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É uma revolta? Não, Madame, é uma revolução

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Fonte.Foto: WWW.RAINHASTRAGICAS.COM

Dentre as inúmeras frases atribuídas à última rainha da França, Maria Antonieta da Áustria, consta essa em que dizem ter a rainha perguntado a uma de suas damas se o que ocorria nos portões de Versailles era mais uma das cotidianas revoltas populares. Ao que a serviçal respondeu que não, mas sim uma revolução.

Acho a frase pouco crível considerando que, ao contrário do costume burguês, os “serviçais” da nobreza mão eram outros que não a própria nobreza. Duquesas, marquesas e baronesas se acotovelavam no serviço da rainha, e na situação de verem  uma multidão invadindo o palácio, estariam tão ou mais assustadas que a própria monarca.

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Até hoje se debate a diferença entre golpes, revoltas e revoluções. Golpes de Estado, como o próprio nome sugere, são ações rápidas e repentinas no qual um governo legítimo é suplantado por um outro governo opositor apoiado comumente por forças militares ou de segurança. Por sua vez, as revoluções são processos mais aprofundados que envolvem uma mudança social provocada e acompanhada pela sociedade como um todo. Algo similar às revoltas que apesar de se originarem em grupos subalternos da sociedade se limitam, tanto nas causas como nos efeitos, a uma esfera menor, seja mais localizada regionalmente ou a um determinado grupo de indivíduos.

Um pouco comicamente, ao meu ver, o termo revolução vem da astronomia e significa a volta que os planetas dão em torno do sol, o que hoje chamamos de translação. Ou seja, uma revolução planetária é o movimento que um planeta faz em torno do sol até que volte ao seu local de partida. E, ao meu ver, também é o que acontece com as revoluções sociais. Acho inescapável observar que a Revolução Francesa, marco do fim da era moderna e início da idade contemporânea, gerou movimentos como o Terror, de Robespierre, que entre 1793 e 1794 proporcionou as cenas mais famosas da Revolução Francesa em que cabeças caiam às centenas vítimas de “Madame La Guillotinne”. Até que o próprio Robespierre foi decapitado.

Poucos anos depois, em 1799, subia ao poder Napoleão Bonaparte que se coroaria Imperador dos Franceses em 1804 e até sua derrota em Waterloo 1815. Nesse meio tempo coroas seculares da Europa seriam depostas e exiladas, dentre as quais a própria Coroa Portuguesa que fugiu de Portugal em 1807, gerando, de norte a sul do continente, guerras e rompimentos institucionais.

Alguns defendem que pelo simples fato da instituição da “Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão”, que tem seus princípios vivos até hoje, a Revolução Francesa está corretamente classificada como tal, contudo, outros advogam que para a população francesa da época pouca coisa mudou e que a mudança de poder se deu apenas na cúpula do poder e nas grandes cidades, o que a qualificaria como uma revolta ou um simples Golpe de Estado.

Fonte: Cidadania | Ciências Sociais

No Brasil, apenas no século XX, temos dois emblemáticos casos que fomentam debates até hoje. A instauração do Estado Novo por Getúlio Vargas em 1930 e o Golpe Militar de 1964. No primeiro caso, a historiografia nacional é quase unânime em se afirmar que apesar de não ser democrático, o processo de 1930 se tratou de fato de uma revolução pela completa transformação das estruturas governamentais de então o que gerou, nas palavras do próprio Getúlio, um Estado Novo, uma contrapartida à “República Velha”, em que reinava a política dos governadores, também conhecida como Política do Café com Leite, em que se alternavam no poder oligarquias regionais do sudeste do Brasil no comando da república. Fato encerrado com a candidatura de Getúlio Vargas do Rio Grande do Sul e João Pessoa, paraibano, candidato a vice.

No caso do primeiro de abril de 1964, apesar de eu não ter dúvida alguma de ter se tratado de um Golpe de Estado, para além, podemos, por eliminação, chegar à mesma conclusão. Não se tratou de uma revolução por não se alterar a forma de governo. Continuamos com um presidencialismo bicameral, e também não houve envolvimento algum das massas no tal ato; também não foi uma simples revolta porque mergulhou o país por 21 anos num regime totalitário e ditatorial; o que nos resguarda a alternativa de que: foi golpe.

Os atentados ocorridos no domingo, 8 de janeiro de 2023, quando uma turba de vândalos depredou as sedes dos 3 poderes em Brasília, podemos enquadrar tal ação num velho hábito dos revoltosos: o terror. Desde Robespierre, quando não havia ninguém a salvo e todos poderiam ser informantes dos revolucionários. O terrorismo existe como uma prática política na qual, através de atos violentos e simbólicos, grupos perpetram atos que incutem na mente da população um sentimento de medo que faz com que mudemos nosso modo de agir e de pensar, seja cotidianamente, seja politicamente.

Acredito, assim como vários analistas políticos que o que s vândalos que destruíram as sedes dos três poderes no Distrito Federal não acreditavam ou tinham em mente de, naquele momento, tomarem o governo para si, como em um golpe, mas sim, tinham como intuito a instauração de um domínio de terror em que as instituições e a população não saberiam como e quando esperar um novo ataque e quais seriam as suas próximas consequências, gerando assim uma instabilidade social e institucional que tornaria impossível a instalação e continuidade de um novo governo.

Fonte: Espaço Democrático

O fato é que nos dias que transcorreram desde então, pudemos ver, como nunca antes, uma união de poderes e instituições contra quaisquer atos, perpetradores e financiadores de atos que atentem contra o regime democrático vigente.

Inaceitável, talvez até mais que os próprios atos golpistas e terroristas, foi a latente conivência das forças de segurança com aqueles que fizeram nosso país manchete em jornais ao redor do mundo. É inaceitável que as forças armadas e de segurança ainda alimentem sentimentos golpistas mais de 30 anos após a redemocratização do nosso país. Sendo bastante pragmático, da mesma forma que a esses entes, armados e treinados pelo Estado, lhes é vetado o direito de greve por se constituir motim, também lhes é vetado o direito de emitir quaisquer opiniões sobre o governo vigente. As Armas são entes de Estado, não de governo. Isso quer dizer que devem seguir, sem questionamentos, quem quer que seja o chefe do Estado Brasileiro.

Às armas é exigido um serviço “cego e mudo” ao governante da vez. A própria rígida hierarquia exigida das corporações se fundamenta no princípio de que devem, simplesmente, cumprir as ordens que lhes são dadas.

Aos juristas deixo o serviço de tipificarem os crimes cometidos por aqueles que vestiam verde e amarelo, roupas camufladas, ou ainda, terno e gravata. Contudo, o que eu, e você caro leitor, podemos fazer nessa situação, é, mais do que nunca, nos mantermos atentos aos atos que se desenrolam ao nosso redor. Não nos interessarmos por política não é mais um luxo que podemos nos dar. A nossa democracia é fruto de luta, e ela exige que lutemos por ela. Que não aceitemos atentados contra o povo, o patrimônio, nossos poderes e seus representantes. A civilidade, o comportamento e os atos republicanos são o único caminho aceitável. O mundo já nos dá desafios demais. Moramos num mundo em colapso ambiental, passando por dificuldades econômicas e com a fome e a desigualdade assolando o globo. Não é hora, nem jamais será, de deixarmos que as conquistas do passado, como a democracia, se esvaiam de nossas mãos quando já temos tantos outros novos desafios a enfrentar.

É uma revolução? Não, Madame. É um golpe.

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