Antes do advento da internet, todas nós, moças, nos primeiros anos da juventude, naquela época em que nossa vida corria de forma diferente, começavam a despertar nossos sentimentos.
Coisas que antes não dávamos muito valor. Acredito ser o tempo que foi chamado de adolescência, alguns pais preferem chamar o período de nossa “aborrescência”.
Para nós meninas, não é um período muito fácil. Lembro de poucas coisas dessa época, mas confesso que só tinha que reclamar da minha desproporcional aparência. Muito mais alta que a maioria de minhas colegas de escola, muito magra e com pernas que permanecem até hoje muito finas. Em matéria de amigas, em função da vida de viajante, duas me marcaram como amigas de verdade. Uma quando morávamos em Brasília e outra em Anápolis.
Por estes dias estava relembrando as primeiras festas que fui. À época todas as colegas de turma completavam 15 anos. As que tinham situação financeira melhor, ofereciam festas, que, confesso, jamais esquecerei. Não podia ficar até o melhor da festa, pois quando mal começava, minha mãe, mandava meu irmão ir me buscar. Era no início da festa mesmo. Mas o tempinho que ficava lá já era o suficiente para ver o quando as moças e rapazes iniciavam seus momentos da paquera. Acho que momentos como estes não esquecemos. Eu nunca fui de beber, e naquela época, quando se bebia era a famosa “Cuba Libre”. Nunca soube se alguém usava algum tipo de droga, pois nunca foi visto ou comentado. O que eu gostava mesmo era de dançar. Evidente que contávamos no máximo com um violão e, quando muito, uma radiola com discos de vinil. A festa estava feita.
O melhor mesmo eram os comentários na semana seguinte, e os namoros que eram iniciados naquela festa. Tempos maravilhosos de nossas vidas. Não existia os grandes shows que, por exemplo, minhas filhas tiveram a oportunidade de ir.
Não existiam as grandes bandas e suas estruturas para festas voltadas para nosso meio social. Mas a vida seguiu, as responsabilidades aumentaram, e muitos de nós jamais nos encontraremos, e não soubemos como encontrá-los novamente.
Uma das razões que eu posso dizer que, se pudesse, não perdia as festas em Pombal, era porque lá que, eu já com 19 anos, pude, com o apadrinhamento de minha prima Paula e seus irmãos, participar das melhores festas e tive os melhores momentos de minha vida. Pude reencontrar grande parte de meus primos e, assim, criarmos laços de amizades. Seus amigos se tornaram meus amigos também.
Como disse antes, a vida seguiu mais uma vez. O trem da vida passa por caminhos inesperados, nos leva em algumas estações totalmente desconhecidas. Muitas vezes, descemos nestas estações, onde nossos amigos e parentes não descem conosco. Nova vida nos é oferecida pelo destino, embora naquele trem deixemos alguns amigos que, ainda hoje, estão em nossos corações.
No livro “Sobre a Morte e o Morrer”, de Elisabeth K. Ross, ela nos fala de nossas atitudes diante da morte. Observando suas palavras nesta obra, algumas atitudes nossas, não acontecem apenas diante da morte. Aliás, acho que, convicta que sou da continuidade da vida, as atitudes por ela descritas são perfeitamente coerentes com alguns estágios de nossa existência, não me refiro à morte do corpo apenas, mas a situações que representam a finitude. Por exemplo, um relacionamento que compactuamos com o outro, seja por um casamento ou por uma união que nos leva a conviver com a outra pessoa, mas essa convivência não é mais justificada pelo sentimento que, nas primeiras estações, vivia-se o encantamento, a construção de uma vida, e que ao descer naquela estação, tinha o propósito de vida. A vida que é comum quando duas pessoas se unem por amor; por querer se tornarem um e, tornar-se muitos. Falo dos sonhos, dos filhos, da vida a dois, que mesmo não sendo só de flores, pode ser sentida e vivida com dignidade, respeito e amizade.
Quando esse pacto de união se rompe, seja por quaisquer das razões, seja porque um dos companheiros muda sua personalidade e se torna um estranho para o outro e para a família; os sentimentos que a autora descreve como se fossem a morte podem ser sentidos igualmente. Na verdade, é uma “morte”, mas dos sentimentos que provocam no outro as mesmas reações.
A Dra. Ross fala de:
1) negação e isolamento;
2) raiva;
3) barganha;
4) depressão;
5) aceitação;
6) esperança.
São exatamente as mesmas reações que temos diante dessa morte em vida. Quando começamos a sentir que o outro não é mais o mesmo, a nossa primeira reação é a de negar o que está acontecendo, acreditando que o outro possa estar passando por problemas no trabalho ou alguma dificuldade que não quer dividir. Nos afastamos numa espécie de isolamento, para dar tempo ao outro para resolver seu problema e voltar a ser como antes. Ao descobrirmos que o que está acontecendo é uma traição, uma mudança de comportamento duradouro, sentimos que não temos mais pelo outro a compreensão de deixar pensar, repensar e voltar.
Passamos a sentir raiva pelo sentimento não correspondido, a morte do sonho se torna pesadelo e decepção. Procuramos, então, barganhar, na perspectiva de recuperar ou de corrigir algum erro que supomos ter ocorrido, mas nada muda. O relacionamento vai se tornando cada vez mais insuportável e percebendo que seu sonho desmoronou, desenvolve, em primeiro lugar, a tristeza, que dependendo das relações familiares, se torna imperceptível, vindo logo em seguida a depressão.
Quando a mulher chega a identificar que algo não está bem com ela, que aquela tristeza já se prolongou por muito tempo e ela procura ajuda profissional, começa aí, um novo rumo dessa vida que já passou por tantos dissabores, ela percebe que precisa mudar. Dependendo do seu nível cultural, do meio em que vive essa descoberta é acompanhada de amargura e de tristeza que podem desencadear uma série de enfermidades, pois seu corpo, não suportando mais tantas cargas negativas, como se diz popularmente: transborda com a gota d’água. Não mais por uma grande quantidade de problemas, mas por pequenas coisas que aquele corpo e aquele coração não suportam mais.
Se for uma mulher que recebe ajuda, por identificar que sua tristeza já transformada em depressão, surge então a melhor amiga em todas as situações: a esperança! É através dela, e com ela, que poderemos nos transformar.
O trem da vida pode voltar para os trilhos antes perdidos. Contudo, para que tudo isso aconteça, essa mulher precisa contar com apoio, compreensão e entender que ela é a principal personagem nessa história. Ela precisa trazer de volta aquela jovem que outrora sentiu o prazer de viver. Ela precisa buscar identificar se ainda pode contar com suas antigas amigas, seus sonhos deixados de lado…
Esse, é um texto destinado a todas as mulheres, que foram, por inúmeras razões, colocadas de lado como se fossem objetos que se tornam obsoletos em uma relação, em que, na verdade, não se desgastaram apenas os móveis, os interesses comuns, mas um sonho. Mas os sonhos podem ser recuperados, a vida pode ser retomada, e dessa feita, ela terá mais sabor e mais alegria. Não podemos deixar que a morte de um relacionamento, muitas vezes de muitos anos, possa trazer a morte de nosso corpo nem de nosso espírito. Podemos renascer das cinzas, melhores, mais maduras e mais sensíveis. Podemos nos renovar não só na aparência, mas na força de uma mulher que aprende a se amar e a se tornar o encanto de uma nova história de amor. Não com outro, necessariamente, mas com você mesma. Sejamos a vida, a alegria e a Esperança para outras mulheres que, como nós, tomaram o trem errado em alguma estação da vida.
Obra Consultada: Kübler-Ross. Elisabeth- Sobre a Morte e o Morrer. Ed. Martins Fontes, São Paulo – 2002.