Neoliberalismo empreende?

Por: João Vicente Machado
     Antes da crise sanitária provocada pela pandemia que vivemos, a crise econômica já se delineava ameaçadora e oito entre cada dez economistas, orgânicos do estabilisment,  de maneira ensaiada e orquestrada, cantavam em verso e prosa as benesses do velho e surrado liberalismo econômico, uma criação dos filósofos  Adam Smith e David Ricardo.

    Propõem um modelo econômico que de forma endêmica tem nos perseguido desde o século XVIII com recrudescimento no período final da guerra fria.  

     É um modelo velho e fracassado que para ser ressuscitado foi necessário procurar um  alfaiate para desenhar um novo figurino que o transfigurasse  tornando-o irreconhecível e  palatável ao novo momento histórico. 

    A famosa escola de Chicago nos Estados Unidos produziu a revisão do liberalismo por iniciativa dos economistas George Stigler e Milton Friedman rejeitando o Keynesianismo que tirara os Estados Unidos da grande crise de 1929. Anunciaram o fim da história e sugeriram um laissez faire absoluto, com nenhuma ou quase nenhuma presença do estado.

    Conseguiram notoriedade no mundo capitalista, ganharam o prêmio Nobel de economia na década de 1950 e formaram muitos discípulos espalhados pelo mundo, principalmente na América Latina.

  Era o Chicago Boys que fez do Chile o seu laboratório durante a ditadura Pinochet e inspirou organismos internacionais como o Banco Interamericano de Reconstrução e Desenvolvimento – BIRD, também chamado Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional – FMI.

    Entre os anos de 1980/90 conseguiram o apoio e o aval de Ronald Reagan e Margareth Thatcher fortalecendo e internacionalizando o seu ideário, estendendo-o inclusive para a América Latina como já dissemos anteriormente, iniciando pelo laboratório Chileno cantado em verso e prosa. O resultado nós assistimos recentemente com o fracasso e a explosão popular de protestos  naquele país andino,  quarenta e sete anos depois.

    O Brasil vem  flertando com o modelo proposto há algum tempo, mas ingressou nessa aventura de maneira mais agressiva no governo tucano de Fernando Henrique Cardoso, época em que ocorreu a Privataria Tucana muito bem descrita no livro de autoria de Amaury Ribeiro Jr. 

    Nessa época teve início a venda de ativos para alimentar o famigerado superávit primário que nutre o apetite insaciável do sistema financeiro.

   Com o golpe parlamentar de agosto de 2016, ou seja, já com três anos e nove meses de pesadelo, assumiu o governo o vice-presidente Michel Temer, um gestor medíocre e ilegítimo,  sequenciado pela aventura insana que foi a eleição de Bolsonaro, que está nos impondo  à condição de uma republiqueta de bananas, com propósitos declarados de uma política de lesa pátria.

    À medida que o emprego foi encolhendo foi surgindo com frequência o anuncio e o estímulo ao empreendedorismo como forma de sobrevivência e o incentivo oficial para “montagem do próprio negócio”.

    O SEBRAE foi o laboratório da ideia e passou a formar e apoiar empreendedores, em atividades diversas, o que a rigor era e é a oficialização da economia informal.

    De repente nos deparamos com 23 milhões de desempregados que somados aos 32 milhões de trabalhadores informais totalizam 55 milhões de trabalhadores em idade laboral, sem a proteção da legislação trabalhista que lhes assegure um futuro que lhes garanta uma sobrevivência digna para si e para a família.

     É elementar que esse extrato social não é um mercado consumidor, por motivos óbvios, ou seja, consome quem tem poupança e essa massa trabalhadora mal tem como sobreviver. 

    É bem possível que alguns tenham obtido êxito efêmero que os animou, mas  que feneceu com o agravamento da crise, onde o Covid19 foi apenas o pano de fundo para entreter a plateia.

    As declarações recentes do ministro da economia, da educação e do meio ambiente para não citar a arraia miúda do governo são assustadoras. 

    O ministro do meio ambiente declarou que era preciso “aproveitar a oportunidade da pandemia para ir passando a boiada da Amazônia”, entronizando o célebre boi de piranhas, para a devastação intensa da Amazônia, nos causando seriíssimos danos ambientais.




    Por sua vez, afilhado de Olavo de Carvalho que está ministro da educação, numa exibição de servilismo e  subserviência e  com o propósito de  agradar o chefe declarou: “… eu. Por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia, começando pelo STF…” 

    O ministro da ecUnomia Paulo Guedes, preposto dos grupos econômicos e empoderado por eles, disparou dois torpedos que atingem de morte a força de  trabalho, real geradora de riquezas. Um deles, por ironia do destino contra os pequenos empresários, nicho que  aloja os empreendedores que foram estimulados a “ter o próprio negócio”.

  O segundo petardo foi atirado sobre os trabalhadores assalariados. Diz ele no seu maquiavelismo:
“.. Nós vamos ganhar dinheiro usando recursos públicos para salvar grandes companhias. Agora, nós vamos perder dinheiro salvando empresas pequenininhas…” 

    Já sobre os assalariados ele afirma de viva voz:
“.. e é nessa confusão toda, todo mundo ta achando que estão distraído, abraçar a gente,  rolar com a gente, nós já botamos a granada no bolso do inimigo. Dois anos sem aumento de salário..” 

  Existem outras falas de figuras do baixo clero do governo, de somenos importância, que devem ser remetidas ao anedotário popular, ou colocadas na fronde das goiabeiras. 

    Essas declarações do ministro da economia revelam a face mais cruel do neoliberalismo ortodoxo posto em prática por esse desgoverno, além de revelar a total falta de projeto de desenvolvimento do governo como um todo para enfrentar a crise que é real. 

    Projetos eles têm sim, mas direcionados aos conglomerados econômicos e financeiros e jamais para a nação brasileira.

    Ainda há uma parte da imprensa oficial, das milícias virtuais e das seitas pentecostais fundamentalistas que fazem a apologia ao “Governo” Bolsonaro, lhe serve de arautos e pajens e seguem cegamente as  suas pantomimas, todavia, é visível o desencanto da maioria da população estarrecida com o que vem assistindo.

    Temos visto a cada semana a deserção daqueles que o defendiam e deificavam suas ações, demonstrando perplexidade com os fatos e justificando o erro de ter contribuído para esse estado de coisas, com a desculpa de que não sabiam.

    “Ta legal, eu aceito o argumento, mas não maltrate o samba tanto assim.” 

    Bolsonaro é o que sempre foi, um militar “convidado a sair do exército”; um péssimo deputado; um defensor da tortura e de torturadores;  adepto da violência e da quebra da institucionalidade, representada pelo dito estado de direito.

    Encerro o texto sem saber ainda qual foi a trapalhada do dia, “mas que las hay  las hay.”

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