Por: João Vicente Machado
Gilvan Chaves era um pernambucano versátil e além de bom compositor, era um grande humorista. Como compositor, entre outras pérolas, compôs com Alcyr Pires Vermelho a belíssima Prece ao Vento:
“Vento que balança as palhas do coqueiro,
Vento que encrespa as águas do mar,
Vento que assanha o cabelo da morena, Me traz notícias de lá”…
Lembro aos mais entrados na idade e informo aos jovens que o rádio de antigamente era a matriz do humorismo, já que não havia televisão, e Gilvan Chaves era mestre nesse tipo de humor.
Teve várias peças humorísticas faladas, entre elas O Homem da Granja, que ele narrava com o sotaque puxado do pernambucano: bissqui, bisscoito, vamoss, lasscado etc.
Ele contava a história de um perigoso pistoleiro chamado Fininho e dizia mais ou menos assim:
“Fininho era um pistoleiro malvado, mais ruim do que carne de cobra. Empreitada contratada com ele não tinha mais retorno e não adiantava pedir, rogar ou até mesmo submeter-se a deixar que ele ficasse com todo o dinheiro do contrato e a arma, em troca da desistência.
Dizia ele obedecer a um código de ética do mundo do crime, que não permitia que não permitia desistência, pois ao receber a ferra (adiantamento), já adquiria um ódio profundo pela vítima é só sossegava ao vê-la morta.
Certa vez o coronel mandou o vaqueiro chamar Fininho que atendeu prontamente e ao chegar ouviu do coronel:
“– Fininho, tenho um serviço para você fazer!
– Pois não coronel, de que se trata?
– Trata-se de homem perigoso para você tirar do pasto.
– Eu conheço ele coronel?
– Não, não conhece, mas eu vou lhe dar o retrato dele!
E entregou fotos de frente, do lado direito, do lado esquerdo, de costas e de cima, num total de 5 fotos.
Fininho recebeu as fotos,a ferra e a pistola, e se foi a procura da vítima na certeza de liquidar a fatura em no máximo uma semana.
Passaram-se 7 dias, 10 dias, 15 dias e nada de Fininho, o que fez o coronel pensar consigo mesmo: Fininho falhou!
Após 25 dias aparece Fininho chorando e o coronel pergunta:
– O que houve Fininho ?
Ele de cabeça baixa, enxuga as lágrimas e com a voz entrecortada estira as mãos e entrega de volta o dinheiro junto com a pistola ao coronel dizendo:
– Coronel, eu sou um homem fracassado e vou deixar a profissão.
– Por que Fininho? Pergunta curioso o coronel.
Responde ele:
– Dos 5 homens que o senhor me encomendou eu só encontrei 4!
Nada mais disse e nem lhe foi perguntado!
Mutatis mutandis , aqui na paróquia tem uns pistoleiros da caneta ou cuspidores de microfone, a quem o establishment encomenda a morte de um, apenas um, e eles atiram para matar 5 ou mais!
A narrativa bem humorada de João nos remete a um tempo onde o reflexo da violência se manifesta no interior nordestino, e, analisa os sentimentos contraditórios daqueles que se chama matadores de aluguel ou pistoleiros. Foram tempos difíceis, violentos e cheios de histórias que ficaram na nossa memória.
O valentão urbano ou rural surgiu nos primeiros dias de colonização brasileira, ao longo dos tempos e no desenrolar da história foi recebendo novas funções que lhe redeu novos títulos. Nas fazendas de gado e de cana de açúcar do Nordeste era conhecido por cabra de bagaceira, homem forte que lidava no engenho, na lavoura e no manejo das armas para defender a terra e o dono; com o ingresso do coronel (dono da terra) na política, surge o jagunço, homem valente e corajoso, “armado até os dentes” trabalha como um cão de guarda, na defesa de quem o contratou, precisando de uns servicinhos extras, de forma que não comprometesse seu guarda costa, o coronel passou a contratar os matadores de aluguel que realizavam seus serviços, sem deixar rastos. O pistoleiro como ficou conhecido era sempre cruel, frio e implacável.
João com maestria traz a tona uma época de mandonismo, violência e vingança, manifestações do Nordeste no tempo dos coronéis.
A capacidade e o conhecimento histórico de Cristina Couto enriquece e engrandece o nosso blog.
A sabedoria de um narrador de história é sem dúvida nenhuma uma das maiores virtudes desse BLOGUEIRO que agora de posse desta ferramenta (O blog) vem se aperfeiçoando cada dia mais ilustrando com seus conhecimentos os momentos de outrora vividos.