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João Pessoa

A Casa de Hóspedes

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Essa semana me deparei com um vídeo da atriz britânica Helena Bonhan Carter recitando o poema “A casa de Hóspedes” de Jalaluddin Rumi. E as palavras ressoam em minha mente como um eco há dias.

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Isso de ser humano é uma casa de hóspedes.
Toda manhã uma nova chegada.

Uma alegria, uma depressão, uma mesquinharia,
Uma percepção momentânea chega
Como um visitante inesperado.

Receba e entretenha a todos!
Mesmo que seja uma multidão de tristezas,
que varre violentamente a sua casa
e a esvazia de toda a mobília,
ainda assim trate cada hóspede honradamente

Eles podem estar limpando você
para a chegada de um novo deleite.

O pensamento sombrio, a vergonha, a malícia,
receba-os sorrindo à porta, e convide-os a entrar

Seja grato a quem vier
porque todos foram enviados
como um guia do além.

Acredito que quando nos reconhecemos em algumas obras de arte, é porque elas funcionam como uma espécie de espelho em que nos vemos refletidos. Sejam elas reflexos dos nossos “eus” presente, passado, ideal, ou até mesmo o reflexo de uma memória, de um amor.

Nesse poema eu vi refletido um velho costume de, durante uma tempestade, ao invés de se fechar todas as portas e janelas da casa, abrir-se a porta da frente e dos fundos, simultaneamente, para que a tempestade, ao invés de castigar a casa com a sua força, atravesse-a como se fosse mais um simples espaço da natureza.

Acredito que num mundo que tanto nos prega a proatividade, o “correr atrás”, o “não fazer nada” torna-se uma tarefa hercúlea. Somos condicionados à ideia de que tudo depende apenas de nós mesmos, quando, na verdade, muitas coisas (geralmente as mais importantes) estão fora do nosso alcance. Isso torna-se uma receita perfeita para a frustração.

É verdade que a alternativa, como prega o poema, não é fácil. Ao buscarmos abandonar o sentimento de frustração, nos deparamos, invariavelmente, com o sentimento de resignação.

Não sei se é uma boa troca, ou qual o mal menor, mas as vezes a única alternativa é a mudança.

Peço licença ao leitor para me valer de mais um jargão popular que diz que loucura é repetir a mesma ação reiteradamente e esperar resultados diferentes. E aqui eu acredito que nos deparamos com um grande divisor entre o modo de agir e lidar com a vida. Loucura ou constância?

Com a chegada de cada hóspede, cada um diferente do outro, tratá-los todos honradamente pode ser chamado constância.

Lutar para que esses “hóspedes” não entrem com todas as armas possíveis, pode ser como lutar contra a tempestade: loucura. Contudo, me parece que a vida, como um rio, como uma corrente de ar que atravessa casa, é um fluxo constante de pessoas, sentimentos, momentos, e processos, e tentar represá-los pode até funcionar por um certo período, mas mesmo as mais fortes represas são construídas com grandes comportas para que, mais cedo ou mais tarde, o fluxo natural por ela interrompido possa mais uma vez seguir seu caminho natural, que sem esses sistemas de alívio levariam ao transborde ou rompimento.

Cotidianamente nos deparamos com situações de tristeza, pobreza, morte, velhice… E constantemente nos é dito que tudo depende de nós. De lutarmos e “irmos atrás”.  Não sei como lutar conta a tristeza, ao não ser senti-la, a pobreza é explicada em inúmeros manuais econômicos e em nenhum deles vi meu nome, a morte e a velhice realmente estão fora do meu alcance.

Acredito que Rumi está certo quando diz para sermos gratos a todos os hóspedes que surgirem à nossa porta, porque, realmente, acredito que são enviados como guias, professores e protetores.

Fechar as nossas portas a eles não farão com que eles partam para nunca mais voltarem, na melhor das hipóteses fará com que eles partam e voltem em outro momento que sintam que sua visita é necessária, em outros casos podem mandar hóspedes mais fortes que a nossas portas e que revirarão a nossa casa sem a nossa permissão e nos darão uma lição mais difícil.

A verdade é que nem todos os hóspedes são boas companhias, alguns são verdadeiros folgados, barulhentos, outros glutões e uns outros ainda mal cheirosos, mas acho que podemos concluir que é melhor abrir as portas da casa para a tempestade do que tentar lutar contra ela. Não sei você, mas eu sou ruim demais em engenharia para confiar em alguma represa construída por mim mesmo.

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