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Por: Flávio Ramalho de Brito
Boa Esperança é uma cidade localizada no sul de Minas Gerais, distante 280 km de Belo Horizonte. No município, fica o Parque Nacional da Serra da Boa Esperança. Esta cadeia montanhosa ficou nacionalmente conhecida, em 1937, quando o cantor Francisco Alves lançou a música Serra da Boa Esperança, composta pelo carioca Lamartine Babo. A canção é considerada um dos clássicos da música brasileira e nos seus mais de 80 anos de existência nunca deixou de ser executada e regravada.
Lamartine Babo, quando fez Serra da Boa Esperança, já era um compositor respeitado e de grande sucesso popular. Havia feito Linda Morena, a introdução e a letra para O Teu Cabelo não Nega (marcha dos pernambucanos irmãos Valença), músicas em parceria com Noel Rosa (A.E.I.O.U. e A.B. Surdo), com Ary Barroso (No Rancho Fundo e Na Virada da Montanha) e era um dos reis do carnaval, com marchinhas de letras deliciosas como a de História do Brasil: “Quem foi que inventou o Brasil?/ Foi Seu Cabral, foi Seu Cabral / No dia 21 de abril / Dois meses depois do Carnaval / Depois Ceci amou Peri e Peri beijou Ceci ao som do Guarani / Do Guarani ao guaraná surgiu a feijoada e mais tarde o parati”. O parati da letra era uma bebida da época, também imortalizada no samba Camisa Listrada, de Assis Valente (Vestiu uma camisa listrada e saiu por aí / em vez de tomar chá com torrada, ele bebeu parati).
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Mas a criação da música Serra da Boa Esperança tem uma curiosa história. Lamartine Babo, ou Lalá como era conhecido, não era o que se poderia considerar um padrão de beleza, com magreza e feiura que as caricaturas acentuavam. Certo dia, Lamartine começou a receber cartas apaixonadas da cidade de Boa Esperança, enviadas por uma sua admiradora chamada Nair, com pedidos de fotos do compositor. Lalá animou-se todo e condicionou a remessa das fotos à manutenção da correspondência. Trocaram, em um ano, quase 50 cartas, até que um dia a admiradora lhe informou que iria casar e teriam que deixar de se corresponder. Algum tempo depois, Lalá recebeu uma carta de Boa Esperança, enviada por um dentista da cidade, que o convidava para assistir a apresentação de estreia de um conjunto musical amador que ali se formara. Lamartine Babo ficou feliz com o convite e confirmou a presença em Boa Esperança. Poderia ser uma oportunidade para conhecer sua antiga admiradora, e, quem sabe, ela não teria ficado viúva, se separado ou enchido o saco com marido.
Viajou esperançoso.
Ao chegar a Boa Esperança e fazer contatos com Carlos Alves Netto, o dentista que lhe fizera o convite, Lalá pediu a sua ajuda para tentar encontrar a sua fã da cidade. Foi aí que o odontólogo lhe informou o que acontecera. Quem enviara as cartas fora ele. Apreciador dos nomes em evidência no rádio, colecionava fotografias daqueles da sua predileção. Lalá era um deles. E como havia enviado várias cartas para Lamartine sem nenhuma resposta, resolveu usar nas missivas um nome feminino, de sua sobrinha Nair, uma menina, para conseguir seu intento. Ao conhecer a identidade da sua fã, gozador como ele era, Lamartine Babo aceitou a brincadeira, mas, de volta ao Rio de Janeiro, triste por não ter encontrado o seu ilusório amor, encantado com a beleza da Serra da Boa Esperança, compôs uma das suas músicas mais bonitas.
“Serra da Boa Esperança / esperança que encerra… / no coração do Brasil / um punhado de terra! / no coração de quem vai… / no coração de quem vem… / Serra da Boa Esperança meu último bem! / parto levando saudades / saudades deixando / murchas, caídas na serra / lá perto de Deus! / ó minha serra eis a hora / do adeus… vou-me embora… / deixo a luz do olhar / no teu luar… / Adeus!… / Levo na minha cantiga / a imagem da serra… / sei que Jesus não castiga / um poeta que erra… / nós os poetas erramos / porque rimamos também / os nossos olhos / nos olhos de alguém / que não vem! / Serra da Boa Esperança / não tenhas receio! / hei de guardar tua imagem / com a graça de Deus… / ó minha serra eis a hora / do adeus… vou-me embora… / deixo a luz do olhar / no teu luar / Adeus.”
Serra da Boa Esperança – Maria Bethânia
Serra da Boa Esperança – Regravação de Francisco Alves, realizada em 1952, três dias antes do seu falecimento em um acidente automobilístico, quando dirigia seu carro voltando de São Paulo para o Rio de Janeiro. Chico Alves, o Chico Viola, chamado o Rei da Voz, era, então, o cantor mais popular do País.
História linda que nos
remete a bela canção Serra da Boa Esperança e ao cantor Chico Viola de saudosa memória, vem suavizar nossa tensão nestes dias tenebrosos de coronavirus