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A Mulher nos primórdios do sertão

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Por: Neves Couras;

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Chegamos ao mês de maio, dedicado à mãe de Jesus. No entanto, talvez em busca de sorte no casamento, busca-se em Maria, também, um pouco de apoio para um casamento feliz. Estou remexendo nas histórias da família meu pai, quando me deparo com uma obra excelente para quem quer conhecer, com detalhes, um pouco da vida e dos costumes do nosso sertão.

Dentre esses temas, encontrei informações que nos remetem aos costumes sociais, econômicos e familiares da vida no sertão desde o ano de 1874. Trata-se de uma Obra escrita por Juvenal Lamartine de Faria, impresso em 2006. A referida obra, não fala exatamente de todo sertão, mas aborda a divisa do Rio Grande do Norte com a Paraíba, exatamente onde nasceram meus antepassados.

Há alguns anos, meu Irmão, alguns primos e eu, resolvemos tentar juntar a família, que de tão grande, foi se dispersando, a ponto de não conhecermos mais os primos mais próximos. Foi então que resolvi, puxando apenas por minhas memórias de menina, escrever de forma bem despretensiosa sobre esses detalhes da vida na casa de meus avós, cuja primeira infância, vivemos por lá. Memórias desde os meus três anos de idade, podem acreditar, que guardo tudo com muitos detalhes graças a Deus.

Dessas memórias, eu e meu filho Antônio, que como a mãe é chegado a história de família, surgiu o que chamei de “Livreto”, impresso na impressora em casa, com encadernação feita com grampeador doméstico, lembrando nossos primeiros caderninhos escolares. Nosso livreto foi distribuído entre os participantes de nosso Segundo Encontro da Família Mororó.

Talvez pela pressa, não pude aprofundar minha pesquisa. Agora, estou novamente, pensando para o Encontro do próximo ano, que acontece sempre em julho de cada ano, e, olha já estaremos neste 2024 no VI Encontro. Pretendo então, no sétimo, apresentar uma obra mais concreta.

Foi assim, que me cai às mãos, através da indicação de uma prima, esta graciosa Obra, que para minha surpresa, conta como tudo acontecia nos primórdios da nossa povoação de Pombal. Mas fiz um corte, para falar da vida da mulher daquela época. Espero que gostem, pois neste passado, está talvez a razão de ainda sermos vistas como nos tempos passados.

Inicio essa história pela construção da Casa Grande que, como seus compartimentos, tem a ver com a mulher. Preciso descrever um pouco toda a casa, para não ficar incompleto o projeto da época que, garanto, ainda existirem muitas casas, com quase a totalidade do projeto inicial. O autor já fala que eram mal divididas. “Cum corredor-central, escuro, partia do cupiá (varanda) para o interior e dava acesso aos quartos. Alguns até sem janelas – o das mulheres para que não fugissem”.

Era bem costume da época, as moças fugirem de casa para não casarem com os maridos arranjados pelos pais, ou, quando elas se apaixonavam por alguém, que os pais não aprovassem o candidato para genro, só restava então que algum conhecido do pretenso noivo, tudo armado com apoio, na quela época, de uma mucama, para que a moça fugisse para se casar. Com o avançar do tempo, meu pai deve ter arranjado algumas inimizades, pois serviu de cupido e “roubou” várias moças para amigos seus.

Após serem retiradas de casa, passavam a noite na casa de alguém conhecido da família, e no dia seguinte, o chefe da família que deu guarida a moça, juntamente com o namorado, se apresentava aos pais da moça, que não tinham outra providência, ao não ser realizar o casamento.

Voltemos às Casas. Estas, apresentavam Cômodos espaçosos, em parte para que redes não ficassem entipoiadas. Não havia quartos suficientes para acomodar todos os filhos e, às vezes, as visitas, por isso, não havia o costume do uso da cama para os filhos. Esta peça, era reservada apenas para a dona de casa, que na maioria das vezes não dormia com o marido no mesmo quarto.

Dos compartimentos da casa a área mais movimentada era a chamada sala das mulheres, onde permaneciam reunidas em trabalhos domésticos. Neste mesmo cômodo, normalmente ficava o oratório, onde à noite era “tirado” o terço, assistido por toda a família do fazendeiro e seus dependentes. É importante salientar que os quartos das filhas eram vizinhos ou de frente para aos dos pais. Algumas vezes, o único acesso do quarto das moças era através do quarto dos pais. Posteriormente, passaram a abrir janelas nos quartos das filhas. Nestas dependências das mulheres, dependendo do poder aquisitivo, algumas já tinham camas de arame, novidade que segundo (Câmara Cascudo, 1956), não foram bem aceitas de imediato.

As mulheres andavam à cavalo sobre silhões, uma sela com espécie de ganchos, ao lado direito, no qual é passada a perna esquerda, ou seja, as mulheres, não montavam como as vemos hoje, elas teriam que ficar sentadas de lado, com as pernas cobertas pelas saias.

Minha mãe, exímia amazona, andava neste tipo de sela, inclusive em uma que pertenceu a primeira esposa de meu avô. Era em couro muito bem trabalhado e ficava no quarto “assombrado” da casa de meu avô (o quarto da falecida esposa).

As escolas eram em casa. O Professor, chamado de mestres-escolas, contratados por fazendeiros. O período letivo quem definia era o fazendeiro, na maioria das vezes durava apenas três ou quatro vezes por ano. O professor, além do salário, recebia casa e comida e se recomendava, a quase todos excessivos rigores, nos castigos corporais infringidos aos alunos. A velha palmatória foi instrumento de trabalho até próximo aos anos de 1970.

Tanto os homens como as mulheres, estudavam nas mesmas salas, recebiam as primeiras aulas com a Carta de ABC, e tabuada. Posteriormente recebiam aulas de leituras e em Matemática, aprendiam a fazer as quatro operações – adição, subtração, multiplicação e divisão – tendo que tirar nas contas a “prova dos nove”. (Essa explicação, ficará para um outro momento).

A formação das famílias sertanejas, de forma quase patriarcal, mantinha os parentes próximos e até mesmo distantes reunidos em torno de um ascendente de maior prestígio.

Em quase toda família tinha alguém que resolvia os problemas, que ia desde as questões de terra até as escolhas das moças para os rapazes se casarem.

É a partir destas afirmações que poderemos fazer uma pequena análise da vida dessas mulheres que era reproduzida pelas filhas e netas. As mulheres não podiam ter acesso às salas da frente das casas quando tinha alguém de fora. A esses lugares, eram reservados apenas para os homens que, de regra, era quem decidiam tudo da vida daquela família. À mulher cabia apenas obedecer às ordens e cuidas dos afazeres domésticos. Não é de se estranhar que esse modelo vivido por tantas gerações, ainda está no subconsciente das mulheres de nossa geração.

Não aceito, e acredito que ninguém deva fazê-lo, que uma mulher, principalmente sertaneja, receba todo tipo de preconceitos, vindo mesmo de outras mulheres, quando, por exemplo, é sabido que o marido a esteja traindo, e até tenha outra família, e, a esposa, por já ter adquirido um certo conhecimento de seus direitos, queira a separação. É fundamental que nos ponhamos no lugar de nossas irmãs ao invés de criticá-las.

O que vemos com muita frequência nos jornais, são noticias de mulheres que foram mortas por seus companheiros quando estas não suportavam mais o sofrimento, a vergonha e até mesmo todo tipo de violência doméstica. Infelizmente, o velho preconceito, o costume do homem, provedor da sua família, que tem a esposa como propriedade sua, assim, como é proprietário da casa, da fazenda e de outros bens não se perdeu ainda.

Senti o que é preconceito desse tipo, em minha própria pele há uns trinta anos, quando vinha do sertão com uma equipe de técnicos da FAO (Organização dos Estados Unidos para Alimentação e Agricultura), quando, como costumo fazer até hoje, sempre que passo por Pombal, minha terra natal, aproveito para comprar alguns produtos que não encontramos com facilidade no litoral. Ao descer do carro, meu tio estava em frente à loja que eu entrei, pedi a benção, como de costume, e ele me abençoou, porém quando me viu num carro só com homens, perguntou: “Cadê o marido?”, a que respondi: “Ficou em casa cuidando dos filhos”. Ele passou uns seis anos ou mais sem falar comigo. Tendo o “lundum” passado apenas numa semana santa em que, como sempre, o cumprimentei e ele finalmente retribuiu a saudação, ao que meu pai, sempre espirituoso (e conhecendo o gênio do irmão) disse: “ele falou com você porque é sexta-feira santa e ele tem medo de ir pro inferno”.

 

Preconceitos desse tipo são bastante comuns em nossa vida diária. Acredito que nós que temos um pouco de consciência de que precisamos assumir a gestão de nossa vida e de nosso destino, precisamos falar, escrever e usar todos os meios que possuímos para fazer com que muitas outras mulheres, que vivem encurraladas em suas casas como se usassem tornozeleiras eletrônicas, possam lutar por sua liberdade. Liberdade de uma prisão imposta há sabe Deus quantos séculos.

Não pensem que esta prisão que muitas de nós mulheres vivemos, nos é imposta apenas pelos homens, ainda contamos com um numero muito grande de mulheres que nos apontam os dedos como se fossemos obrigadas a suportar todo tipo de violência que muitas vezes, elas vivem e não tem coragem de tentar se libertar.

Que este mês de maio seja também um mês de conscientização e de libertação de mulheres, não só de casamentos, que quando construídos com base no amor e no respeito mútuo, é muito bem de se viver. Contudo, nem sempre o casamento é um conto de fadas.

Muitas de nós, passamos por problemas de traições e violências (físicas, emocionais e financeiras) que não devemos nos permitir passar, pois quando não somos respeitadas, aquele lugar não mais nos cabe, embora a sociedade e muitas outras mulheres achem que casamento tem que ser pra sempre. Pode ser sim! Mas onde fica seu amor próprio? É por esse amor que devemos lutar. É a celebração do nosso amor por nós mesmas que devemos celebrar nesse mês e em todos os outros.

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