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Sistemas Agroflorestais, um caminho para a restauração ambiental

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(Foto: Facebook Sebastião Salgado)

Se me perguntassem 20 anos atrás o que eu pensaria de uma estratégia de recuperação de florestas onde houvesse um consórcio de espécies nativas, exóticas, além daquelas consideradas cultivares comerciais, e que nessa integração o ser humano poderia desenvolver atividades econômicas associadas a conservação desta cobertura vegetal… eu responderia dentro de uma perspectiva técnica e legal que NÃO SERIA POSSÍVEL. Seria um absurdo não estabelecermos um mínimo de vegetação nativa conservada, onde a natureza fosse conduzida sem a intervenção humana.

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Se me fizessem o mesmo questionamento há 10 anos, diria que seria uma ideia de pouca aplicabilidade, além do que não seria possível legalmente falando. Seria algo que não alcançaria grande êxito, e que existe uma necessidade enorme de acrescentarmos ambientes naturais intocáveis.

Bem, se alguém me parar nos dias de hoje para novamente saber minha opinião sobre o assunto, teria um posicionamento bem diferente daquele do início da minha carreira profissional. Nestes 20 anos que se passaram, o mundo da restauração florestal mudou muito, desde o termo do habitáculo onde se deposita a muda – antes chamado de cova (termo fúnebre) e agora de berço (termo natalício) – até o posicionamento conceitual do que significa uma área restaurada.

Estamos deixando cada vez mais de lado o antropocentrismo e seguindo para o geocentrismo. Neste primeiro, o homem é visto como deslocado da natureza. Até mesmo nossas ações de conservação ambiental, em sua maioria nos excluíam do processo. Veja, por exemplo, o conceito de algumas categorias de Unidades de Conservação, que impedem a visitação pública. Já no segundo, o ser humano se encontra inserido aos elementos bióticos e abióticos. 

É neste paradigma que surge uma nova forma de interagirmos com nosso planeta. Para alguns cientistas já vivemos em um novo período geológico: o antropoceno, onde as intervenções humanas já modificaram a Terra de tal maneira que nossas cidades e áreas agricultáveis são elementos que compõem o mosaico da paisagem natural. 

Desta maneira, é importante que vejamos a necessidade de rever o que consideramos ambientes restaurados. Estamos vivenciando o surgimento de sistemas agroflorestais nas propriedades rurais, sejam elas pequenas, médias ou grandes. Até mesmo ambientes urbanos subutilizados estão dando lugar a pequenas hortas e pomares.

Podemos indagar: Seria melhor uma área de vegetação consorciada, mas que recebe contínuo manejo, e assim, incorporação de insumos que favorecem seu desenvolvimento ou uma composta apenas de espécies nativas, mas que sofre com o baixo investimento para sua restauração?

É importante ressaltar que muitos dos ambientes degradados estão inseridos em imóveis rurais. Muitas vezes seus proprietários possuem pouco recurso financeiro para implantação de remanescentes de vegetação nativa, ou até mesmo pouca área para destinar exclusivamente para sua preservação.

Assim, os sistemas agroflorestais se tornam um caminho viável na busca pelo desenvolvimento sustentável e ampliação da cobertura vegetal. É importante ressaltar que não basta plantar árvores. Precisamos de ambientes estruturados, onde tenhamos espécies vegetais que compõem o sub-bosque, bosque e dossel. Dessa maneira, a fauna e flora silvestre consegue se utilizar desses espaços seja de forma residente ou como corredores ecológicos. A agricultura sintrópica já demonstra os caminhos para que isso seja alcançado. 

A dificuldade de se implantar sistemas agroflorestais no semiárido brasileiro também está sendo desconstruído por iniciativas realizadas pelo PROCASE/FIDA, EMPAER/PB, ICRAF, INSA, SERTA, EMBRAPA, entre outras. 

É preciso entender que não se estabelece uma restauração florestal com a lógica reducionista – poucas espécies e ausência de estratos, semelhante a uma plantação de eucalipto. Cada bioma tem suas peculiaridades, e essas características precisam ser “imitadas” nos sistemas agroflorestais. Agroflorestas na Caatinga vão bem com umbuzeiros, seriguelas, palma, erva-sal, pinha; mas não irão tão bem com espécies de exigência hídrica maior. E se teimarmos em manter esta última, fornecendo quantidades significativas de água, onde ficaria nossa coerência na busca de manter um sistema equilibrado?

Estamos mais evoluídos quanto a legislação, a Lei 12.651/2012 – o atual código florestal – vislumbra a possibilidade de Áreas de Preservação Permanente (APP) serem restauradas através de agroflorestas. Linhas de crédito rural que fomentam agricultura orgânica e regenerativa já existem e a cada ano aumenta o número de agricultores e agricultoras que os acessam. Poder produzir alimentos no mesmo lugar onde se preserva é um caminho sem volta.

Sei que parece um contrassenso o esforço faraônico em reflorestar ao tempo que todos os dias vemos no noticiário a perda de áreas enormes na Amazônia, Cerrado e Pantanal por queimadas ilegais causadas por pessoas inescrupulosas. Mas no esforço de contribuir com a natureza, prefiro me inspirar no que ocorre nas ilhas vulcânicas depois de uma grande erupção. A vida renasce nos locais mais inóspitos. Penso que estamos em um momento de reconexão, onde seremos mais integrados com nossos ambientes naturais.

Figura 2 – Intercâmbio entre brasileiros e mexicanos em uma agrofloresta no município de Remígio, produção e conservação convivendo conjuntamente. Fonte: PROCASE, 2020

Figura 3 – Área de Sistema Agroflorestal (SAF) implantada há 2 anos no semiárido paraibano. A esquerda vemos um remanescente de vegetação nativa cercado de área degradada. A direita: 2 anos depois, o SAF se confunde com a Caatinga, formando um corredor ecológico. Fonte: PROCASE, 2020.

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