O Homem e a mulher, na contemporaneidade, vivem uma busca desmedida pelo poder e pelos prazeres deste mundo. Essa forma de viver sempre foi almejada e não se pode dizer que exista erro em tal busca. Quem nunca pensou em ter sucesso, ser reconhecido(a) por onde passe, ter a melhor casa da cidade, o melhor e mais caro carro do ano, ter o homem ou a mulher, mais bonitos, para desfilarem ao seu lado, como demonstração inequívoca de poder e felicidade?
Entretanto, será mesmo que a vida “funciona” assim? Assisto muito pouco a programas de televisão, não porque não goste, mas porque os programas apesentados hoje, em sua grande maioria, ao invés de informar, deturpam a educação, as artes, e mostram a vida dos grandes ídolos do momento, provocando em mim, alguma coisa que não creio ser muito saudável. Não que eu não goste de um bom filme e uma boa história de amor. Poder ver as grandes belezas de lugares que talvez eu não chegue a conhecer nesta vida me impulsiona, ver lugares de significado histórico, ou mesmo as mais diversas formas de arte, desde a mais antiga até a atual. Não pensem que só gosto de antiguidades, bem que gosto de ver os murais pintados na rua por grandes artistas anônimos, e que nos fazem refletir sobre a nossa realidade social. Enquanto a arte clássica, não deixa de nos mostrar e ensinar, além da história de uma época, a vida econômica de um povo. Lá vem, a economia em minha cabeça. Mas sou assim.
Em primeiro lugar, precisamos urgentemente voltarmos (ou começarmos) a ler. A leitura, abre caminhos, nos leva a lugares e a personagens encantadores. Além de nos ensinar. Com o avanço da tecnologia, às vezes imagino que deixaremos de escrever à mão. Nossas letras, que em muitos casos, nos deixam características, impares, podem desaparecer. Quantas pessoas encontro por aí, que falam não gostar de ler, porque os textos são enormes. “Cansam minha beleza”. Com isso, vem a lembrança de meu pai, que quando me via com livro a mão, por brincadeira, pegava, folheava rapidamente, e dizia: “esse livro não presta, não tem figura”. Claro que para ele, com todo humor que lhe era característicos, era verdade. Nunca desenvolveu a arte da leitura.
Você já percebeu que quando vai a um consultório médico, por exemplo, as pessoas, estão todas grudadas ao celular, de forma que não percebem nem quem está ao seu lado?
Estamos vivendo uma espécie de desprezo pelo ser humano. As pessoas não estão mais preocupadas com o outro, nem com alguma coisa que vá além do agora. Os sentimentos, são como pinceladas feitas com tintas altamente solúveis. Viver o agora, o presente, é importante, contudo, somos também, não podemos nos esquecer, produtos das experiencias que anteriormente vivemos. Não estou só me referindo a vidas passadas, mas às experiencias vividas nesta existência, também.
E a felicidade, onde fica nesta história? Percebo que viver, simplesmente, não nos faz melhores. A vida é uma arte, mas a Arte da Vida, assim como diz Bauman, é mais profunda.
Como podemos ser felizes, se vivemos os momentos como relâmpagos. Bauman, autor de “Arte da Vida”, nos traz um exemplo que vivenciei, assim como muitos de minha geração. Nossos quartos, quando nossos pais permitiam, eram adornados com pôsteres de nossos ídolos, seja da música, do cinema e mesmo das telenovelas. Mas como uma onda que passava, quando outras telenovelas surgiam, outros ídolos, aqueles anteriormente colados em nossas paredes, eram descolados, ou simplesmente outros, eram colocados sobre os anteriores. Os antigos, perdiam o valor. Afinal, surgiu um mais novo, mais bonito.
É claro, que ao deitarmos, ficávamos admirando aqueles homens e mulheres lindos, cheios de fama, e imaginávamos pessoas bem sucedidas na vida. E a nossa vida? Em que tempo paramos pra pensar quando cuidaríamos de transformar a nossa vida em arte? Em uma bela arte? Só a partir desses pensamentos, dessa necessidade que passamos a sentir que precisávamos de algo a mais, que decidirmos, finalmente, deixar de viver a vida do ídolo, por exemplo, e construirmos a nossa própria existência. Neste tempo de vida surge o pensar no futuro e que a tal felicidade que víamos ou imaginávamos nas histórias de nossos artistas preferidos, também poderia ser construída em nós. Acredito que só aí, com os primeiros namorados ou namoradas, nas festas e nas danças de corpos colados, e pequenas caricias trocadas, dava-se o início a vida adulta. E com ela vem o pensamento da felicidade, mas como construir uma vida e sermos felizes, ou melhor, o que precisamos para sermos felizes?
Assim, o conceito de felicidade para nós, naquele momento e naquela idade, era tão efêmero, passageiro. Mas sabíamos que precisávamos nos identificar como pessoa e ser pertencente a este lugar. E não discordem, mas esse lugar está tão escondido em nossas entranhas que nem mesmo nós, sabemos o seu significado.
Falo sempre da “Mãe Terra”, mas havia em mim um sentimento que não permitia, ou não me deixava ver, que com relação à terra, eu carregava um grande conflito. Eu amo a Terra, mas não a queria como bem, como posse. Achava que a Terra não pertence a ninguém. Ela é a Terra – é um bem de todos nós e que dela devemos cuidar e respeitar. Talvez, porque eu e, claro, meus antepassados não muito distantes, após grandes perdas, tivemos de deixar de associar as terras como lugar, como bem. Tanto na minha família como a do pai de meus filhos, aconteceu a mesma coisa. Todas as duas famílias tiveram seus lugares, arrebanhados pelo poder público, para serem cobertos pelas águas.
Hoje, um desses lugares, fica no distrito de Cajazeiras – Engenheiro Ávidos – nome do Engenheiro que construiu o açude que ainda cobre as terras dos antepassados dos meus filhos. O Outro é o Açude de Condado, ou Engenheiro Arcoverde, e no Centro desse açude, está submersa a casa de meus avós, onde nasceu minha mãe. Estou contanto essa história, apenas para nos situar, e sabermos diferenciar posse de pertencimento. Por muito tempo não percebi que me recusava a pertencer por medo de possuir. Medo de atrelar o meu pertencimento à propriedade. Propriedade que, como vi desde menina, pode ser tirada de nós. Hoje entendo os títulos de posse de terra apenas como uma formalidade que diz que aquele lugar a que pertenço e que vive em mim, está sob minha posse, ou propriedade.
Comecei também a refletir nesta questão do lugar que está em nós. Quando na convivência com as minhas tias que passaram pelo Alzheimer, assim como minha mãe, todas em um certo tempo da doença, desconheciam a casa que morava e diziam: “quero ir para casa”. Mas que casa seria essa? Tentava mostrar os móveis que elas mais conheciam, para mostrar que estavam em casa, mas toda conversa era em vão. Depois comecei a perguntar como era esta casa, o que tinha nela… imaginem: todas descreviam a casa onde nasceram. Aquela submersa. Sempre perguntei, e me pergunto: será esse lugar onde vivemos nossos momentos de felicidades e de acolhimento dos nossos pais e familiares?
Com o passar dos anos, cada um de nós, em nossa geração e nas gerações anteriores, começava sentir falta de algo mais. Parar pra pensar “quem sou eu?”, já era o inicio de uma construção, e para se construir, precisamos fazer escolhas. E, ainda, se fiz minha escolha, preciso cuidar e lembrar que daquilo que cuido, pode ser eternamente, parte de mim.
Assim, a minha felicidade, passa a depender de minhas escolhas. E quando me refiro à felicidade, não é um conceito subjetivo. A felicidade pode ser duradoura se faço as escolhas certas. Mas para isso, preciso saber quem sou, e como quero ser. Sim, porque ao longo de nossa vida, acabamos deixando de lado o que inicialmente, pensei ser e viver, e passo a viver o que outro, ao qual me uno, começa a pensar e a fazer de mim.
Em plena juventude, isso, na maioria das vezes, não se percebe. Mas, quando chegamos à idade que começamos a descobrir o que realmente vale a pena, nos deparamos com uma desconhecida infeliz. Por mais que eu queira separar a vida material da espiritual, não consigo. Seria negar o que acredito, e quem realmente me ensinou, ou seja, deixar de ser cristã, assim como me foi ensinado por Jesus.
Voltar às raízes, a casa que tenho guardada em minhas lembranças e as pessoas que me ensinaram e me fizeram felizes, é um belo começo. Não cheguei aqui neste lugar, agora, já estive aqui, como um ancestral, corre em minhas veias sangue de mulheres que enfrentaram as piores coisas ao aqui chegarem. Se descubro em minha consciência, tudo que está lá bem guardado e só Deus sabe porque guardei, preciso resgatar. É neste resgate, que me reencontro. Que me redescubro. Dentre essas descobertas, preciso descobrir como fui. Porque sou feita e construída de tudo que vivi, de todas as emoções, amores, lugares, pessoas e vivências.
Quando uma mulher em plena idade da razão e da sabedoria, se descobre e se permite soltar as correntes que a impediam de se expandir, aí sim, ela encontra a felicidade. E assim como a casa submersa e coberta pela água, ela emerge plena e forte. E melhor, que idade tenho? Não importa: Sou eu reconstruída, refeita, plena e capaz de representar e externar toda força que já tivera. Começar, recomeçar, se encontrar é a felicidade que nos renova e nos faz plena.
Não posso esquecer, que sou parte de minhas escolhas, não posso culpar ninguém, pelo que até então eu fui. Portanto, cabe a mim, a minha vontade e a minha força e viver a felicidade. Como a Terra que me acolheu e me cuidou, agora preciso cuidar além de mim, dela. Pois minha Mãe Terra, vai me ajudar e me sustentar nessa nova descoberta. Essa não é a felicidade, é parte dela, mas, é o suficiente, é a que preciso para ser feliz e viver em plenitude.
Como nada acontece por acaso, quando estava terminando este texto, recebi uma mensagem no facebook, na verdade é uma reportagem sobre o Papa Francisco, e como o bom Francisco de Assis, tenho profunda admiração por ele. Então, me permitam concluir esse artigo com as palavras do querido Irmão:
“Ser feliz é deixar viver a criatura que vive em cada um de nós, livre, alegre e simples. Você tem maturidade para poder dizer: “Eu errei”. É ter coragem de pedir desculpa. É ter o sentido de dizer “eu preciso de você”. É ter a capacidade de dizer “eu te amo”. Que sua vida se torne um jardim de oportunidades para felicidade… para que na primavera ele seja um amante da alegria e no inverno um amante da sabedoria.
“E quando errar, recomece. Porque só assim você estará apaixonado pela vida. Vai descobrir que ser feliz não é ter uma vida perfeita. Mas use as lágrimas para irrigar a tolerância. Use suas derrotas para treinar sua paciência.