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Em época da farinha pouca…

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Foto: crédito: Gomez

Já há quase um ano se debate, discute e analisa a invasão russa na Ucrânia. E como qualquer outro tema que envolve a Europa, mais cedo ou mais tarde a discussão respinga nos países para cá do Atlântico. No último dia 30 de janeiro, o chanceler Alemão Olaf Scholz, em visita oficial ao Brasil, solicitou ao presidente Luís Inácio Lula da Silva que doasse munições, de fabricação alemã, para serem usadas no conflito europeu, ao que o presidente brasileiro recusou por preferir não tomar partido na guerra, ainda que indiretamente, o que aconteceria, invariavelmente, se passássemos a suprir a Ucrânia com munição. E, ainda, corrermos o risco de nos indispormos com a Rússia, parceiro no Brasil, Índia, China e África do sul nos BRICS.

Alguns podem argumentar que a postura do presidente brasileiro foi equivocada, e que ao não apoiar a Ucrânia, estaria, indiretamente, apoiando seu invasor russo.

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Algo parecido ocorreu mais de 70 anos atrás, quando, a bordo do encouraçado Minas Gerais, Getúlio Vargas proferia um discurso um tanto favorável à ascensão do fascismo europeu (o qual claramente inspirava o seu Estado Novo), discurso esse que causou um certo desagrado nos países ocidentais o nos círculos nacionais favoráveis à democracia. Inclusive, seu ministro do exterior, Osvaldo Aranha, evocando o argumento de Rui Barbosa na Primeira Guerra afirmou que “a neutralidade não era admissível entre os que destroem a lei e os que a observam”.

Contudo, usando as palavras de outro contemporâneo de Getúlio, Winston Churchill, “nós não temos amigos ou inimigos, apenas interesses”. Rubens Ricupero, em sua obra “A diplomacia na construção do Brasil” nos traz:

Os anos Vargas sempre fascinaram os estudiosos, que rivalizam na invenção de fórmulas de impacto para captar a essência política externa brasileira desse tempo: jogo duplo, diplomacia pendular, equidistância pragmática. Com exagero maior ou menor, o que tais expressões se esforçam em detectar não é tanto uma real possibilidade de opção “político estratégica” pelo nazismo alemão e sim o oportunismo de explorar as chances de ganhos econômicos e comerciais enquanto isso foi exequível, isto é, até o envolvimento dos Estados Unidos na guerra.

Em resumo, Vargas usou, enquanto pôde, da rivalidade entre os blocos conflitantes no conflito mundial ao seu favor. O que resume muito bem, até os dias de hoje, a política externa brasileira que se pauta no mote “Em época de farinha pouca, meu pirão primeiro”. No caso atual, pelas sanções impostas pelas nações ocidentais à Rússia, essa é obrigada a vender seu petróleo a um preço abaixo do valor de mercado. E, como sempre, montadas em sua hipocrisia congênita, as nações europeias não compram mais o petróleo russo, mas continuam comprando o vital gás natural que abastece suas casas.

Para além do centro do debate, nações como Índia e China vêm se valendo dos baixos preços das embargadas comodities russas para abastecerem seus mercados nacionais e impulsionarem as suas exportações. Apesar de as nações “semi-envolvidas” no conflito não comprarem mais o petróleo russo, a Índia o faz. Compra o petróleo russo, refina-o e revende para nada supreendentemente: os países europeus.

Então apesar de bons moços e defensores de democracias e invulnerabilidade territorial, os países centrais nada mais são que fachadas. Continuam, ainda que indiretamente, financiando a Rússia, enquanto fazem alvoroços e malabarismos para doarem ou venderem equipamentos bélicos para a Ucrânia.

Um outro ponto de discussão recente tem sido a iniciativa do presidente brasileiro em tentar fundar o chamado “Clube da Paz”, que reuniria uma espécie de “grupo de países não alinhados” com o conflito europeu para, entre si, e juntamente com os envolvidos, não mais se discutir tomada ou recuperação de territórios, sanções ou financiamentos, mas sim a paz.

Além do óbvio objetivo de pôr fim à guerra que já se arrasta há um ano, e talvez tirar de cima da cabeça do mundo a provável evolução do conflito para mais países ou até mesmo para um conflito nuclear que não é visto desde que os EUA bombardearam o Japão em 1945. O presidente brasileiro observa que a situação econômica global de inflação generalizada passa, invariavelmente, pela resolução do conflito.

Hoje, a situação de alta inflacionária que muitos países vivem se dá devido a, basicamente, dois fatores principais: o final da pandemia e a guerra na Ucrânia. E ambos os cenários promoveram o movimento de aumento da demanda (fim da pandemia) e queda na oferta (guerra). Que faz com que os preços aumentem ao redor do globo e o dinheiro passe a ter um poder de compra menor (inflação).

Aqui tentarei falar o mínimo de “economiquês” possível, mas o que precisamos entender é que como todas, ou quase todas, as transações globais se dão em dólar, este pauta as reservas e os valores das economias mundo afora. Isto posto, num mundo onde as pessoas querem consumir mais produtos e que concomitantemente há uma escassez desses produtos, pela lei da oferta e demanda, o preço desses produtos sobe, colocando em circulação muito dinheiro. Aqui temos um cenário com muito dinheiro e poucos produtos.

Como forma de tentar resolver essa questão, existem algumas opções, sem a guerra na Ucrânia e a volta da normalidade nos fluxos de comércio global, passaríamos ao não ter mais escassez de produtos, o que resolveria um lado da equação, contudo, há um ano vemos cada vez mais distante essa possibilidade.

Outra opção, que é a que vem sendo adotada por muitos países é a alta dos juros, que age na outra extremidade do problema. Com os juros em alta, principalmente os juros nos EUA que influenciam todo o globo, as pessoas que têm alguma reserva financeira “emprestam” dinheiro aos bancos centrais, através da compra dos títulos do tesouro, e, assim, tira-se uma determinada quantia de dinheiro do mercado, o que faz com que o dinheiro passe a “valer mais” devido a sua menor oferta, como também desestimula o consumo fazendo com que a demanda por produtos caia e, consequentemente, o seu preço.

Contudo, infelizmente essas manobras econômicas têm alguns efeitos colaterais. Com a alta dos juros e um ambiente internacional altamente instável, os investidores, ao invés de usarem seus recursos para financiar investimentos produtivos como fábricas, infraestrutura e outras formas de gerar, ativamente, emprego, renda e lucro, preferem ater-se a investimentos mais seguros como os títulos da dívida de países estáveis.

Consulta: Internet/GOOGLE

Desta forma, o dinheiro que poderia estar circulando mundo a fora fazendo o globo se desenvolver após a retração causada pelos anos de pandemia, fica guardado nos cofres dos bancos centrais e, apesar de isso fazer com que se controle, em certa medida, a inflação, compromete-se o desenvolvimento econômico global que além de gerar lucro passa a gerar emprego, qualidade de vida e riqueza nas mais diversas formas.

Então, a imparcialidade brasileira, e, diga-se de passagem, de outros mais de cem países em relação à guerra na Ucrânia vai muito além do apoio ou não à democracia e a causa ucraniana. Parte do entendimento que, inclusive para a própria Ucrânia, a continuação da guerra só criará dificuldades para todo o mundo.

E, neste momento, não devemos incentivar a continuidade do conflito, mas buscar, de forma unida, e incluindo os chamados países periféricos (que são sempre quem mais sofrem quando os gigantes brigam), uma paz que trará o fim da instabilidade global que a todos prejudica.

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