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Arara maracanã (Diopsittaca nobilis)

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 Neste último fim de semana, ao passear com meus cães no horário de sempre – por volta das 6:00 – me deparei com um som já muito comum aos meus ouvidos, mas que por algum motivo naquele dia, me fez refletir sobre tantas coisas.

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Era um casal de maracanãs (Diopsittaca nobilis) que estabelecera seu ninho no oco de uma palmeira morta no jardim de um antigo casarão que hoje é um ponto comercial. Aquela cena me fez retornar ao final dos anos 80 e início dos 90, quando ainda criança, ouvia esses animais ao entardecer, voando alto, sem tempo para pousar e permitir que os víssemos de perto.

Cresci em uma João Pessoa em transformação. Lembro da quantidade de lixo espalhado pelo centro da cidade, especialmente na Lagoa. O desequilíbrio ambiental ali era uma máxima. Nunca esqueço de assistir todos os dias – ao esperar pelo ônibus que me levaria para casa depois do colégio – os pardais se digladiando por pipocas, batatas-fritas, pedaços de salgados, e outros alimentos que eram jogados ao chão sem nenhuma preocupação. Coletores e lixeiras era coisa rara de se ver.

Cresci em uma João Pessoa que não dava sossego as suas aves. Era raro vermos algumas que hoje são comuns aos nossos jardins, como o sanhaçu-azul. Qualquer um que aparecia, já era motivo de abrirmos nossos alçapões. E estou falando de um pessoense nascido e criado em uma paisagem bem urbana. Meu conhecimento ornitológico era todo baseado nas enciclopédias do colégio, nos álbuns de figurinhas de chicletes e chocolates; colocado em prática na feira-do-passarinho – localizada no bairro de Oitizeiro – onde mensalmente ia comprar mais uma espécie para minha coleção particular.

Enquanto isso, continuavam as maracanãs sempre a vocalizar perto das 17:00… ao longe, nunca se aproximando. Parecia que sabiam não pertencer aquele mundo mais próximo ao chão.

Também cresci recebendo uma nova carga de conhecimento. A cada ano que se passava, era nos repassado novos conceitos: não se deve jogar lixo no chão, desmatar, caçar, apanhar animais. Livros paradidáticos sobre meio ambiente nos eram apresentados enquanto os adultos discutiam sobre o surgimento do IBAMA, Rio 92, e outras ações que mudavam a forma da humanidade ver a natureza no final do Século XX, se preparando para o próximo.

Por volta dos anos 2000, começa uma mudança silenciosa na capital paraibana. Aquelas nuvens de pardais de outrora, agora se resumem a bandos bem menores. Hoje em meu jardim, enquanto escrevo esse texto, sou visitado por sanhaçus-azuis e de coqueiro, bem-te-vis, guriatãs, sebitos, rouxinóis, bicos-de-lacre e uma outra de cor parda que lembra um tico-tico, mas não é. Isso sem contar com o casal de rolinhas-caldo-de-feijão que vive eternamente nidificando no meu jasmim-laranja.

Se prestarem atenção, João Pessoa foi tomada por diversas espécies de palmeiras nesses últimos anos. Acho que os paisagistas dos anos 2000 não se deram conta da contribuição que dariam aos psitacídeos residentes e aos cidadãos desta cidade. Se você prestar um pouquinho de atenção, é possível até encontrar jandaias-verdadeiras tagarelando em jardins dos edifícios que tomaram conta dos nossos bairros.

Chamamos de espécies sinantrópicas aquelas que conseguem se adaptar ao ambiente urbano e se utilizar desta paisagem como parte do seu nicho ecológico. Para aqueles que pensam de forma dicotômica, podem ver essa colonização das aves silvestres como algo ruim, pois as mesmas deveriam estar exclusivamente nas florestas.

Contudo, podemos ter uma visão mais ampla. A manutenção de jardins públicos e privados, recuperação de praças e criação de parques urbanos, tem permitido que a fauna silvestre colonize esses espaços, utilizando-os como corredores ecológicos entre os remanescentes de vegetação nativa existentes pela cidade. Aliado a conscientização da sociedade sobre a disposição dos resíduos sólidos, reduzimos consideravelmente a oferta de alimentos às espécies invasoras, como os pardais, diminuindo consequentemente suas populações, e permitindo uma maior biodiversidade ocupando a matriz urbana. 

“Com uma gestão ambiental forte ganhamos todos, inclusive as maracanãs, que agora se sentem seguras de voar próximo ao chão, encantando antigas e novas gerações de humanos, permitindo sonharmos com um mundo ainda mais sustentável.”

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3 COMENTÁRIOS

  1. Em 1979 fui morar em Campina Grande e quase sempre nos finais de semana passava em João Pessoa. Ficava na casa de uns amigos em Manaíra, o bairro estava em formação, as ruas de areias, muitas casas e muito verde. Na época, a capital paraíbana tinha o título da segunda cidade mais verde do mundo. Em 2008, voltei a João Pessoa e fiquei no apartamento do amigo e conterrâneo João Vicente na Praia do Bessa. A cidade continuava linda, mas cheia de novas construções, muitos prédios de aparatamentos e o que mais me entristeceu foi ver as árvores nativas sendo arrancadas e plantadas árvores ornamentais em seu lugar; o playgraud dos prédios com cerâmicas, exemplo claro da arquitetura pós-moderna que obedece um padrão sem arte, com pouco verde e nenhum contato humano. Somos ricos em informações e pobres em experiência humana.

  2. Bom dia Cristina. João Pessoa recebeu o título de segunda cidade mais verde do mundo, mas é importante entender que ela é uma cidade florestada, e não arborizada. A arborização urbana consegue integrar os remanescentes florestais existentes. Ainda temos muito a construir, mas percebo que estamos avançando, por exemplo, prefeituras país a fora possuem secretarias municipais de meio ambiente e setores de arborização, coisa que não existia anos atrás. Talvez não esteja a contento, mas sigamos em frente!

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