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Por que Belchior nos representa

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Mas se depois de cantar você ainda quiser me atirar mate-me logo à tarde, às três que à noite tenho um compromisso e não posso faltar. Por causa de vocês. (Belchior, 1976.)

A geração na qual Belchior pertenceu não estava interessada em nenhuma teoria, nem em fantasia e nem no algo mais; o interesse mesmo era nos sucessos da telona que exibiam filmes trazendo mensagens de mudanças, da busca pelo novo, e isso interessava mais. Nada de melodia, de romances astrais. Aquela geração tinha pressa de viver.

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A geração em questão viveu na década de 1970, um tempo difícil, de repressão, de opressão, da conquista pela liberdade, principalmente para os jovens oriundos do sertão que traziam esperança na bagagem, alegria no rosto e amor no coração. Eram alegres como um rio, um bicho e um bando de pardais, ouviam o cantar do galo nas noites tranquilas e enluaradas que iluminava o sertão da sua solidão. Apesar de toda tirania, de todo o silêncio imposto pelo regime que causava medo, sentimento expresso na letra que compôs o Pequeno Mapa do Tempo, o mapa do medo e da insegurança nacional.

O medo e a insegurança pairavam em todo o Brasil, ele estava presente em todas as capitais brasileiras, qualquer desatenção, qualquer deslize poderia ser o inicio da contramão que revelava e velava nas entrelinhas da sua canção os muitos corpos empilhados nos porões da ditadura militar, os velhos fantasmas escondidos no porão. Tinha-se medo do que aconteceu e medo do que ainda estava por vir, mesmo assim se cantava muito mais.

Os jovens vestiam jeans, camiseta e tênis, curtiam Rock and Roll e Blues, andavam de motocicleta, tomavam coca cola e comiam hot dog, enfrentava a violência da noite e o movimento do tráfego tão veloz e perigoso quanto à juventude, que se delirava com o peso de suportar o dia a dia, dos dias cheios de experiências novas com coisas reais, com novas ideias e ideais que davam motivação para se andar sozinho e decidir a vida.

O conflito de geração foi muito presente naquela década. Os pais ainda eram os mesmos e os jovens não se deixavam enganar pelas aparências, enquanto os pais sonhavam com o futuro dos filhos, os filhos viviam, porque achavam melhor viver que sonhar. E as diferenças eram comuns no seio familiar, através de uma educação patriarcal que centralizava na figura paterna o exemplo a se seguir, sem contestar.

Tais discussões se davam no centro da sala e diante da mesa onde se via no fundo do prato comida e tristeza. A tristeza da dualidade, do silêncio que reinava perante a figura paterna que ocupava a cabeceira da mesa, o entendimento se dava através do olhar, mas logo o desentendimento chegava quando alguém abria a boca, e o medo paralisava a voz, serrava o peito cheio de segredos, e a mão se fechada suada de medo. Mais respeito ERA A HORA DO ALMOÇO as avós sempre diziam.

Quem daquela geração não teve vontade de meter o pé na estrada, like a rolling stone? Sem destino, sem rumo, coisa de adolescente James Dean. Quem não convidou sua menina para correr no seu carro? Loucura, chiclete e som. Porque o que há algum tempo era jovem e novo, hoje é antigo e o passado e uma roupa que não nos veste mais.

Depois de ter sofrido demais, penado pra cachorro, finalmente aquela juventude chegou sã e salva e forte a 1977, embora mais angustiada que um goleiro na hora do gol, quando mais madura encarou o amor como um sol entrando no quintal, assumiu a paixão, foi morou na filosofia e viveu a divina comedia humana onde nada era eterno.

A eternidade ficou mesmo nas letras das suas canções, na memoria de quem viveu aquela juventude e aquela historia que é talvez igual a tua, história de uma juventude desnorteada, coisa comum naquele tempo, de uma juventude desapontada, coisa comum naquele tempo, e ficou apaixonada e violenta, assim como você.

É, por essas e outras que Belchior nos representa.

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