Por: Neves Couras;
O título o qual escolhi para esse Artigo não é redundante, acredite. Fui inspirada por uma palestra de Hannah Arendt, na verdade foram algumas anotações feitas por ela para realização de uma palestra e encontradas após sua morte.
Evidente que ela trata dessa temática com um olhar voltado para revoluções, guerras e conflitos. Mas lendo seu livro que tem o mesmo título, tive a intuição de ver esse tema voltado não só para conflitos entre territórios e nações, mas sobretudo sobre o sentimento humano.
Você já imaginou o que significa ter ou não “liberdade”?
Precisamos pensar na liberdade com muita responsabilidade. Usar a liberdade na sua totalidade pode nos causar consequências funestas. A minha liberdade não pode ser utilizada para machucar, criticar, diminuir ou mesmo agredir ninguém.
Cada um desses verbos têm uma série de consequências se usados sem terem seus efeitos ponderados. Nossa liberdade é uma das coisas mais preciosas dessa vida. Diz Hanna Arendt:
Apenas aqueles que conhecem a liberdade em relação à necessidade podem apreciar por completo o significado da liberdade em relação ao medo e só aqueles que estão livres de ambas – necessidade e medo – têm condições de conceber uma paixão pela liberdade pública (Arentd, 1985, abertura).
Vejamos, duas questões que são colocadas nesta citação, que acho de extrema importância: “medo e necessidade”. Até que ponto, somos livres para falar e agir se carregamos o medo de tudo. Neste tudo, incluo a necessidade dos seus direitos mais elementares. A necessidade do alimento, da casa, da escola, do trabalho que nos dá dignidade e quando essas necessidades são condicionadas a algum tipo de imposição?
Se existe medo, não temos liberdade, assim sendo, ela é, no máximo, aparente. Um faz de conta. Uma historinha para criança dormir.
A possibilidade de se conhecer a verdadeira história de um povo, ou a de um cidadão que pleiteia exercer uma função pública, consequentemente o elegermos para nos representar, sabendo exatamente que prerrogativas ele tem para exercer aquele cargo e conhecendo sua índole, podemos o fazer nosso representante, isso é liberdade. Liberdade livre de medo.
Mas se você vende sua liberdade, você passa a viver com medo. Medo…. vocês já pararam para pensar como estamos vivendo com medo? Medo de sair às ruas, medo de falar e sermos mal interpretados. Medo de perder vida em qualquer esquina.
E, cadê nossa liberdade? Já pensou como ela está sendo manipulada? A partir de nossos lares, nossa família… Faço essas indagações porque, sem saber, vivi no centro de uma Ditadura, sem saber o que estava acontecendo. E como pode ser isso, alguém pode me perguntar. É como viver dentro de sua casa sabendo que alguma coisa não está bem clara, mas pela sua imaturidade, nada é dito nem explicado.
É claro que não era publicado em nenhum jornal o que realmente estava acontecendo. Por outro lado, eu cheguei a Brasília saindo de uma cidade do interior onde também não se falava de Ditadura. E eu nunca havia ouvido falar de Militares nas ruas.
Sabíamos que não podíamos sair às ruas sem documentos, em qualquer lugar ou hora, erámos rodeados por carros e soldados altamente armados e ali mesmo erámos revistados. Mas como não estávamos fazendo “nada errado”, iam embora e acreditávamos que tudo aquilo fazia parte da segurança da Capital Federal.
Meu Deus! Quando cheguei a João Pessoa, que voltei à Escola, fui tomando conhecimento de onde estávamos e porque sentíamos tanto medo de sair à rua, mas sem uma razão justa. Apenas tínhamos medo. Quanta liberdade quando tudo aquilo acabou!
Hoje, após muitos anos, estou vivendo outro tipo de liberdade, mas ainda não sei o que fazer com ela. O medo que, lá atrás, eu enfrentava, hoje ainda me acompanha. Ainda sou responsável por meus filhos, sou responsável por resolver um monte de situações não resolvidas que me foram deixadas por falta de organização, de amor, ou mesmo por incompetência mesmo.
Hannah Arendt fala do amor à liberdade pública, aquela das grandes coisas, do futuro do país, do planeta, da humanidade… E sabiamente afirma que só consegue sentir a força dessa liberdade aquele que não mais teme a necessidade ou o medo. Percebi que não vivia mais em uma ditadura, quando saí da Capital Federal. Percebi que vivia em uma prisão apenas quando me deram as chaves para sair dela.
Ainda temo a necessidade e o medo, mas, ainda assim, almejo a liberdade que pode ser tão assustadora, mas é tão essencial à vida quanto o ar aos pulmões. Ainda que poluída ou escassa, a liberdade, assim como o ar, é, ou deveria ser, algo que buscamos enquanto temos forças.