dito tanta coisa, ensinado tantas outras, que resolvi falar do que foi viver com essa doença e que aprendizado tiramos dessa convivência.

Como não sou médica, e apesar de ter aprendido muito com essa doença, acredito que a própria medicina ainda tem muito que descobrir sobre ela. Existe um livro que chamo mesmo de um verdadeiro manual, escrito por médicos de várias especialidades, publicado pela Associação Brasileira de Alzheimer – ABRAz, chamado “Você não está sozinho… nós continuamos com você”. Este livro me ajudou muito a entender e a lidar com a doença, e continuo estudando, neste momento para escrever este artigo. Não existe ente os médicos um consenso sobre a hereditariedade dessa enfermidade. Já li muito sobre o assunto e vi várias entrevistas. Alguns acreditam na hereditariedade, outros não. No entanto, como falo de nossa experiência familiar, acredito que algumas famílias têm uma predisposição para desenvolvê-la. Neste caso, falo de nossa família por parte de mãe. De uma família de sete filhos, dois não tem diagnostico da doença, mas apresentam quadro muito forte de demência com características muito parecidas com as do Alzheimer. Outro ramo da família, também numerosa, pelo que sei, a grande maioria, desenvolveu a doença.

A ciência ainda não desenvolveu um teste definitivo para o diagnóstico do Alzheimer, este, costuma ser feito por exclusão. É observado histórico familiar e pessoal do paciente, além de testes psicológicos, para excluir a possibilidade de outras patologias. São ainda feitos testes cognitivos que avaliam habilidades como concentração, memória linguagem e orientação. Outros exames como os de sangue e urina, também são solicitados. Com relação a estes testes, nossa experiencia diz que cada um dos nossos pacientes, apresentaram quadros bastante diferenciados, chegando inclusive, a não apresentar resultados significativos.

Sei que vai parecer um tanto contraditório algumas coisas que vou falar aqui, mas com toda nossa experiencia já podemos acrescentar, que a sintomatologia é bastante variada de paciente para paciente e, ainda, outras não são consideradas ainda e que encontramos em nossos familiares. Poe exemplo, alguns apresentaram, muito cedo, um quadro de depressão, mudança de personalidade.

Nossa mãe, por exemplo, era acompanhada por uma geriatra, mas a mesma não tinha descoberto o quadro de Alzheimer. Como ela lia muito, começamos a perceber que ela marcava na revista as páginas que já lera, pois era assinante de uma publicação semanal. Encontrávamos algumas marcações “já li”; outro sintoma que surgiu muito antes do diagnóstico foi o descontrole financeiro, e como não aceitava que tinha perdido o dinheiro, culpava sempre alguém de ter tirado o dinheiro dela.

Outro hábito que desenvolveram foi, com a falta de sono peculiar da idade, iniciar o uso de medicamentos para dormir, prescritos por médicos de suas famílias ou amigos. Com o decorrer dos anos, essa medicação se tornou” obrigatória” para conseguir o sono.

No caso de nossa mãe, o diagnostico de Alzheimer só urgiu quando ela passou por uma cirurgia, para qual teve a necessidade de tomar uma anestesia geral, e ao retornar do quadro, estava totalmente desorientada e, com o passar o tempo, vários outros sintomas surgiram, cada vez mais fortes, num espaço de um ano.

Quanto às outras irmãs, começamos a identificar irritabilidade, distanciamento do olhar, mesmo estando junto a outras pessoas. Como se estivessem em outra “dimensão” Uma delas, não queria mais permanecer no mesmo lugar onde outras pessoas conversavam, preferindo se isolar, dizendo que ela não aguentava mais “aquela conversa”. É muito comum, ou foi comum nestas pacientes, elas se desligavam ou esqueceram de fazer algumas atividades laborativas que fizeram toda existência, mas não esqueciam por exemplo, a data que a aposentadoria seria paga.

Se faz necessário lembrar que os conhecimentos, ou melhor dizendo a memória antiga, dificilmente se apaga, enquanto a recente, passa a ser apenas a do momento que viveu e passou rapidamente.

No entanto, todas, mesmo a que foi diagnosticada “apenas” com demência (aos 96 anos), apresentam muito fortemente a chamada “Síndrome do pôr do Sol”. Como o próprio nome já diz, acontece no final da tarde inicio da noite e em alguns momentos podem ser bastante difíceis. Apresentam uma espécie de desespero, especificamente um constante pedido: “Quero voltar para casa” e também a mesma pergunta “onde está mamãe?”. Desnecessário dizer que nossa avó desencarnou em 1960, mas a lembrança dela e a preocupação com seu bem estar, era e é o mesmo.

Uma dessas tias, ficava tão desesperada ao final da tarde, que na maioria das vezes, foi preciso utilizar-se de medicação específica para acalmá-la; outras vezes, um forte abraço, era o suficiente para deixa-la serena como se nada tivesse acontecido.

Segundo a medicina a causa dessa Síndrome pode acontecer por alterações cerebrais relacionadas com a doença que, por sua vez, possa afetar o “relógio biológico” da pessoa. É possível também, digo por nossa experiencia, que um ambiente de calma e serenidade possa contribuir para que esses momentos, caso aconteçam, sejam menos agressivos.

Resolvi falar abertamente desse processo vivenciado por nós, com o objetivo de ajudar a outras pessoas a identificarem em seus familiares os sintomas, comportamentos e atitudes que, de início, nos causam muitos transtornos. Mas o Alzheimer não é uma doença individual, é da família, dos cuidadores, e de todos que convivem com o paciente, considerando que todos nós precisamos apender a conviver com uma pessoa que tinha um comportamento e despertava um determinado sentimento, e de uma hora para outra tudo muda. Deixamos de ter um adulto que na maioria dos casos nos ensinou, para termos um adulto que desaprende, ao contrário de uma criança.

Precisamos ter muita paciência, compreensão e muito amor. Não é nada fácil, e não se culpe se não conseguir. Procure ajuda, pois é impossível fazermos esse caminho sozinhos. Espiritualmente falando, o aprendizado é coletivo. Entre o amor e o ódio é uma linha muito tênue. Precisamos ter forças para desenvolvermos o amor. E, acima de tudo, reconhecer que o antes adulto, agora criança, precisa de muito amor e compreensão. Mesmo ele não sabendo o que está fazendo nem quem ele ou ela é, você sabe, você mais que nunca, precisa compreender esse momento de sua vida. Às vezes se torna tão difícil que parece não ter fim. Mas essa enfermidade vem muito mais para nos ensinar do que imaginamos. Quando tiver trocando a fralda, dando a comida na sua boca, limpado o xixi, que às vezes faz sem sentir, nos lugares mais inexplicáveis, cabe a você lembrar que ele ou ela já fez isso por você. Agora, é só uma mudança de lado.

Não tenha dúvidas, de quando eles partem deixam uma enorme saudade. E tudo passa como um passe de mágica.

Tem um poema de um autor desconhecido que ele fez como se fosse um paciente, veja:

Não me peça para lembrar,
Não tente me fazer entender
Deixe-me descansar
E saber que você está comigo
Beije minha face e segure minha mão.
Estou confuso além da sua compreensão.
Estou triste e doente e perdido.
Tudo que sei é que preciso
Que você esteja comigo a todo o custo.
Não perca a paciência comigo.
Não xingue nem maldiga meu pranto.
Não posso evitar o jeito com estou agindo,
Não dá para mudar, ainda que eu tente.
Basta lembrar que eu preciso de você,
Que o melhor de mim já se foi.
Por favor, não deixe de ficar ao meu lado,
Dê-me seu amor
Até que minha vida se acabe.

É isso. Nada mais!

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