NOITE DE FESTA

 

Presépio de Natal 

Por: João Vicente Machado

Tivesse eu aptidão poética, estaria agora bordando o cenário do natal que se aproxima, mesmo que produzisse um “Soneto de Natal” roubando o título de Machado de Assis, o célebre Bruxo do Cosme Velho, para mim o maior romancista da língua portuguesa, que me perdoem todos os escritores portugueses. 

Como a lira me é “canhestra e manca,” me volto para a jazida da infância onde se encontra o relicário de recordações de todos nós, indo encontrar em pensamento, a velha casa da Travessa São Vicente 115, hoje Rua Padre Alzir Sampaio, uma justa e  merecida homenagem ao grande pároco da minha  Lavras da Mangabeira CE

Casa cheia pela filharada de Joaquim Vicente Machado e Dona Neném, aumentada pelo acréscimo  dos sobrinhos e parentes  que meus pais acolhiam,  todos eles no mutirão dos preparativos para à Noite de Festa como era chamado o Natal, que o meu olhar de criança procurava decodificar e traduzir  para a minha mente de criança.


Recobrado do devaneio e por sugestão de Gorette, a minha companheira de caminhada, entendemos de fazer  reviver os Natais de Dona Francisquinha, (de saudosa memória) a  avó e mãe de criação que ela ainda hoje venera e não esquece. Justo a mim me coube encontrar arroz em casca para o plantio em pequenos vasos com  prazo improrrogável no dia 08 de dezembro,  dia  consagrado à concepção da virgem Maria, padroeira de varias cidades do Brasil, como Campina Grande na Paraíba e Sobral no Ceará, tarefa que considerei simples e fácil, sem nunca me dar conta que as sementes do amor, aquelas que o agricultor familiar separa  para o plantio da próxima safra, estão ameaçadas e têm os dias contados para ceder espaço “ao desenvolvimento da tecnologia.”

 

Comecei a minha busca e à medida que andava, o grau de dificuldade ia aumentando com a  data do  plantio às portas. Os grãos plantados deveriam  germinar em cinco a sete dias, para garantir  o cenário natalino do presépio a ser montado à luz  dos sonhos de Gorette. 

O único arroz que a muito custo eu  acabei encontrando, foi um quilo de arroz agulha, originário do Rio Grande do Sul e malgrado ter sido acondicionado  no vaso com os meus desvelos de Capa Gato atrofiado,  ( é esse o nome dado ao Técnico Agrícola )  até hoje não germinou e pelo visto não ocorrerá mais. 

Desalentado lembrei que as sementes do passado não muito distante, eram as sementes do amor, guardadas num silo vedado com cera de arapuá, ou mais modernamente em uma garrafa pet para livrá-las do ataque do gorgulho, nome dado ao caruncho, que é uma praga do arroz.

Despertei do meu devaneio infanto-juvenil rural, assustado e lembrei-me de um fantasma que ronda os roçados do Brasil, até hoje ainda envolto em  mistério,  chamado transgênico.

Procurei auxilio nas pesquisas da maltratada EMBRAPA que classifica Plantas Transgênicas como: “plantas que contêm um ou mais genes introduzidos por meio de técnica de transformação genética. Através desta técnica, um ou mais genes são isolados bioquimicamente e inseridos numa célula. Em seguida essa célula se multiplica e origina uma nova planta, carregando cópias idênticas do gene. As plantas transgênicas são também chamadas de Organismos Geneticamente Modificadas, OGMs. 

A Transgenia que pode ser feita em vegetais e animais, vem avançando de forma avassaladora e hoje em dia o difícil é encontrar algum alimento que não seja transgênico.


A sigla OGMs é uma chancela que  informa o nosso ingresso num mundo genético modificado e isso nos desperta para  consequências ainda não reveladas, mas que no meio  cientifico tem provocado apreensão e medo.

Toda intervenção humana na natureza, mesmo quando é feita com muito critério, tem vantagens e desvantagens e um preço a ser pago aos seres vivos e à natureza.

Se é verdade que a planta transgênica é mais resistente e mais produtiva e isso é computado como vantagem pelo agronegócio, a população consumidora precisa  saber também a que resistência se referem  as multinacionais  de sementes. Se for resistência à herbicida e biocidas, o que para eles é uma vantagem, significa que a planta  acumulará nos seus vasos lenhosos   uma carga enorme de componentes tóxicos,  deletérios à saúde  e/ou ao meio ambiente.

Vem a pergunta que não quer calar: semente transgênica  germina? e se não o fizer  a nossa agricultura familiar passará a adquirir sementes a que preço?

Segundo o portal Carta Maior três empresas controlam 53% do mercado mundial  de sementes. São elas: Monsanto-26%;  DuPont Pioneer-18,2%  e a  Syngenta- 9,2%.

Segundo informações correntes, essas multinacionais têm no congresso nacional uma influência de grande magnitude, que lhes permite exercer forte influência na  elaboração de Leis favoráveis aos seus negócios. A bancada do agronegócio, a bancada do boi e a bancada das madeireiras, em articulação com outras representações corporativistas, conferem o suporte legal necessário para o trânsito livre dessas multinacionais  no mercado de sementes. 

Para que se tenha uma ideia de grandeza, segundo o portal da câmara, www.camara.leg.br, enquanto uma saca de 60 quilos de milho está sendo negociada a R$20,00, uma saca de 20 quilos de milho transgênico para sementes custa entre R$ 480,00 a R$ 540,00. Perceberam?

É dessa forma que é tratada a agricultura familiar que abastece a minha mesa, a sua mesa e a mesa do próprio produtor do transgênico.

È numa hora dessas que vejo e ouço o inesquecível mestre que foi meu professor,  Frederico Simões Barbosa da ENSP/FIOCRUZ afirmar:

“O capital não existe para fazer filantropia e  sim  para gerar lucro”


Esses são dramas que já estamos vivendo que eu comprovei na pele e em pequena escala, representa o drama maior da população, refém de tudo isso, além da pandemia.  Pelo andar da carruagem os animais da manjedoura vão morrer intoxicados ou de inanição. 

“MUDARIA O NATAL OU MUDEI EU?”


Consulta: EMBRAPA. www.embrapa.br;

www.catamaior.com.br;

www.camara.leg.br;

scielo.br;

revistagloborural.globo.com;

Mais Lidas

Arquivo