Ele disse que foi verdade, meu pai disse que não foi

Mergulhando nos tempos idos da minha infância, que já vão longe, guardo algumas histórias ocorridas em nossa casa, em especial, as mal-assombradas. No final de 1960 meu pai foi transferido para Lavras da Mangabeira – CE e assumiu a direção do Posto Agropecuária e a casa em questão era a residência oficial do diretor.

Esses eventos eram corriqueiros naquela casa antiga, sem energia elétrica, isolada e na zona rural. A casa era ampla, alpendrada, todos os ambientes eram grandes, muitas árvores e muitas lendas. Nunca me esqueci da pitangueira que ficava ao lado direito do alpendre quase nos fundos da nossa casa.

Todos os finais de tarde meu pai nos levava para a cidade. Entrávamos no seu Jipe 1958 e íamos para casa da minha avó; tudo era uma grande diversão: a praça, a Matriz, as brincadeiras infantis, as cadeiras nas calçadas, o bar de Seu Zé Alves com um delicioso sorvete de coco, refresco de tamarindo e a alegria de viver. Tudo era gostoso demais.

Quando saíamos para o passeio o sol estava se pondo. A casa ficava fechada, às 18 horas o vigia da noite entrava para acender os candeeiros e a Petromax que ficava na primeira sala. Um certo dia, ele abriu a porta da frente, acendeu a petromax e pendurou na mão francesa, passou pelo corredor que dava acesso aos quartos e entrou no quarto do casal, e sem olhar para os lados apanhou o candeeiro que estava em cima do guarda roupas, colocou-o no chão, tirou a manga, puxou o pavio e acendeu, depois colocou a manga de volta e deitou-o em seu devido lugar.

Ao se preparar pra sair um forte vento apagou o candeeiro. Irritado acendeu o candeeiro outra vez, resmungou e se voltou para a porta. De repente e sem esperar se deparou com um homem alto e forte com os braços e pernas abertas ocupando todo o espaço da porta, de forma que ele não tinha brecha para passar.

Nesse momento o pavor tomou conta do seu ser e num ato de desespero se abaixou, mirou por entre as pernas do suposto homem e numa grande carreira atravessou a barreira e alcançou o corredor, passou pela sala deixando a porta aberta, e na carreira foi parar na casa de um funcionário que prestava serviço na nossa casa durante o dia, anteriormente, foi também, vigia da noite e acabou entregando o cargo por medo do que via e ouvia no interior da casa.

Pálido, mudo, gelado de medo e com as pernas trémulas quase não conseguiu contar o que ocorrera. Abdias, o dono da casa, tentou acalmá-lo com um copo d’agua e uma cadeira para sentar-se. Passado o susto, contou o que vira e pediu que alguém fosse até a nossa casa para fechar a porta que ficara aberta. Quando retornamos da cidade já passava das 21 horas, e seu Cazuza estava à espera do meu pai para entregar seu cargo. Ainda nervoso, gaguejando, pediu para ser aproveitado em outra função, demitindo-se sumariamente da vigia. Com muita insistência ele mais uma vez relatou o que aconteceu naquela noite. O que não deixava de ser um sofrimento, pois, para ele era como reviver a cena de terror.

E para piorar a situação meu pai não acreditou na sua história e durante um bom tempo ele continuou jurando ser verdade e meu pai jurava que era imaginação.

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