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Olhar e Sonhar

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Por:Neves Couras;

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Durante muitos anos, no tempo que morava em Brasília, eu vivia em uma das chamadas Cidades Satélites, e trabalhava no Plano Piloto. Saía de casa as 6h e voltava por volta das 19h, indo direto para a escola. Neste tempo, lembrando que vivíamos ainda os tempos da Ditadura, o próprio Governo do GDF – Governo do Distrito Federal – após o término do segundo grau, obrigava-nos a passar por um teste vocacional que nos direcionava para a escola que oferecia o referido curso. Nessa época, por ter sido apontada em um teste vocacional, cursava estatística.

Toda essa introdução, é para dizer que neste percurso que fazia à noite, sempre que podia, ao apanhar o ônibus, eu dava preferência às cadeiras da janela, pois era ali, que eu voltava minha visão para as casas que ficavam ao longo do percurso, para tentar olhar para seus interiores.

Não se tratava de xeretar a vida de ninguém, mas eu ficava a imaginar como seria a vida de cada família daquelas residências. Minha imaginação viajava pensando como viviam àquelas famílias, se eram felizes, se tinham crianças, se as mulheres tinham seus maridos, se naquela casa existia felicidade, fartura ou falta de alimentos.

Às vezes eu comparava a vida que nós tínhamos com a vida daquelas pessoas. Quando a casa era mais bonita e mais estruturada que as suas vizinhas, eu atribuía que naquela, certamente, as pessoas tinham um pouco mais de recursos financeiros, e assim, eu conferia que aquela família era feliz.

Com o tempo, já que o caminho era o mesmo, eu já direcionava o olhar para algumas, específicas. Ficava tentando ver seus moradores para que eu pudesse conhecer um pouco mais de cada um daquela casa.

Ficava pensando se em todas as famílias existia alguém como eu que precisava trabalhar de segunda a sábado, para contribuir com o sustento de minha família. Nesse percurso, tentei muitas vezes estudar, já que eu passava uma a hora e meia ali sentada. Já cansada, sem muita coragem para olhar as matérias que eu tinha de estudar, não conseguia. A vida das famílias daquelas casas era mais forte em minha imaginação.

Meu desejo foi sempre o de estudar, mas a vida às vezes nos leva por caminhos que não são o que desejamos, mas o que podem ser. Apesar de tudo, eu não poderia deixar de estudar, era a oportunidade que eu tinha de tentar melhorar de vida. De prover à minha família, pois eu e meu irmão, próximo a mim em idade, éramos, frequentemente, únicos provedores do restante da família.

Por isso, a vida daquelas famílias, sempre me chamava atenção.
Depois, já na Paraíba, fui trabalhar com comunidades rurais, esta parte, a maioria de nossos leitores já sabe. E, foi aí que pude entrar, não naquelas casas que eu passava durante o percurso do trabalho-escola-casa. Pude conhecer um pouco da vida das pessoas, e muitas delas, nada tinha de parecido com a minha. Não se tratava de ser melhor ou pior que a minha. Esse conceito, depende de cada um.

Lembro que ainda muito pequena, presenciei casais do interior que casavam com seus corações repletos de felicidade. Construíam uma casa de tijolos feitos pelo noivo e seus familiares, seus móveis eram apenas a cama de casal, uma mesa com meia dúzia de tamboretes, dois potes, cobertos com lindos “paninhos” bordados pela noiva, para que tivessem água fresca para beber, duas cadeiras de balanço na sala, e uma rede armada nesta mesma sala para se deitarem nas horas de descanso e para escutarem um rádio de pilha sobre uma mesinha coberta com um paninho bordado, pois esses adereços faziam parte do enxoval da noiva. O marido, trabalhando na lavoura; depois os filhos que chegavam e, quando estavam na idade de ajudar ao pai com a lida do gado, também faziam parte dessa vida tranquila e sem muitos desejos.

Conheci outras casas simples, com uma família muito numerosa, que não tinham, segundo o conceito de muitos, como serem felizes. Tive a oportunidade de perceber que cada família, cada pessoa, tem a vida que lhe é possível. Felicidade talvez seja um conceito que se aplica a diversos modos de vida, inclusive à possibilidade de nada ter ou de tudo ter em termos de bens materiais; em matéria de união, de paz e ter uma enorme satisfação por apenas conviver com sua família, de acordar com o aparecer do sol, dormir quando as estrelas aparecem, e ter como relógio, apenas o sol.

Para outros, a felicidade existe quando tem uma grande casa à beira mar, várias pessoas para lhes servir, carros de marcas que poucos têm acesso, viagens na hora que o tédio tenta lhe aparecer, ou apenas pousar nas redes sociais grandes festas, “AMIGOS” por ocasião e roupas de marca. No entanto, vazios. Por isso tenta buscar mundo afora aquilo que está dentro de si mesmos e não sabem.

Vou aqui, buscar no Estoico Sêneca: “viver de modo feliz …todos almejam, mas quando se trata de ver, com nitidez, o que torna feliz a vida, então os olhos ficam ofuscados”. Acredito que por se ter os olhos ofuscados com falsos valores, não vejamos que ser feliz é apenas ter o coração sereno e uma vida ciente de que ao sermos retos e seguidores do bem, já é uma boa parte do que sonhamos ser felicidade.

Ela não está nas estradas que passamos e imaginamos como vive cada um, talvez imaginando que eles tenham a vida que procuramos, mas como vivemos e os valores simples que colecionamos dentro de nós.

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