Uma Vez Salles Sempre Salles

 

Por: João Vicente Machado

    Ao ler a noticia publicada no dia 24/04/2020, que circulou no site Direto da Ciência,(http://www.diretodaciencia.com/) dando conta do encaminhamento ao Presidente da República, da cópia de um decreto substitutivo, proposto pelo Ministro Ricardo Salles, sugerindo ao Presidente a alteração do Decreto nº 6.660, de 2008, que regulamentou a Lei n°11.428, de 2006, “excluindo do seu alcance áreas de estepe, savana, savana-estépica, vegetação nativa das ilhas costeiras e oceânicas e áreas de transição entre essas formações, além de outras, (campos salinos, áreas aluviais, e refúgios vegetacionais) como também de alguns tipos de formações vegetais costeiras, tais como: restingas e estuários.”.

Ao  ver os fatos narrados, lembrei que modificações desse tipo somente poderão ser feitas com a aprovação do Conselho Nacional de Meio Ambiente – CONAMA, do qual fiz parte, como representante da Paraíba quando era Superintendente da SUDEMA, na gestão Ricardo Coutinho. 

Temos observado que toda ação de Salles é planejada, calculada e tem sempre um objetivo. Talvez seja esse o motivo pelo qual ele se apressa tanto  em “passar a boiada” e tão logo assumiu o Ministério do Meio Ambiente, certamente já trazendo no bolso essa e outras propostas. Salles percebeu que a composição do CONAMA não seria favorável às suas ideias e tratou logo de alterá-la e reduzi-la a um mínimo de representatividade de organismos da sociedade civil.  

Promoveu a substituição de cientistas e estudiosos por servidores públicos federais, como forma de exercer o  controle  total das votações em plenário e por extensão, o domínio sobre toda gestão ambiental do país, colocando-a a mercê de interesses de: mineradores, madeireiros, agropecuaristas, sojicultores et caterva.

Depois de operar para promover a desregulamentação formal dos demais biomas como: a mata atlântica, o cerrado, a caatinga e a floresta amazônica, voltou-se para a menina dos olhos da especulação, com o aparente intuito de agraciar empreendimentos imobiliários ávidos por lucro, como a desregulamentação de Áreas de Preservação Permanente – APP  na faixa  litorânea, atropelando a Lei de Gerenciamento Costeiro e o próprio Código Florestal.

Antes de emitirmos a nossa opinião sobre mais esse crime ambiental, informamos que, sob veementes protestos e até ação judicial interposta, Salles aprovou de forma impositiva, na reunião do CONAMA, a extinção de duas resoluções que flexibilizam as Áreas de Proteção Permanentes. (APPs) 

Primeiramente precisamos conceituar alguns termos técnicos relativos à formações costeiras para um melhor entendimento do raciocínio.

Estepe: “em geografia física e botânica, estepe é uma formação vegetal de planície com poucas árvores, composta por herbáceas, similar às pradarias, embora este último tipo de planície que ocorre em climas mais úmidos – contenha gramíneas mais altas em relação à estepe”. 

Convém lembrar que, quando falamos em   estepes  pode haver a impressão de que elas só existem nas pradarias como as estepes russas, mas creiam, elas são também litorâneas.

Vegetação Estepe

Dunas: são montanhas de areia criadas a partir de processos eólicos, melhor dizendo, são montes de areia formados pelo vento.

 Dunas

     A fotografia acima nos mostra uma das mais famosas dunas do Brasil que é o Morro do Careca, na praia de Ponta Negra em Natal, capital do Rio Grande do Norte.

Restinga: “é um espaço geográfico formado sempre por depósitos arenosos paralelos à linha da costa, de forma geralmente alongada, produzida por processos de sedimentação, onde se encontram diferentes comunidades que recebem influência marinha.”

    Restinga da Marambaia – RJ


     Um clássico exemplo de Restinga, é a formação Marítimo/Fluvial que liga a Parahyba à cidade de Cabedelo.

Estuário: “é um ambiente aquático de transição entre um rio e o mar. Um estuário sofre a influência das marés e apresenta fortes gradientes ambientais, desde águas mais doces próximo da sua cabeceira, águas salobras, e águas marinhas próximo da sua desembocadura.

A fotografia abaixo mostra o belo estuário do Rio Paraíba do Norte e demonstra o porquê de chamar a restinga que ele integra de Marítimo/Fluvial e essa afirmativa  é comprovada visualmente na fotografia citada. na foto

 Estuário do Rio Paraíba


Feitas essas considerações que consideramos essenciais a um bom entendimento, podemos lançar o olhar sobre as fotografias e tirar algumas conclusões sobre a magnitude dessa insanidade oficial.

      A nossa Paraíba tem um dos litorais mais belos do Brasil e em se tratando de um estado pobre, de uma região pobre, tem no turismo uma das facetas do seu desenvolvimento  não podendo ser desprezada. 

   A acumulação de água de superfície numa região costeira é possível com médios e pequenos volumes acumulados em barragens de nível que além de não inundarem as margens, contribuem com a recarga permanente dos aquíferos.

Os aquíferos, como fonte de suprimento de água para consumo humano não podem ser levados à exaustão, sob pena de sofrerem desequilíbrio hidráulico provocando o avanço da cunha salina. Nesse caso os aquíferos seriam inutilizados definitivamente, anulando-os como fonte de abastecimento, acarretando o fim da opção turística que muitos consideram redentora da economia regional.

Se para o bioma costeiro esse fenômeno seria um desastre, para os investimentos imobiliários não teria  nenhum problema, pois concluído o empreendimento, eles vendem todos os ativos e vão  embora, deixando o problema para os moradores e para o governo do estado. 

É preciso que toda opção de água de superfície que é real, seja considerada e aproveitada e que a cobertura vegetal que protege o bioma, as nascentes e as matas ciliares, sejam preservadas, sem prejuízo de  uma ocupação sustentável.

É exatamente nisso que reside a contradição entre o zelo dos organismos ambientais amparados na ciência, frente à absurda decisão do Ministro Ricardo Salles. 

O currículo de Ricardo Salles revela a fotografia de um político tendencioso, de extrema direita, fundador de um grupo chamado Endireita Brasil e que pleiteou seguidamente, mandatos eletivos nunca conquistados, desde a escala de Vereador, passando por Deputado Estadual, até Deputado Federal.

Desiludido com a ingratidão das urnas, começou a perambular por cargos públicos, inicialmente como chefe de gabinete de Geraldo Alckmin, dai a Secretário de Meio Ambiente de São Paulo no mesmo governo, mesmo  à contragosto de lideranças do PSDB como Alberto Goldman.  O hoje Ministro com a sua prática  conseguiu  escandalizar os tucanos, um feito inédito. 

De alto da ponte por baixo  da qual corre o rio político, ficou à espreita do destino das canoas que passavam por baixo, para saltar de forma “mais segura” naquela mais beneficiada pela corrente, que no caso foi a adesão à canoa de João Dória Jr. abandonando e traindo Alckmin que era candidato.

Para resumir e encerrar essa história, transcreveremos a opinião de ninguém menos do que Bolsonaro ao nomeá-lo ministro. Disse ele:

“Quando vi entidades do setor (ambiental) criticando a indicação de Ricardo Salles, vi que acertamos na decisão.”(sic) Precisa dizer mais alguma coisa!


Consultas; https://noticias.uol.com.br/

https://g1.globo.com/

Fotografias :https://www.wikiwand.com/ 

https://portalcorreio.com.br/

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