Onze cadeiras no STF. Uma mulher – e um vazio

Imagem; AGRONOTICIAS BRASIL

Por: Alanna Aléssia;

Os dias 25 e 26 de março elevaram exponencialmente as menções ao Supremo Tribunal Federal. Ouso dizer que esta foi uma das sessões de julgamento mais acompanhadas pelos brasileiros. E, mesmo ciente dos infinitos malefícios que a superexposição e a midiatização excessiva dentro da Suprema Corte podem causar, acompanhei atentamente cada momento.

O motivo da ampla audiência ao tribunal mais importante do país foi a decisão da Primeira Turma, presidida pelo ministro Cristiano Zanin e composta por Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Luiz Fux e Cármen Lúcia, sobre aceitar ou rejeitar a denúncia da Procuradoria-Geral da República contra o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro pela tentativa de golpe de Estado.

Enquanto as redes sociais fervilhavam com debates acalorados e palavras como “anistia”, “réu“, “golpe”, “STF” e “democracia” dominavam as conversas, outra palavra tomou conta de mim: representatividade.

Olhei para a ministra Cármen Lúcia em cada pronunciamento. A única mulher naquela turma. A única mulher na Suprema Corte. E isso me incomodou profundamente – como mulher, como jurista, como cidadã.

Desde a criação do STF, em 1891, apenas três mulheres ocuparam uma cadeira na Corte: Ellen Gracie, Rosa Weber e Cármen Lúcia. Três. Enquanto os homens ultrapassaram a marca de 160.

E por que isso me incomoda?

Porque estamos em março, um mês carregado de simbolismo para a causa feminina (não pelas flores, não pelos textos bonitos, mas por nossos direitos). Um mês que começa com o Dia Internacional da Mulher e nos lembra da necessidade urgente de mais respeito, mais igualdade, mais oportunidades.

Em um mundo que insiste em dizer que já ocupamos espaço demais, olhei para o Supremo Tribunal Federal e enxerguei um vazio.

Olhar para Cármen Lúcia ali me trouxe uma profunda angústia. Só temos ela. E ela está sozinha.
Não desmereço nem questiono a capacidade técnica dos ministros que a cercam, mas há algo que eles jamais poderão fazer pela pauta feminina: viver a nossa realidade. Eles podem tentar compreender, podem até se sensibilizar, mas nunca ocuparão esse espaço com a mesma legitimidade, porque não carregam em si a experiência de ser mulher. E a ausência dessa vivência traz consigo um imenso vazio. Uma lacuna que nunca será verdadeiramente preenchida.

Nós, mulheres, conhecemos bem as dificuldades diárias que nos cercam. Vivemos em uma sociedade forjada pelo machismo, que nos negou e retardou o acesso aos direitos mais básicos: estudar, votar, trabalhar, viver.

O Brasil teve seu primeiro curso de Direito em 1827, mas apenas em 1902 formou sua primeira advogada. Mesmo assim, com todo o atraso premeditado, hoje as mulheres representam 50% da advocacia brasileira. E, ainda assim, apenas uma única mulher ocupa uma cadeira na Corte mais importante do país.

Um dos julgamentos mais assistidos de todos os tempos acabou. Mas a pergunta que martela na minha cabeça é outra: quando Cármen Lúcia não estiver mais lá, quem estará?
A resposta me inquieta. Me mantém alerta. Me tira o sono.
Porque o que virá depois será o silêncio. E, como a história já nos mostrou, com ele virão o esvaziamento das nossas pautas, o retrocesso, a exclusão

As cortinas se fecham. E nós, mais uma vez, somos empurradas para fora do palco.

É março de 2025. Mas olhei para a composição do STF e me vi em 1827.
E, infelizmente, hoje não consegui sorrir.

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