A Orquestra mais popular do Mundo

 Por: Flávio Ramalho de Brito 

No início de 1935, os Estados Unidos viviam o apogeu da Era do Rádio. Nas noites dos sábados, a rádio N.B.C., de Nova York, transmitia “Let’s Dance”, um programa de alcance nacional, de três horas de duração, em que várias orquestras de dança se apresentavam, ao vivo, no auditório da emissora. Uma das orquestras, que era liderada por um jovem clarinetista de 26 anos chamado Benny Goodman, se destacava das demais pelo som contagiante que produzia. 

 Poucos meses depois, a banda de Benny Goodman saía em excursão. George T. Simon, na época crítico musical na revista Metronome, relatou, em um extenso livro sobre as orquestras do período (a edição brasileira tem quase mil páginas), o impacto que as apresentações de Goodman causavam:

“A temporada foi um sucesso fora do comum. A gurizada se reunia em volta do tablado e berrava por mais […] o swing tinha, realmente, chegado!”

          (Clique aqui) https://youtu.be/GwPvLMlGWPI

Iniciava-se a Era do Swing. Para o historiador marxista Eric Hobsbawm, que escreveu uma “História Social do Jazz”, “o produto característico da era do swing foram as big bands, fazendo concertos ou performances variadas, além de tocar em locais de dança: uma fórmula que perdurou”.

Por todos os Estados Unidos começaram a proliferar orquestras de dança na mesma linha da big band de Benny Goodman. Segundo George Simon, em concurso promovido pela revista Metronome, foram relacionadas quase trezentas orquestras “em cada um dos quatros anos, de 1937 a 1940”. Além de Benny Goodman, tornaram-se famosas as big bands dos irmãos Jimmy e Tommy Dorsey, Artie Shaw, Les Brown, Harry James, Count Basie, Woody Herman e muitas outras.

Apesar da guerra que fora deflagrada na Europa, as big bands continuaram fornecendo, sem qualquer contratempo, o seu swing para as danças dos jovens norte-americanos. 

Nos dois primeiros anos da guerra, os Estados Unidos não se envolveram diretamente no conflito, embora dele participassem, indiretamente, com o fornecimento de suprimentos e armamentos às nações aliadas.

Em dezembro 1941, tudo mudou. Os japoneses atacaram a base norte-americana de Pearl Harbor, localizada no Havaí, e os Estados Unidos tiveram que entrar, efetivamente, nos combates. A convocação para as forças armadas alcançava trabalhadores de todos os tipos de atividades e as orquestras foram, também, afetadas. 

Muitos voluntários se apresentavam para servir nas forças do país. Um dos primeiros a se alistar era um homem franzino, que já passara da idade para convocação, tinha 38 anos, era míope, músico de profissão e nem havia feito o serviço militar. Fora recusado pela Marinha, mas conseguiu ser aceito pelo Exército, muito mais por uma especialíssima particularidade que ele possuía. Na ocasião, ele era o mais popular chefe de orquestra, não só nos Estados Unidos, mas em todo o mundo.

O maestro que se apresentara como voluntário chamava-se Alton Glenn Miller, e o som da sua big band era inconfundível e reconhecido em todos os lugares, através de músicas como “In the Mood”, “At Last”, “String of Pearls”, “Moonlight Serenade” e várias outras. A posição em que Glenn Miller conseguira chegar não fora tarefa fácil naquela Era do Swing em que inúmeras orquestras, muitas de altíssima qualidade, disputavam o mercado de discos, shows, bailes e apresentações no rádio. 

               (Clique aqui)https://youtu.be/6vOUYry_5Nw

                                            https://youtu.be/rjq1aTLjrOE

                                                                              https://youtu.be/3ueA3BguK9Y

 Os sons das big bands, dentre as quais se destacava a orquestra de Glenn Miller, não ficavam circunscritos ao território norte-americano. Alcançavam todo o mundo, através dos discos e, principalmente, pelas ondas curtas das transmissões radiofônicas que eram recebidas, por exemplo, no longínquo Nordeste do Brasil. Era, durante o período noturno, que o “som de Glenn Miller” transmitido pelo rádio, chegava à Paraíba, conforme depoimento do maestro Severino Araújo, então jovem chefe da orquestra da Rádio Tabajara da capital paraibana que, na época, se chamava “Jazz Tabajara”. Um dos maiores sucessos do repertório da futura Orquestra Tabajara, indispensável em todas as suas apresentações na sua longeva vida, seria o swing “In the Mood”, que a Tabajara executava com um arranjo praticamente igual àquele com o qual a música fora gravada pela big band de Glenn Miller.  



Glenn Miller ingressou no Exército já no posto de capitão. A sua primeira missão foi organizar bandas militares sediadas em vários centros de treinamento nos Estados Unidos. Em seguida, formou uma grande orquestra da Força Expedicionária, com quase 50 componentes, e partiu para a Europa para realizar apresentações para as tropas e fazer transmissões, na rádio BBC de Londres, dirigidas às forças aliadas. 
Os críticos musicais consideram que a Army Air Force Band, a orquestra militar dirigida por Glenn Miller, superava aquela big band que o maestro formara antes da guerra, porque ele tivera a possibilidade de recrutar para o grupo todos os grandes músicos profissionais do país que estavam servindo nas forças armadas. Além do mais, Glenn Miller inovara na sua orquestra militar, acrescentando à formação convencional das big bands, que tinham em média 16 componentes, uma seção de cordas, com violas, violinos e violoncelos, como se fosse uma sinfônica. 
    

            (Clique aqui)https://youtu.be/bvJOLQSXENA

   Em dezembro de 1944, a guerra na Europa já estava praticamente decidida em favor dos aliados. Fazia três meses que Paris havia sido libertada, após quatro anos sob o domínio alemão. O Alto Comando militar decidiu, na ocasião, que a Army Air Force Band, sob a batuta do agora major Glenn Miller, se deslocaria de Londres para Paris, para fazer uma série de shows, no Natal e nas festividades de final de ano, para os soldados norte-americanos que se encontravam na cidade.

                

    Foi programada a viagem da orquestra para o dia 18 de dezembro, Glenn Miller resolveu ir três dias antes, aceitando um convite de um coronel para acompanhá-lo em um voo que ia de Londres para Paris. Os voos militares que faziam a ponte aérea entre Londres e a França haviam ficado suspensos por cinco dias, devido às péssimas condições atmosféricas. Com a melhoria no tempo, Glenn Miller, o coronel e o piloto da aeronave decolaram de um aeroporto militar próximo a Londres, no início da tarde do dia 15, em um pequeno avião monomotor. Não foram registradas comunicações de rádio da aeronave durante o voo. Nunca mais se soube do avião e nem dos seus tripulantes. 

   O parecer oficial sobre o episódio, de que teria havido imprudência na realização do voo, em virtude das condições do tempo, não se sustenta nos fatos. O monomotor decolou, com a devida autorização, de um aeroporto militar, de onde, no mesmo dia, partiram várias outras aeronaves. As inconsistências sobre o acontecimento vêm levando, desde então, ao surgimento de várias versões, estapafúrdias ou plausíveis, sobre o que teria ocorrido.

  O que se sabe é que, durante esses quase setenta anos que se passaram, foram localizados, encontrados ou resgatados, tanto na terra como no mar, vários destroços de aeronaves na rota do voo que levava Glenn Miller para Paris, mas, nenhum deles com indícios que poderiam relacioná-los com o monomotor que transportava o maestro. O sumiço dessa aeronave continua sendo um dos maiores mistérios da aviação mundial.

     O desaparecimento de Glenn Miller parece ter sido premonitório do que, em pouco tempo, ocorreria na música dos Estados Unidos. Com o fim da guerra, se constatava que o gosto popular mudara durante os anos do conflito. As orquestras e seus líderes deram os seus lugares nas preferências dos jovens para os vocalistas, como então eram chamados os cantores e cantoras. No final de 1946, conforme a narrativa abalizada de George Simon, “em apenas algumas semanas, oito das principais orquestras da nação se desfizeram – Benny Goodman, Woody Herman, Harry James, Tommy Dorsey, Les Brown, Jack Teagarden, Benny Carter e Ina Ray Hutton”. 

Iniciava-se a era dos grandes intérpretes vocais, muitos deles formados pelas próprias orquestras. Frank Sinatra, ex-crooner da orquestra de Tommy Dorsey, Peggy Lee, da big band de Benny Goodman, Doris Day, de Les Brown e Ella Fitzgerald, de Chick Webb. A Era do Swing chegava ao fim. 


    Embora tivesse tido uma existência de apenas oito anos (incluindo os dois anos da banda militar), nada representa mais a música da Era do Swing, das big bands e do período da Segunda Guerra Mundial, do que a orquestra comandada pela batuta e o trombone de Glenn Miller.

    Um depoimento de George T. Simon, respeitado conhecedor do ambiente musical da época, ele próprio contemporâneo da Era do Swing, ressalta a importância da orquestra de Glenn Miller:

“De todas as mais populares e magníficas orquestras de dança que já existiram, a que evoca mais memórias de como tudo foi tão romântico e cuja música o povo deseja ouvir cada vez mais, incessantemente, é a orquestra do falecido Glenn Miller”. 












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