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Manual de como não criar filhos machistas

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Aceitei um certo desafio, provocado por uma citação que fiz no artigo anterior. Chamei a atenção das mães, dizendo que como são elas que, na maioria das vezes, são responsáveis pela criação dos filhos, de certa forma elas foram e são responsáveis por criarem filhos homens como “machões”.

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Para falar desse tema, nada melhor que uma pequena história, que acredito ser do conhecimento de muitas de nós, mas que, ou passou despercebida, ou, pela nossa cultura machista, foi sendo replicada ao longo das gerações e temos, ainda hoje, uma série de problemas, gerados por esse machismo exacerbado nas famílias.

Confesso que a minhas experiências, e vivencias não foram identificadas em uma só família. Não estou criando uma história, até poderia, pois quem escreve, ou fala de suas experiências ou cria uma linda história. Bem que gostaria de ser uma boa contadora ou criadora de histórias, mas confesso que contando as minhas experiências, já se torna possível escrever muita coisa.

Bem, vamos falar do acontecido, e depois poderemos acrescentar um pouco de teoria sociológica, que possa nos dar a “sustentação” para essa história, para mim, ainda estranha. Como já andei escrevendo aqui, e acredito que se continuar escrevendo por mais um tempo, vocês irão conhecer grande parte da minha vida. Não é por acaso, que também venho sendo instigada a escrever, não diria uma autobiografia, mas uns belos contos de minha vida. Quem sabe, se não aceitarei o desafio?

Mas o caso foi o seguinte: Depois de casada, e já com a primeira filha nos primeiros meses de nascida, resolvemos fazer uma visita aos meus sogros, pessoas que posso garantir, terem feito parte da minha vida de forma muito positiva. Os tinha como pais, e os admirava por várias razões. Como nossos últimos artigos tem se voltado a falar de nós mulheres e de nossas histórias de vida, essa é mais uma que tem muito a nos ensinar sobre a história do machismo, praticado, ou usando outro termo, perpetuado por mulheres.

Enfim, fomos visitar nossos sogros que nasceram e terminaram suas trajetórias de vida no sertão, e o primeiro objetivo da viagem, fora apresentar a nossa primeira filha aos avós. Infelizmente, por pura falta de orientação, e como já falei, por ser ainda muito jovem, não amamentei minha primeira filha, fato que me cobro ainda hoje, pois os outros dois filhos nascidos depois, tive a enorme satisfação e prazer de amamentar. Mas esta primeira, tive que utilizar de outro tipo de leite para alimentá-la nos primeiros meses de nascida. Para aumentar minha preocupação, depois de muitas tentativas com leites industrializados, que ela rejeitava todos, finalmente aceitou o leite de vaca.

Tínhamos que ir todos os dias buscar, na fonte o leite para a alimentação de Carol; mas, vamos ao caso: Chegando lá na casa de minha sogra, sempre bem recebidos, chegou o momento de ter que ir para cozinha para ferver o leite, esfriar e por fim, colocar na mamadeira para oferecer à criança. Como eu não poderia fazer tudo isso com a criança no braço, e não tinha babá para fazer o trabalho, chamei o pai para ficar com a criança, para que eu realizasse o trabalho. Para minha surpresa, minha sogra, só faltou pular da cadeira de revolta, dizendo que na família dela, homem não ajudava mulher segurando filho.

Essa colocação, confesso, me pegou de surpresa: em primeiro lugar, porque na casa de meus pais, não havia essa história de meu pai não participar de nossa criação. Quando nossa mãe, estava ocupada, pai colocava filho para dormir, dava mamadeira, participava ativamente de nossas atividades, supondo eu ser uma coisa normal de um casal. A verdade, é que mesmo o acontecido ter me provocado grande surpresa, ainda fui capaz de dizer: Pois aqui o caso é diferente: “o pai vai ficar com ela, porque além de não ter como fazer toda essa atividade com uma criança no braço, ela foi feita por nós dois.”. Acredito, que devo ter provocado neles todos um verdadeiro escândalo, mas foi assim, que fui quebrando alguns preconceitos implantados naquela família como em outras. Sei que fui considerada meio que fora da curva. Fui criada por uma mulher de muita fibra e apesar de toda sua formação clássica e cheia de limites, ela também foi além de seu tempo. Andava a cavalo, foi professora rural – isso significa que saia de sua casa, para morar na casa dos fazendeiros onde havia uma sala de aula para oferecer educação a seus filhos.

Talvez por esta postura, ela nos criou para o mundo. Ou seja, lá em casa, não havia atividade que o homem não podia fazer, ou a mulher. Fomos criados aprendendo de tudo. Mas qual o significado disso?

Quando disse que as mulheres são responsáveis por uma criação abusiva, me referi ao fato de que, muitas vezes, essa mulher apenas replica a sua vivência. Contribuindo, contudo, para que seus filhos repetissem as atitudes de um marido, de irmãos ou de pais que exerciam sobre ela uma relação de poder e de submissão. Para muitas mulheres, essa atitude era repetida para que seus filhos homens fossem realmente “machos”. Sei que muitos conhecem o ditado muito utilizado no interior que bem demostra isso que estou colocando: “Segure suas cabras, que meus bodes estão soltos”.

Essa, é uma das colocações mais desrespeitosas, repetidas inúmeras vezes por pais, para mostrar que o homem, normalmente seu filho, pode desrespeitar a mulher. Quando colocações como estas, ainda são repetidas, nos mostra o machismo que coloca a mulher, como seu bem de posse, e como um bem, dele pode usar e fruir ao seu bel prazer. Encontrar famílias onde as mulheres são totalmente submissas e humilhadas por seus maridos e, muitas vezes filhos, não é caso raro.

Quando uma mãe, se deixa envolver e passa a ser agente de reprodução de uma educação que prega que seus filhos precisam ser machos e, como reprodutores que possuem um certo rebanho, precisam manter seu poder, ela está desrespeitando, em primeiro lugar a ela mesma, em segundo, dizendo por atos e permissões, que seus filhos vejam outras mulheres, como ela foi vista por seu pai, por seu marido, e assim, a história se repete.

Em se tratando de educação, é muito comum que as mulheres sejam educadas a “se darem ao respeito”, mas raramente se cobra dos homens que respeitem. A nós, mulheres, fundamentalmente como mães, nos cabe não só interromper o ciclo do machismo, precisamos criar filhos anti-machistas, precisamos ser parte da formação de uma nova geração em que a igualdade dos gêneros não precise ser mais uma questão a ser reivindicada, mas um fato dado.

O ditado já afirma que “costume de casa vai à praça”, e é assim, ensinando que todos merecem respeito e são iguais em direitos e deveres que se quebra o ciclo do machismo que mata mulheres todos os dias, mas não só isso, que cobra que homens não cuidem de sua saúde e negligenciem seus sentimentos.

Não imagine vocês que a busca da liberdade da mulher não encontra entraves só na classe masculina, mas na feminina também. A busca de nossa liberdade, foi a primeira neste processo, a segunda, é a busca de nossa existência como seres capazes, tanto quanto os homens, de produzir e exercer as mais altas funções intelectuais. E nosso papel, como mães e como mulheres, em nosso espaço de viver e ser, contribui para que tornemos nossos filhos menos machos e mais humanos.

Dias e dias se passam, a sociedade se diz evoluída, mas mulheres, mesmo sendo a maior parte da população, fica, ainda, na dependência do que o homem decide. Se é casada, ainda se submete à vontade do marido, por uma questão secular, que ela perpetua ao aceitar tal condição, bem como repassa para as filhas essa submissão. Os índices de violência contra a mulher só aumentam. Aumentam, porque o homem, sente necessidade, bem como se sente à vontade, para mostrar sua masculinidade tendo a mulher sob sua tutela.

Se você duvida disso, observe por exemplo em um bar, quantas mesas estão repletas de homens, enquanto suas mulheres estão em casa “em nome da moral e dos bons costumes”. Essas palavras, fazem parte da cultura machista popular. Mas se fosse ao contrário, o que aconteceria quando essa mulher chegasse em casa com sinais de embriaguez? O Homem pode ao final do trabalho, sair com os amigos para aliviar o estresse, mas a mulher, se fizer isso, passa a não ser mais bem vista como uma boa esposa ou uma boa mãe.

É hora de repensarmos que valores estamos, nós mulheres, como mães ou esposas, contribuindo para a perpetuação desse machismo. É muito comum, vermos nas famílias, as cunhadas serem colocadas em segundo plano, ou mesmo como ser desprezível, pelas irmãs sobrinhas e famílias do próprio marido. São questões como estas, que nos levam a refletir, que se tenho atitudes como estas, como posso defender a independência e o respeito da mulher. Quando eu mesma estou contribuindo com esse processo?

Simone de Beauvoir tem uma frase que diz: O mundo sempre pertenceu aos machos”.

Esse é o título de um de seus livros, que retrata muito bem, a dependência da mulher desde que se inventou que a mulher foi criada da costela de Adão. A submissão imposta pelo homem à mulher não é nova. Mas pode ser nova a atitude de se repensar como, eu, mulher, posso influenciar e contribuir para uma sociedade mais igualitária. Onde homens e mulheres possam viver em perfeita harmonia. Assim como diz a música de Roberto Carlos, o côncavo e convexo. Com direitos e obrigações iguais. Mas não podemos mais admitir que mulheres sejam machistas e perpetuem essa cultura. Todos somos iguais diante das Leis de Deus e dos homens. Mas precisamos urgentemente, repensar nossas atitudes, para não nos alinharmos às fileiras dos machistas.

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