Por: Karen Emília Formiga;
Esse é mais um assunto do nincho maternidade, com vasta gama de comentários e explorados à exaustão com regras inalcançáveis que – quase nenhuma mãe – conseguirá seguir, conforme os ditames da internet.
E essas linhas, que ora ganham espaço para existirem, são mais um texto convidativo a não criticar nem o uso de telas e nem a ausência delas, mas que se propõe a inserir um assunto tão preocupante dentro de demandas reais, de quem vive a maternidade integral.
Vamos lá, então. Numa análise dentro da vivência de uma maternidade que é comum a maioria das mães, desejo que essa leitura acalme os corações, por vezes, angustiados de quem se culpa pelo uso de algum dispositivo eletrônico, mas que não consegue ficar sem esse que, provavelmente, funciona como uma rede de apoio na sua casa.
É certo que, rolando o feed, você já leu sobre os deletérios e malefícios do uso da tela em crianças (e leu sobre fazendo uso de que? De uma tela, possivelmente).
“Estudos em Harvard mostram que o uso de telas atrasa fala, retarda desenvolvimento cognitivo, propicia delongas na progressão da amplitude motora de uma criança.
São estudos legítimos, com coerência, dados verídicos e consistência. A grande problemática sobre o uso de telas reside na necessidade que a grande maioria das mães – apresentam no dia a dia – de precisar delas para dar conta de outras demandas que a maternidade impõe. Por exemplo: o uso das telas é necessário para que uma mãe consiga fazer um almoço ou lavar uma roupa.
Os resultados dos estudos, ainda que fundados em cômputos congruentes, coloca-nos numa velha disputa já conhecida: a teoria se afasta da realidade.
Mais que a distância que os estudos precisariam percorrer para comportarem as rotinas reais, a impossibilidade de vivência num mundo totalmente sem telas e dispositivos eletrônicos é anacrônica: não tem como falar de uma vida sem telas fazendo uso delas, mesmo que você seja um adulto já devidamente formado, o excesso de telas também trará deficiências e deformidades em suas funções cognitivas, resguardada, é certo, as devidas proporções que o estrago faz numa criança em formação e num adulto já formado.
A grande chave entendermos esse assunto que preocupa tantas mães e pais, e que ainda assim não consegue ficar de todo ausente no dia a dia, repousa numa palavra que tem efeitos muito mais proveitosos, em se tratando de formar e educar um indivíduo: ponderação.
A não existência total de telas e dispositivos não é coerente nem mesmo nas famílias que publicam o não uso delas, usando uma tela para dizer que não usam telas (?).
Ainda que seu filho não esteja preso àquele aparelho e ele seja para uso laboral, como para quem trabalha com internet, é pouco provável que você consiga dar a devida atenção à criança estando numa tela.
A grande chave para entendermos esse assunto que preocupa tantas mães e pais, e que ainda assim não consegue ficar ausente, por completo, no dia a dia, repousa numa palavra que tem efeitos muito mais proveitosos, em se tratando de formar e educar um indivíduo: ponderação.
A não existência total de telas e dispositivos não é coerente nem mesmo nas famílias que publicam o não uso delas, usando uma tela para dizer que não usam telas (?), mesmo que seja seu filho a não usá-las. Se você está com um celular na mão, é certo que seu tempo para a criança está reduzido, no momento do uso do apetrecho eletrônico.
Ainda que seu filho não esteja preso aquele aparelho e ele seja para uso laboral, como para quem trabalha com internet, é pouco provável que você consiga dar a devida atenção à criança estando numa tela.
Se você é uma mãe ou pai nascido nos anos 80, 90 e começo de 2000 (ou mesmo um pouco antes, como a geração de 70), você cresceu junto com os grandes desenhos mundiais. E, presumivelmente, esses programas de televisão fazem parte de uma boa parcela de suas memórias afetivas, como quando se chegava da escola e adormecia no sofá, assistindo a algum episódio de Chaves, Pica Pau, Ursinhos Carinhosos ou O Fantástico Mundo de Bob.
O grande problema do uso das telas, na geração atual, não está propriamente na tela em si, mas no efeito exagerado de imediatismo que a era da internet trouxe.
Para assistir a um desenho, antigamente, era preciso esperar que a programação da TV aberta o exibisse. Havia comerciais entre um bloco e outro. O episódio acabava e somente no outro dia (quiçá outra semana) era exibido a continuação ou um novo programa.
Atualmente, a exibição do entretenimento não funciona mais nesse formato. Com a facilidade de ter uma tela minúscula nas mãos, a portabilidade do celular permite que se passa 10,12, 18 horas conectados. Repassamos aos nossos filhos péssimos hábitos de exageros que nós mesmos temos e que nos é muito cômodo ter uma criança quieta, presa à inércia e prostração em frente a uma televisão ou com um celular na mão.
É possível pular anúncios, assistir a inúmeros capítulos, colocar mais de um desenho, num mesmo turno, ultrapassando o período que antes era destinado a exibição de programas infantis. O imediatismo, o ritmo acelerado que a sociedade assumiu e, como conseguinte, o uso desenfreado das telas é um problema muito mais danoso e grave do que o mero uso da tela, ensimesmado.
Não pensamos nas consequências do que reproduzimos em nossa casa: ainda que a trabalho (o que nem sempre é), muitas horas num celular não sustentará a almejada ausência de telas que gostaríamos para os nossos filhos. Porque fazemos o contrário do que estamos lhes dizendo e essa conduta só funciona com eles por ali, até em volta dos 4 anos de idade.
A longo prazo, ainda que seu filho não esteja diretamente conectado a uma tela, se você está, os efeitos perniciosos do uso da tecnologia atingirão essa criança em formação.
A ausência total de telas só funcionaria se no ambiente em que a criança é criada não existisse nem aparelhos celulares nem televisores. Assim, e somente assim, seria possível afastar esse vilão, de fato, tão perigoso para a formação em muitos fatores de uma criança em desenvolvimento.
Mais profundo, portanto, é falar que a decisão do não uso de telas só se sustentaria se a criança fosse afastada, também, do convívio com outras pessoas. Perceba: a cena é clássica- casa de avó, tios, padrinhos tem sempre alguém ligando um desenho e desligando uma pequena mente para “alguns minutos de sossego”.
O não acesso a telas, de uma forma radical, como, contraditoriamente, prega a internet, não funciona. E não funciona porque na prática, não ter acesso a telas não é só inviável, como é impossível, na conjuntura mundial hodierna. O mais coerente é pensar no assunto de forma que os limites possam ser estabelecidos e os pais possam ter maior autonomia e controle sobre esse fator que mais cedo ou mais tarde a criança terá contato.
Por aqui, a experiência da dosagem, assim como a ingestão de açúcar (tem um texto falando sobre esse assunto – artigo da semana passada), tem trazido bons resultados.
Quando Augusto nasceu, acreditei e ventilei nas minhas redes sociais que ele não seria adepto e nem teria acesso a telas (risos. A pobre mãe iludida do primeiro filho de um relacionamento, nascido 17 anos depois da caçula de outro casamento).
O pai queria mostrar o jogo do Vasco. As avós queriam cantar musiquinhas que as letras estavam no YouTube. A Professora da primeira escolinha mostrou o primeiro filminho para a turminha toda.
Augusto ia demonstrando interesse. Era uma briga que já começou perdida para o lado da mãe que não queria o uso das telas. Ele iria conhecê-las, a despeito de eu querer ou não, de eu lutar ou não para afastar as telas dele.
Instituir horários, delimitar o número de episódios e selecionar o que vai ser assistido propiciou uma forma mais realista de lidar com esse assunto.
É uma equação que quando pensada com responsabilidade tende a garantir resultados e consequências mais proveitosas e salutares: os estudos que condenam o uso das telas precisam ser colocados dentro de uma realidade fática para, só assim, e só de fato, realmente funcionarem.
De resto, organizar a rotina para que a “hora do desenho” (como instituído por aqui) seja a hora mais apertada do dia a dia, como as manhãs que as demandas são mais intensas, somam a um bom funcionamento da gestão.
Se existe tempo de qualidade com a criança, se há um momento para leitura, brincadeiras e estímulo do imaginário para um bom desenvolvimento cognitivo, sensorial e motor, os efeitos nocivos que existem nas telas poderão ser atenuados e diminuídos por outras atividades que são pensadas para aquela criança.
Desligar a televisão, afastar-se do celular, na hora certa, com o zelo de ter momentos pensados para desenvolver melhor o nosso pequeno indivíduo, que se forma sob nossos cuidados, será muito bem recepcionado pelos filhos. Acredite! Não é somente o uso das telas que trazem prejuízos ao desenvolvimento de uma criança. É o que a tela ou qualquer outra coisa que esteja no lugar da criação do vínculo afetivo faz com a nossa família: telas ou outras coisas em que estejam nossa atenção rouba de nós um tempo precioso e que não volta mais com os nossos pequenos.
Então, não. A tela e o uso dela não esse vilão tão perigoso que tentam nos passar – mais que as telas, as horas exacerbadas da falta de atenção, de dedicação em explorar ao máximo o que está na infância (e somente na infância) de uma criança se apresentam como inimigos muito mais poderosos nas altas demandas de problemas futuros que um indivíduo pode ter.