O Terceiro Eixo, Esse é Que é o Tal

Por: João Vicente Machado Sobrinho;

O Projeto de Integração das Águas da Bacia do Rio São Francisco com as Bacias do Nordeste Setentrional-PISF, foi um sonho de dois séculos que veio a ser realizado pelo presidente Lula. O projeto, atualmente com 97% de obras executadas, na sua concepção original propôs dois eixos principais de abastecimento para a região citada: o Eixo Leste, com a tomada inicial de água feita no Reservatório de Itaparica e o Eixo Norte, com tomada inicial de água feita diretamente no curso do Rio São Francisco, mais precisamente em um trecho do Rio no município de Cabrobó, Pernambuco

O PISF adquiriu caráter de urgência à partir da crescente escassez de chuvas que se acentuou a partir da década de 1980 do século XX e que simultaneamente coincidiu com o crescimento da população. A partir de então, passou a exigir cada vez maior demanda de água e a parte onde o fenômeno era mais acentuado, era sem dúvidas a parte setentrional da Região Nordeste.

Resumo esquemático dos dois eixos do PISF

O problema de escassez de chuvas no semiárido nordestino, se transformou num grande desafio aos diversos governantes que se sucederam na presidência do Brasil.  Foi preciso a sensibilidade de um retirante tangido pela seca e pela fome, para à frente da presidência da república, enfrentar as opiniões em contrário e realizar aquela que, à sua época, foi a maior obra hídrica de toda América Latina.

Vez por outra algum governante acenava com uma perspectiva meio demagógica de solução, todas elas chanceladas da ousadia de Combate à Seca. Essa era uma bravata que de tão repetida, afetou até o bom senso dos competentes técnicos do DNOCS, nascido IFOCS e  um órgão hoje arquejante que, além de estradas construiu os maiores reservatórios de água do Nordeste.  O DNOCS tinha na sua sigla, um audacioso C que era lido como Combate.  Como se a audácia de combater as secas fosse algo possível como se imaginava no início. Se isso fosse possível, também teria sido possível combater o Gelo nas calotas polares ou à Neve nas regiões frias.

Ora, no processo de convivência com um fenômeno natural como é a escassez de chuvas, a água é necessária sim, mas não é o suficiente. Como sabemos, o Nordeste apesar de ser majoritariamente semiárido, é o mais habitado do planeta terra. Para entender essa aparente contradição, não é necessário ir muito longe em busca de uma explicação. Basta olhar para uma única palavra: adaptação. Essa é uma benesse concedida pela mãe natureza, a qual, para àqueles que ainda não perceberam, é bom saber que o grande bioma da caatinga é único no mundo. E que apesar da escassez de água, ele tem 932 espécies de plantas e mais de 1700 espécies de animais. Então as palavras chaves do sucesso não são nem Seca nem Combate.  São Adaptação e Convivência.

Nos governos ditatoriais um anteprojeto ainda chegou a ser elaborado. Todavia a ideia que parecia padecer de mortalidade infantil foi sempre abortada, pela falta de sensibilidade e de decisão política dos governantes que se sucediam. Todos eles se justificavam usando como argumento as reações contrárias dos governantes dos demais Estados do próprio Nordeste, mesmo aqueles em que parte dos seus territórios fizessem parte da região semiárida. O agronegócio instalado no Oeste da Bahia, na sua grande maioria foi contrário, por ter os olhos voltados para a monocultura de exportação, um segmento que beneficia meia dúzia de pessoas.

Os estados que mais careciam de garantia hídrica eram: o Ceará, o Rio Grande do Norte, a Paraíba e Pernambuco.

Com relação ao Estado da Paraíba, em que pese ser o Estado que possui a terceira menor área geográfica entre os quatro contemplados, talvez seja o melhor arrumado climaticamente. A Paraíba possui três mesorregiões climáticas bem definidas:

A Planície Costeira, onde predomina a outrora denominada Zona da Mata. Essa área que hoje é ocupada na sua grande maioria pela monocultura da cana de açúcar e que  incorpora os Tabuleiros Litorâneos, que são também vocacionados para a agricultura de subsistência e para a criação de gado bovino de corte.

A Chapada da Borborema, que a rigor é uma Região Agreste, é dividida em Agreste Meridional, denominado de Cariris Velhos e Agreste Setentrional também denominado Curimataú. Nela está encravado o microclima do chamado Brejo Paraibano, vocacionado para a cana de açúcar, para a agricultura de subsistência, para a fruticultura e até para a cafeicultura. É nela que é produzida a melhor cachaça branca de alambique do Brasil.

O Sertão e Alto Sertão: tem um relevo variado, e é totalmente encravado no semiárido nordestino, onde o clima é seco e quente e a vegetação predominante é a Caatinga.

 

Os sertões nordestinos de um modo geral, tiveram uma colonização mais retardada em relação à zona da Cana de Açúcar. Por isso os sertões pularam o ciclo da cana e por vocacionamento climático abraçaram a pecuária naquele que foi  o ciclo do couro. A razão do sucesso foi a utilização de animais rústicos vindos da corte portuguesa, os quais se adaptaram com facilidade ao clima semiárido como é o caso do gado bovino Curraleiro Pé-Duro de dupla aptidão, um precioso banco genético de rusticidade.

  

A Paraíba tem feito escola genética nesse segmento econômico e se transformou num grande e referenciado laboratório das atividades pastoris.   O nosso rebanho de caprinos, por exemplo, é considerado o maior e o melhor selecionado do país. O mesmo pode-se dizer sobre a bovinocultura de dupla aptidão e a ovinocultura de corte. Em suma podemos afirmar com convicção, que o nordeste brasileiro, ao contrário do que muitos pensam, é economicamente viável. Basta que aprendamos a conviver e não a combater o fenômeno da irregularidade climática, que determina a   escassez de chuvas.

Afora isso, é fundamental continuar adotando a prática de obtenção de água para dessedentação através dos métodos convencionais como:  cacimbas; cisternas de placa pré-moldada ou de fibra; poços aluvionares; barragens subterrâneas; dessalinizadores, etc.

Com o advento do PISF, que foi o maior presente para todos os natais presentes e futuros, doado pela grande sensibilidade política do presidente Lula, podemos também dizer que a água passou a não ser mais um problema crucial para o nordestino do semiárido.  A sonhada garantia hídrica que até que enfim foi assegurada e que precisa ter continuidade, deve ser disseminada e levada a todos os rincões do nordeste setentrional. Essa será a grande tarefa a ser cumprida por governantes dos quatro estados beneficiários do PISF, com o apoio imprescindível do governo federal.

 A Paraíba, talvez com o propósito de fazer o dever de casa, está pleiteando com justiça a construção do ramal do Piancó. A obra é simples e nada mais é do que uma derivação do canal principal do Eixo Norte, a partir da Barragem de Porcos no município cearense de Brejo Santo. A vazão máxima de retirada será em torno de 4m3/s, com um primeiro trecho de mais ou menos 25Km de extensão, em que a água será bombeada até a nascente do Rio Piancó, no divisor de águas entre os dois Estados. Do ponto de descarga livre, seguirá por gravidade até o Açude Condado, de onde será distribuída através da macro bacia hidrográfica do Rio Piancó. O complexo Coremas-Mãe d’água será o grande ponto de acumulação para distribuição a posteriori.

Mapa de situação do Ramal do Piancó     

Atualmente as águas do eixo leste, através da calha do Rio Paraíba, têm condições de percorrer todo curso do Rio a partir da cidade de Monteiro até chegar à Foz. Entretanto, para uma melhor distribuição dessas águas, o Estado da Paraíba, ainda na gestão do ex-governador Ricardo Coutinho, Idealizou, projetou e iniciou a construção do Canal das Vertentes Litorâneas com 112Km de extensão e curso transversal, dividido em três lotes, dos quais um deles já foi inaugurado, o segundo está em estado avançado de obras. Com a conclusão dessas obras, atualmente à passo de tartaruga, metade da parte Sul e todo Leste do Estado estarão comtemplados. Assim também ocorrerá com o Eixo Norte onde todo Oeste e metade da parte Norte do Estado serão comtemplados.

O Eixo do Piancó é um complemento hídrico necessário para contribuir com a microcobertura hídrica do restante do território paraibano. Ele irá contemplar uma área do Norte do Estado, uma faixa transversal com aproximadamente 95 Km de extensão, além de metade da parte sudoeste da Paraíba. O investimento total será de aproximadamente RS$ 3,5 bilhões de reais e o binômio custo-benefício é plenamente satisfeito.

A viabilidade econômica e social é indiscutível, pois a água promoverá a saciedade de uma população de mais de 185 mil habitantes, em 25 cidades e seus distritos, afora a zona rural.  A despesa anual com uma gigantesca frota de caminhões pipas além da perspectiva de estimulo à agropecuária e à agricultura de subsistência irrigada, serão encerradas por muitos anos.

A área de cobertura do projeto, é majoritariamente vocacionada para a cultura do arroz vermelho, um cereal ecologicamente recomendável, do qual a Paraíba é a maior produtora do Brasil. Além disso, há a perspectiva da fruticultura irrigada além dos componentes da lavoura de subsistência da agricultura familiar como: feijão, milho, algodão, e a micro pecuária leiteira.

No aspecto industrial a cidade de Itaporanga irá precisar de água para suprir o polo têxtil que desenvolveu   e hoje em dia sedia várias industrias de tecelagem, que abastece o mercado interno do Estado ainda atende à exportação.

Conclusão: A água do Ramal do Piancó será a garantia hídrica de que o sertanejo do semiárido necessita para provar o que dizia Euclides da Cunha, “O Sertanejo é antes de tudo um forte.” O maior exemplo de sucesso na convivência com a estiagem nos vem de países da Europa.  A França por exemplo, na área metropolitana de Paris, tem uma precipitação pluviométrica média anual de 619 mm/ano, o que equivale a 51,58 mm/mês. La como aqui ali e alhures a distribuição das chuvas também não é uniforme e não se fala em seca.

A cidade de Piancó, situada no cerne do Vale do Piancó tem uma precipitação média de 838mm/ano o que equivale a 69,83mm/mês e só se fala em seca.

 Alguém já ouviu falar em escassez clamorosa de água, seja na França, na Espanha ou na Itália? Pois bem, elas existem sim! e com certeza, a produção de excelentes vinhos, cervejas e queijos, sejam fruto de um manejo adequado tanto da agricultura quanto da pecuária e de um grande ganho de produtividade.

Isso seria possível? Recomendo aos incrédulos uma visita à fazenda Carnaúba em Taperoá que é um laboratório exitoso do clima do semiárido fundado pelos primos Manelito e Ariano Suassuna com o fito de provar por A mais B que o Nordeste é viável sim, e nunca um estorvo como querem nos caracterizar.

Esse trecho não encerra o assunto e é apenas um rápido panorama, En passant dessa gigantesca obra que é o do PISF.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Referencias:

Precipitação em Paris, França Precipitação média e dias com precipitação;

Conhecendo-a-agricultura-de-ile-de-France;

Atlas Pluviométrico da Paraíba – AESA;

Fotografias:

Como funciona a transposição do rio São Francisco projeto explicado pelo exército — FUNDAJ;

Padre usa a internet para denunciar o sofrimento causado pela seca no nordeste – Nacional – Estado de Minas;

SENAR participa da 5ª edição do Dia D da Fazenda Carnaúba – SENAR PB;

APARTE DO CURRALEIRO PÉ DURO PARA O DIA D!

Conhecendo-a-agricultura-de-ile-de-France;

O boicote ás águas da transposição do Rio São Francisco | Site do João Vicente Machado

 

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