Por: Emerson Monteiro;
Desde criança algo mexe comigo aos finais do dia, quando, no Cariri, o Sol busca o outro lado da Serra e deixa conosco uma claridade neutra antes de sumir de todo lá além, nas bandas do Poente. Perdura isso qual meditação, silêncio contundente nos refolhos do sentimento. Lembro algumas das histórias que minha mãe nos contava quanto aos períodos de seca no Sertão, forçando migrarem os que viviam daquele lado aonde seguia o Sol, nas terras do Pernambuco; e buscavam Crato e Juazeiro do Norte, lugares menos áridos, à procura de alimento e sobrevivência. Eram eles os flagelados, famintos, desgarrados de suas terras, então sem safra, sem animais, longe dos meios de existir.
Meus pais tinham amigos que moravam em Bodocó, na zona rural, e, de vez em quando, vinham nas segundas-feiras e ficavam na minha casa, Com eles eu conversava sobre o lugar onde viviam. A mim parecia notícias de sonhos, livros, voos pela imaginação a mundos desconhecidos. Um passeio a seguir o Sol nessas horas de sumir detrás da Serra.
Certa comadre de minha mãe notava o meu interesse nos assuntos que contava e pesava nas tintas, trazendo detalhes inventivos e estendendo os enredos e prolongando os contos. Enquanto isto, eu também observava o seu gosto pela fantasia, lhe ofertando livros de ficção, do tempo dos reis, rainhas, aventuras medievais, cavalaria, príncipes e princesas, o que recebia com evidente satisfação e os levava consigo. Depois, nem lembro mais se nos reencontramos. Só sei que ainda hoje sinto satisfação de haver alimentado seu gosto pela literatura.
Desse jeito, também sou, viajando nos pores do sol à procura desse inominado que a luz transporta a outras terras, após haver clareado o tanto da Terra onde habitamos. Fico a considerar quem e onde outras situações irão acontecer na força do Astro Rei em suas andanças pelo mundo afora. E o que fizemos aqui de sua luz naquele dia onde ele sumiu mais uma vez logo ali detrás da Serra.