O período do pós guerra depois da II guerra mundial, foi marcado por uma disputa acirrada, entre os países que compunham a Organização do Tratado do Atlântico Norte – OTAN, fundada em 04 de abril de 1949, integrada por países regidos por ideologia liberal, liderados pelos Estados Unidos – USA. Esse bloco tinha como contraponto os países socialistas integrantes do Pacto de Varsóvia, fundado em 14 de maio de 1955, uma aliança militar entre os países do Leste Europeu, regidos por ideologia socialista e liderados pela União das Republicas Socialistas Soviéticas – URSS, na época da chamada guerra fria, quando a hegemonia política mundial era disputada entre USA e URSS.
À exceção dos Estados Unidos que entrou na guerra quando ela já estava quase na metade, os países ocidentais, ao final do conflito, eram um amontoado de escombros como mostra a primeira fotografia, em decorrência das batalhas terrestres e dos bombardeios aéreos. Estavam com a economia devastada e isso assustou o Ocidente temendo um avanço territorial pró soviéticos,mais amplo e ousado por parte da URSS, além daqueles que foram feitos nos países que foram libertados do nazi fascismo pelo exército vermelho no que eles chamam de guerra pátria.
O socialismo que ainda hoje causa calafrios e pavor aos liberais, era uma ameaça que precisava ser enfrentada e contida a qualquer custo. Para tanto, os discípulos da ortodoxia da Escola de Chicago, chamados Chicagos Boys, foram chamados a entrar em cena, para construir uma saída à moda liberal.
Ora, a economia do pós guerra ainda era inspirada na teoria econômica de John Maynard Keynes, o qual nada tinha de socialista. Ele foi chamado a tirar os USA do caos econômico da grande depressão de 1929, que culminou com o crash da bolsa de Nova York. Keynes era um liberal convicto, contudo menos ortodoxo e muito mais inteligente e pragmático do que os seus pares.
O britânico não se fez de rogado, e adotou a velha receita por demais conhecida e sempre usada nas crises recorrentes da economia liberal. Chamou o estado que nas boas fases do capitalismo é a Gení da musica de Chico Buarque de Holanda, para assumir o protagonismo da economia.
Entendia Keynes que, uma vez resolvido o problema macroeconômico do estado burguês combalido economicamente, os benefícios seriam estendidos à população faminta e andrajosa que, ao obter emprego e dispondo de renda, seria transformada em mercado consumidor interno, para ativar a economia combalida.
Keynes foi questionado pelos fundamentalistas liberais, escandalizados com o grande volume de contratação de pessoal, em número além do necessário, mas saiu – se com a magistral frase: “Se eles não tiverem o que fazer, mandemos escavar um buraco pela manhã e enterrá-lo à tarde, contanto que tenham emprego e renda para virarem consumidores e ingressarem no mercado!”
A distribuição de renda pela via do emprego, seria a melhor saída para a crise, ,pois criaria internamente um mercado consumidor, já que as relações comerciais com os países europeus estavam impossibilitadas pelas circunstancias já que o mundo às portas da guerra precisaria acumular poupança para fazer frente ao conflito.
Era um esforço interno criativo que, a partir da demanda interna, ressuscitaria a economia fragilizada por mais uma das tropelias que a mão invisível do mercado levara ao leito de morte. O nome da série de programas econômicos era New Deal, aplicados com mais intensidade entre 1933 e 1937, que preconizava: o controle das instituições financeiras; a realização de obras de infraestrutura; a concessão de créditos agrícolas para recuperar a economia primária; incentivo à organização sindical, além da criação de mecanismos de proteção do trabalho; desvalorização do dólar para tornar as exportações mais competitivas; empréstimo aos bancos para evitar falências do sistema financeiro; criação do sistema de seguridade social, com seguro desemprego etc.
Será que se Franklin Delano Roosevelt que apoiou politicamente um programa desse naipe, estaria obcecado por equilíbrio das contas públicas, como todo guarda livros neoliberal? Será que os USA teriam saído da crise sem a ação de Keynes?
O resultado disso é que os fundamentalistas liberais assistindo “essa insanidade, esse mau exemplo,” acionaram suas legiões e foram buscar na escola austríaca de Friedrich August Von Hayek, o contraponto que inspirou Milton Friedman a levar adiante a “novidade” na vetusta Escola de Chicago, por gerações e gerações seguidas de acadêmicos.
Lá foi construído um imenso salão de beleza econômico, com os maquiadores representados pelos Chicagos Boys, os quais foram encarregados de mudar toda aparência liberal e anunciar ao mundo sob o toque de trombetas, o chamado Consenso de Washington.
Esse era um consenso entre eles que a rigor era o ovo da serpente neoliberal que procurava eclodir mostrando algo novo, (neo) que nada mais era do que o novo velho liberalismo de Adam Smith e David Ricardo, de fraque e cartola.
O velho novo modelo, necessário até o fim da crise, foi gradualmente desmamando o paradigma Keynesiano e para tanto cuidou da articulação paralela de um grupo ultraconservador, tendo como um dos participantes mais famosos, o polonês Karol Wojtyla, que não era outro senão o Papa João Paulo II.
De tanto conspirarem, conseguiram o desmonte de 71 anos de socialismo soviético, que arrastou consigo todo leste europeu. (veja artigo nosso de título Perestroika e Glasnost, publicado em 15/03/2021)
Estava pronto o cenário para a entrada em cena no “novo” modelo liberal, desculpem neoliberal como eles preferem, tendo sobre a ribalta dois personagens centrais: Ronald Reagan (1981 – 1989) pelos Estados Unidos e Margareth Thatcher (1979 – 1990) pela Inglaterra, usando como demonstração exitosa o laboratório Chileno do General Pinochet (1974 – 1990), exemplo malfadado de transformação econômica.
A América Latina embarcou por completo na nova miragem econômica, tendo como último passageiro o Brasil de Fernando Collor, um outsider de momento, sucedido pelo sociólogo Fernando Henrique Cardoso, aquele que mandou que esquecessem o que ele havia escrito até então.
Mutatis mutandis, o neoliberalismo virou pandemia e alastrou-se pelo mundo, sobrevivendo com todos percalços até agora, sem que o establishment o abandone. Diante da atual crise sanitária que é filha da crise econômica parece que a panaceia burguesa dá sinais de exaustão.
Os golpes de estado a manu militari, muito em voga nas décadas de 1960/1970, tornaram – se acintosos demais, escandalosos demais para terem uma reprise belicosa e precisavam ser, como de fato foram, substituídos por algo mais brando e discreto como os golpes parlamentares que viriam se espalhar rapidamente pelo mundo como um rastilho de pólvora, principalmente pela América Latina.
O jornal espanhol El Pais, na página de economia da edição em português do dia 18/04/2021, traz a seguinte manchete:
Joe Biden quer enterrar 40 anos de hegemonia neoliberal.
E acrescenta:
“O presidente dos Estados Unidos é mais ambicioso do que os líderes europeus na busca de soluções para reativar a economia com um programa de estímulos sem precedentes.”
Essa alternância de ritmos, ou arritmia, como queiram, é uma constante na economia ortodoxa, ditada pela magnitude das suas crises cíclicas e segundo o editor do jornal El País, Claudi Pérez, “num ritmo impossível de dançar: lento, mais lento, num pandemônio repentino que sempre chega, sempre acompanhados de atores ou bailarinos de direção oposta, alternando momentos de:
golpe-contragolpe, avanço-retrocesso, heresia-apostasia” e “é nesse vai e vem a gente se atrapalha” como diria o cantor baiano Morais Moreira, de saudosa memória.
Joe Biden assumiu num clima tumultuado pelos esperneios do saltimbanco Donald Trump, o qual havia vencido a primeira eleição para presidente dos Estados Unidos inaugurando uma modelagem eleitoral fraudulenta de nome Fake News, depois exportada para o mundo, inclusive para o Brasil que elegeu isso que está aí como proposta.
A convulsão que se prenuncia nos arraiais do neoliberalismo foi provocada por um senador democrata de quase 80 anos que em que pese ser “originário do paraíso fiscal de Delaware”, encarou uma eleição de vice presidente de Barak Obama.
Depois, contrariando todos os prognósticos dos institutos de pesquisa que por lá erram tanto quanto os nossos, enfrentou o falastrão Donald Trump nas urnas, impondo – lhe uma derrota histórica.
Mesmo depois de eleito enfrentou a reação de inconformismo de Trump que culminou com a invasão do Capitólio, sede do congresso estadunidense, dias antes da posse.
Nunca me iludi e sugiro que ninguém se iluda com as convicções de Joe Biden. Ele é, um conservador de direita (Trump é extrema direita) que seguirá sem nenhuma dúvida o receituário liberal conveniente aos Estados Unidos. A propósito escrevemos um artigo de título Joe Biden e as Eleições no Brasil, publicado em 12 de novembro de 2020, logo após as eleições presidenciais dos USA em que afirmávamos e agora reiteramos:
“Que ninguém espere de Joe Biden, gestos mais incisivos em termos de mudanças nos rumos da geopolítica, de modo a exigir dele, abrir mão das aspirações hegemônicas seculares que os Estados Unidos sempre nutriram”
Uma vez empossado e no curso do governo, ele tem acenado com propostas economicamente heréticas ao olhar dos intelectuais orgânicos do neoliberalismo endêmico e dos olhos curiosos dos especuladores de Wall Street.
Numa atitude Keynesiana e diante da pandemia da covid 19, liberou 2 trilhões de dólares, o equivalente a 11,2 trilhões de reais, ambos com T de touro para vacinar toda população no menor espaço de tempo e para recuperar a economia afetada pela crise sanitária, distribuindo cheques de US$1.400, equivalente a R$7.850,00.
Essa atitude corajosa, além de assombrar o olimpo capitalista e não somente Wall Street, se constitui num sacrilégio na ótica dos fundamentalistas liberais, além de caracterizar um péssimo exemplo.
Essa atitude do presidente da república dos USA, a catedral do capitalismo mundial, é emblemática menos pelo volume de recursos liberados e muito mais pela perspectiva de um indicio de reviravolta em mais uma transfiguração do capital ferido, em busca de sobrevivência.
Estaria ele apontando, eu não diria para o fim do capitalismo, mas para o esvaziamento da panaceia chamada neoliberalismo? Aguardemos!
Consulta: www.uol.com.br;
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