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Resignação

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Por:Antonio Henrique Couras;

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Como moro em uma área bastante turística, é bem comum que eu me depare com uma incontável gama de restaurantes que anunciam seus pratos em placas e cartazes. Incontáveis são os restaurantes (um tanto quanto insalubres pro meu gosto que aprecia toalhas brancas e ar condicionado) que anunciam seus pratos e preços em grandes placas pela estrada ou perto de seus estabelecimentos. A grande maioria se especializa em pratos feitos com frutos do mar, sendo a peixada onipresente. Ainda assim, aqui e acolá encontramos placas anunciando galinha de capoeira e outras iguarias.

Vi um restaurante muito simpático perto da entrada de uma praia que anunciava seus pratos em tábuas coloridas pregadas em um poste. Terreiro bem varrido, panelas de barro bem limpas com suas tampas e conchas em fogareiros acesos esperando os fregueses para um almoço a 25 reais.

Acredito que quem se aventure a entrar num estabelecimento como esse irá se deparar com pratos de camarão, peixe, pirão, arroz soltinho, farofa, e bebida gelada… Contudo, se o freguês, ao se sentar, pedir um churrasco ou para ver a carta de vinhos irá se decepcionar.

Não é, de forma alguma, culpa do restaurante. O proprietário sabe que a grande maioria, se não a totalidade, da sua freguesia se compõe de turistas indo ou vindo das praias da região. Muitos molhados, besuntados de óleo de bronzear e empanados de areia sentiriam que seu estabelecimento arremataria um dia prazeroso de veraneio.

A metros de distância qualquer um era capaz de saber o que o estabelecimento serve, seus preços e o ambiente de que dispõe. Seria ingenuidade, se não falta de capacidade de ler minimamente as pistas dadas, imaginar-se outra coisa.

O proprietário, por outro lado, teria pesadelos ao tentar limpar um ambiente que, frequentado por tal clientela, fosse coberto de tapetes, finos estofados e um ar condicionado que congelaria os clientes pouco cobertos.

Sempre me pego lembrando-me de uma das máximas do budismo que diz que o nosso sofrimento na Terra advém da nossa mania de procurarmos uma vida de prazeres. Que casa bem com outro ensinamento do cristianismo que diz que o reino de Deus não é desse mundo. O primeiro, talvez mais resignado, já que não promete nada depois da morte, diz que devemos nos resignar com a vida que levamos e aprendermos a vermos a beleza e a bondade na vida cotidiana, em entendermos o fluxo do universo ao invés de lutarmos contra ele.

Já o segundo, prometendo a vida eterna após a morte, nos diz que nossos sofrimentos e boas ações são uma forma de irmos arrecadando créditos para a próxima vida. Nos dois casos, o Cristo ou o Buda, não prometem a felicidade instantânea, pelo contrário, afirmam que devemos nos acostumar com nossos sofrimentos e aprendermos com eles.

A resignação nos diz que devemos aprender com as situações com que nos deparamos cotidianamente. Fazermos o que somos capazes não nos preocuparmos com o que não temos controle. É aproveitar o sol para estendermos as roupas no varal e a chuva para molhar as plantas. Não ficarmos brigando com o mundo porque choveu depois de estendermos a roupa no varal e tudo ficou com cheiro de cachorro molhado.

 

Minha mãe costuma dizer que a vida é uma escola e que iremos repetir a lição até aprendermos. Se eu não aprendi ainda que inventar de lavar roupa quando o tempo estiver nublado terá grandes chances de fazer com que a casa fique com cheiro de cachorro molhado no fim do dia, sofrerei até aprender. Seja olhando a previsão do tempo ou comprando uma secadora.

O sentimento de resignação é um sentimento salutar. Como a água de um rio que vai contornando os obstáculos que encontra no seu caminho até desaguar no mar. Apesar da resignação parecer um sentimento de inação ante à vida, muito pelo contrário, ela nos ensina a como agir ante à vida.

 

Eu sempre amei flores, desde que me entendo por gente, e por muitas vezes tentei cultivar as mais diferentes espécies e muitas vezes me frustrei. Muitas vezes comprei aqueles grandes vasos de crisântemos e me frustrei depois que morriam achando que era culpa minha por não saber cultivá-los, mas na verdade são uma espécie anual, ou seja, têm um curto ciclo de vida que se encerra depois da sua floração.

Ainda tento cultivar as europeias rosas que, aparentemente, são o alimento favorito das formigas do jardim. Quando menos espero a pobre roseira está pelada se não morta.

Dizem que as formigas, nativas de um ecossistema, funcionam como o sistema imunológico desse organismo, e quando se deparam com um ser desconhecido o devoram sem dó nem piedade, enquanto vivem em perfeita simbiose com as espécies nativas.

Também tentei cultivar flores de maio, na esperança de que cultivar uma espécie nativa da mata atlântica fosse facilitar a minha vida, contudo, para a floração essas plantas precisam de uma significativa mudança nas horas de luz solar. Florescem quando a luz do dia começa a diminuir, coisa comum nas florestas do Sudeste, mas quase imperceptível no Nordeste.

Por fim, me aventurei a cultivar orquídeas, essas têm sido uma grata surpresa. Historicamente tidas como complicadas e difíceis de cultivar, têm se mostrado as mais resistentes flores do meu jardim. Muito felizes com o calor e a humidade da nossa região, pedem apenas água e luz filtrada. Uma adubação de vez em quando também não faz mal a ninguém. As minhas, bem humildes compradas em supermercados, florescem várias vezes por ano e ainda me enchem de mudas. Algumas que eu jurava estarem mortas, me surpreendem ao ressurgirem com novas folhas e grandes e longevas flores.

A resignação não é sobre aceitar que não sei cultivar flores e nunca as terei em meu jardim, mas sobre aprender quem nem todas as flores irão gostar do meu jardim, que as vezes elas até ficaram bem aqui, mas cumpriram a sua missão e partiram, outras não têm o que é preciso para sobreviver aqui. A resignação não é não desistir de do sonho das flores, mas quais as flores colocar em meu jardim.

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