Por: Karen Emília Formiga;
Com a aproximação da festa mais alegre, colorida e popular do Brasil, todos os lugares desse país já se preparam para referenciar e cultuar samba, axé e frevo. Pessoas vivenciam, com entusiasmo, esse período e a consolidação da identidade cultural de um povo alcança e movimenta a economia do país.
Esse texto não é sobre isso, porém.
Não pretende discorrer sobre os efeitos econômicos dessa festa ou traçar um paralelo entre os impactos dos recursos destinados ao acontecimento dos eventos espalhados em todo território genuinamente festivo.
Essas linhas são só lembranças de um coração folião que já vive com saudade a época carnavalesca.
Como uma exímia foliã que fui, e ainda apaixonada pela simbologia desta data, recordo-me, saudosa, de que os carnavais terminam. E a saudade dos anos áureos dos bonitos carnavais vividos são extensões do silêncio que a quarta-feira de cinzas deixa, tantas vezes, dentro da gente.
Chegam ao fim, pelo menos, fases que acompanham a trajetória de um indivíduo e que alcança, invariavelmente – pela lógica e disposição do tempo, dias de confete e serpentina.
Chegou ao fim, por exemplo, para alguém que não eu, em razão da idade, os bailes fenomenais, embalados por grandes nomes que entraram para a história por fazerem dessa festa marcos de grandes épocas: Dalva de Oliveira e Carmen Miranda exemplificam a grandeza dos anos áureos desse tempo.
Mas as pessoas que puderam contar com os bailes carnavalescos na sua essência mais forte – é porque não dizer mais bonita (?) – não os viveram para sempre.
Há um prazer imensurável em ver fotos, quase sempre em preto e branco, de pessoas documentando seus carnavais: pierrôs, colombinas, palhacinhos. Quantas fantasias. Quantos amores de carnavais. Quantas histórias!
É quase possível tocar naquele tempo por meio daquelas fotos.
Já viu? Experimente viver essa experiência: alguém mais velho que você, uma tia, avó ou mesmo seus pais tem uma memória dessa guardada em algum lugar. E acredite: eles vão adorar contar alguma história de um carnaval que foi vivido cheio de lança perfume e muita folia.
Carnaval é quase sempre intrínseco à juventude. Há pessoas que perpetuam essa paixão por anos. Mas por limitações físicas de um corpo que envelhecerá, todo carnaval para toda pessoa terá um fim.
E não! Aqui, não se é um parágrafo de tristeza. Nem tudo que chega ao fim representa, de fato, o final. Quase sempre o carnaval perde o protagonismo e se mudam os propósitos, os objetivos de vida e aquele baile ou bloquinho que íamos com tanta empolgação, chega ao fim.
Chega ao fim o tempo das marchinhas e orquestras. Que só ganhará ares saudosistas em eventos conhecidos como “bailes da saudade” numa tentativa de viver uma retrospectiva de outros tempos.
A era Netinho, É o tchan, Harmonia do samba, Ivete, Daniela Mercury, Chiclete com Banana que alcançou os jovens senhores e senhoras da mesma faixa etária que a minha (um pouco mais velho, um pouco mais jovem) e abrilhantou festas e blocos no interior ganharam o prêmio de uma das mais belas lembranças vividas por pessoas com o meu perfil. Mesmo essas, chegaram ao fim e são lembranças de uma geração dos anos 90.
Quando eu era criança ou nos primeiros anos da minha juventude, vivi os melhores carnavais na minha terra natal. Tenho viva uma memória afetiva que acompanha minha história: na quarta-feira de cinzas, esperávamos a padaria abrir para comer pão quentinho e depois íamos para casa sofrer porque a quarta ingrata havia chegado. Era de fazer chorar, de saudade, quando o dia amanhecia e víamos o frevo acabar.
Em capitais, ganharam as ruas de muitas cidades as micaretas, como prévias que antecediam os quatro dias de festa, de fato, aquele marcado no feriado.
Esse formato quase não é mais visto, salvo por um outro evento acontecido no verão.Teve seu fim para que outros segmentos ganhassem espaços.
Carnaval é antes de tudo a representação de um tempo, o retrato de uma identidade, a característica de um tempo.
Chega ao fim os interesses de que faz a festa acontecer. Pessoas casam, constituem famílias, passam a ter outro focos, outros projetos, envelhecem.
E aquela festa que antes fez parte de dias coloridos e alegres chega ao fim. Porque é fase. Porque é ciclo. E cíclica, a vida encerra capítulos, para que outros se apresentem.
Tem seu fim! E contaremos histórias que terminarão com a frase célebre de quem já viveu épocas áureas dessa festa: “de outros carnavais! Que tempo bom!”