O Jambeiro que compõe história de uma vida

Final de tarde após um dia de sol escaldante em pleno mês de abril, abro a janela do meu quarto e passo a admirar quase numa oração de agradecimento o verde exuberante e a imponência do talhe do velho jambeiro plantado há quarenta anos no jardim em frente a nossa casa, por Mundica a nossa irmã mais velha.

Nascida e criada no sertão, habituada a cuidar, plantar, proteger, chegando à cidade grande onde é voraz e intenso o apetite de destruir o meio ambiente. A minha irmã Mundica que morava comigo, ficou desapontada com tanto descaso, porém não desistiu de procurar o verde e a ele se dedicar, cultivando no pequeno jardim várias espécies de folhagens e flores: bogaris, roseiras, jasmins além de plantas medicinais. Pedindo mudas aos vizinhos, arrancando-as das praças e jardins de modo que logo ficamos cercados de flores e cheiros.

Mesmo assim ela  ainda sentia falta das sombras das árvores, dos encantos da floresta que deixara para traz, de modo que plantar uma árvore no pequeno espaço do jardim tornou-se para ela a realização de  um sonho, quase uma ideia fixa a qual eu não dava importância nenhuma e até procurava dissuadi-la de realizar.

Mundica continuava insistindo tenazmente,  no seu projeto de plantar uma grande árvore, mostrando várias benesses que ela podia nos trazer,  sendo principal delas a de nos proteger do calor do verão visto ser a casa voltada para o sol poente. Ela nos  lembrava  sempre que seria tão somente nós a nos beneficiar, uma vez que com a saúde frágil ela não participaria desse privilégio. Realmente ela faleceu menos de dois anos depois de plantar um arbusto que viria a se transformar numa árvore frondosa que hoje cobre a nossa casa de sombra, da abrigo a bandos de rolinhas, a um casal de bem-te-vis e outras árvores peregrinas que enchem a nossa rua com a beleza dos seus cantos.

O jambo não é uma árvore nativa. Veio do oriente dizem uns que da Índia outros dizem da Malásia. Mas o que importa para nós é que Mundica o plantou para ele nos desse   sombra e nas suas floradas  estendesse o tapete rosa de suas flores na entrada da nossa casa. Dias atrás sentada no banco do jardim, desfrutando  da sua sombra e ouvindo o canto do bem-te-vi pousado em seus galhos, pensei: por que não colocar armadores e  numa rede me  deitar para ouvir a passarada e  deixar-me  cobrir de flores, folhas até mesmo dos frutos dessa árvore sagrada? “pode ser nada, mas faz bem”.

Não vou, portanto, me reportar aos cuidados, aos contratempos das flores secas que caem, das raízes que quebram o piso, da implicância de alguns vizinhos que se incomodam com a “sujeira” das folhas secas que sujam, por entender que isso é nada frente ao que meu vetusto jambeiro nos dá. Quero dizer somente que o jambeiro é uma árvore linda e  amiga principalmente das crianças às quais  oferece seus apetitosos frutos de um lindo e macio colorido grená.

Somos gratos a mãe natureza pela dádiva de uma única árvore que nos comprometemos a proteger e preservar e  por todos os  benefícios que ela nos traz, inclusive espiritual. Enquanto isso  assistimos estupefatos a destruição da floresta Amazônica cruelmente decepada e arrasada pelos motosserras, convertida em milhares de troncos para comercialização usurária, igualmente a vegetação do pantanal transformada em cinza, numa nação desgovernada por quem não tem o mínimo de sensibilidade, conhecimento e capacidade de gestão. Pelo contrário participa da destruição.

Mundica se no seu descanso por acaso olhares para o mundo, procura ver somente as árvores frondosas em cujos ramos as aves cantam hinos de esperança pela sobrevivência da mãe natureza nesta pátria desgovernada.

Faço uma pausa nas lembranças com a música a seguir.

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