O Charlatanismo Religioso

Por: Rui Leitão;

Essa é uma temática complexa e delicada, mas enseja um debate urgente e imperativo. Sabemos que o Estado brasileiro não adota nenhuma religião como oficial, conforme assegurado no art. 19, inciso I, da Constituição Federal de 1988. Portanto, a liberdade de crença e o exercício de cultos religiosos são garantidos pela Carta Magna vigente. Porém, surgiram líderes religiosos que utilizam a fé das pessoas para praticar atos lesivos ao patrimônio e à saúde, distorcendo os ensinamentos da bíblia e induzindo os fiéis a lhes seguir de forma cega.

É importante que se estabeleçam mecanismos de controle e acompanhamento da prática da liberdade religiosa, buscando alcançar um equilíbrio entre os aspectos legais desse livre arbítrio e os limites de exploração da fé das pessoas. O charlatanismo sempre se fez presente onde existam agrupamentos humanos, por interesse de alguns sobre multidões necessitadas. Personalidades narcisistas buscam construir personagens fictícios estimuladas pela vaidade e ambições desmedidas, apresentando-se como “ungidos de Deus”. Normalmente são indivíduos despossuídos de excelência intelectual, mas são carismáticos e conseguem encantar multidões.

Encontramos num conto de Machado de Assis, escrito no século 19, intitulado “O Segredo de Bonzo”, um exemplo de alguém que se dedica à manipulação e à alienação do ser humano. É uma sátira bem construída de como as massas podem ser seduzidas por quem se investe do papel de orador eficiente, ainda que medíocre, à semelhança dos “profetas da fé” que conhecemos na contemporaneidade em nosso país. Eles cobram de seus seguidores o “testemunho de consagração e vitória”, ainda que falso, buscando convencer as pessoas de que através das doações podem alcançar o Reino de Deus. Colocam-se como pastores acima de qualquer julgamento.

O personagem principal do conto de Machado de Assis defende que “a coisa precisa existir na opinião, mesmo que não exista na realidade”. É a estratégia adotada por essas missões da fé, alinhadas à Teoria da Prosperidade, fazendo com que os fiéis sejam convencidos pelos testemunhos falsos, o que, entendem, seja o suficiente para a glória de seus projetos. Machado de Assis já, naquele tempo, mostrava a raiz do charlatanismo: a necessidade do ser humano crer em qualquer coisa que possa lhe dar alguma esperança de dias melhores, por mais absurda e impossível que seja. E disso se aproveitam os enganadores.

Essas considerações referem-se ao surgimento de uma influência de charlatanismo religioso, praticado por um pregador mirim, de nome Miguel Oliveira, jovem adolescente, com mais de um milhão de seguidores no instagram, que se diz profeta, com capacidade de fazer “revelações” e curas, tendo iniciado seu ministério aos três anos de idade beneficiado por um milagre divino, já que teria nascido sem as cordas vocais e os tímpanos. Jamais apresentou o laudo que confirmasse essa afirmação. Alega que teria sido roubado de sua residência.

Nas suas pregações, transmitidas pela mídia, exagera no gestual e no pronunciamento de palavras desconexas como se fossem de um. Idioma próprio dos profetas. Uma de suas expressões ganhou grande repercussão nas redes sociais, quando imitando outro pregador, gritou “off the king, the power, the best” o que não faz qualquer sentido na língua inglesa. Tem sido alvo de críticas, inclusive, de pastores das mais diversas denominações evangélicas.

Imagens/Internet: TIK TOK

Contudo, a sua “performance” midiática está dividindo a opinião pública. Uma parte vendo-o como um verdadeiro instrumento de Deus para a realização de milagres e manifestação de profecias. Mas há, também, muitos que o enxergam como um charlatão, que chega a cobrar 30 mil reais para pregar em igrejas, utilizando-se do oportunismo e da fé alheia.

O caso já está sendo investigado pelo Ministério Público e, mais recentemente, foi proibido pelo Conselho Tutelar de continuar participando de cultos. A verdade é que tem demonstrado vocação para enganar os incautos e se tornar, no futuro, mais um pastor milionário.

Rui Leitão

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