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InícioNeves CourasA longevidade em um país sem estrutura apropriada

A longevidade em um país sem estrutura apropriada

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Esta semana, exatamente dia 05 de setembro, nossa tia completou 97 anos. Que data linda e que felicidade poder abraça-la e agradecer a Deus por sua existência entre nós. Eram 5 irmãs, mulheres que cresceram e vivenciaram muitas dificuldade e períodos de nossa história. A mais velha, nossa mãe, nasceu em 1923 a mais nova nasceu em 1931.

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Dessas, apenas casaram-se nossa mãe Julita e Terezinha a mais nova, que não teve filhos. Com exceção de tia Terezinha, que desencarnou por outros comprometimentos de saúde, as outras tiveram Alzheimer. Tia Severa, a de 97 anos, não desenvolveu a doença, mas seu estado de demência está bastante acentuado.

Ao abraça-la, sentir que estava tendo uma rara oportunidade de passar as mãos em seus cabelos, sentir suas mãozinhas trêmulas me abraçando, olhando em seus olhos, pedir a Deus que a abençoasse por nos ter feito tanto bem. Não só ela, mas todas nossas tias.

Quanta coisa se passa em uma vida de quase cem anos. Nasceram em um lugar herdado de seu bisavô, que foi sesmeiro. De suas terras, surgiram as cidades de Condado, Malta e Santa Luzia.

Conviveram com pessoas que outrora foram escravizadas por seus antepassados. Seu modo de vida não diferia muito daquele de seus antepassados até que chegou o IFOCS, e sua principal propriedade se tornou o Açude Engenheiro Arcoverde. A indenização dessa área, nunca receberam.

Se tornaram donas apenas das lembranças de tempos de opulência que viverem, e após a morte de nosso Avô, Chico Antônio de Condado, como ficou conhecido, se mudaram para Pombal, e cada uma teve que desenvolver as habilidades, que haviam aprendido apenas para se tornarem boas donas de casa, como profissão para viverem dignamente. Não foi fácil, mas existe um ditado muito antigo que diz que quem tem competência se estabelece. E, se estabeleceram como costureiras, bordadeiras e professoras. Nunca tiveram vida fácil, mas nos orgulhamos de sua história de dignidade, elegância e de grandes amizades.

Passaram pela segunda Guerra Mundial, pela luta das mulheres para conseguirem ser eleitoras, por doenças como a Febre Tifoide, doença bacteriana aguda. Por todo avanço da tecnologia. Apesar do radio ter sido descoberto nos Estados Unidos em 1906, acredito que quando elas tiveram acesso a essa esplendorosa tecnologia, já eram moças. Imagine a chegada da televisão e do telefone celular? Vivenciaram a chegada das vacinas e viram o homem chegar à lua.

Vejam quanta coisa uma existência de 97 anos guarda! Seus amores, suas dificuldades de viverem num tempo que a mulher não tinha direitos. Elas tiveram ainda três irmãos. Desses, dois ainda estão entre nós. Só o primeiro que partiu. Apesar de morarem fora da Paraíba, dão a assistência que é possível.

Fiz questão de prestar essa homenagem neste espaço, mas também aproveito para, como sempre, de nosso caso real, aproveitarmos para pensar em tantos idosos que estão na mesma idade ou no intervalo dos 65 aos 97 anos como nossa tia, e que não têm o carinho e assistência que a ela são dedicados.

Os últimos dados do IBGE apontam existir neste ano de 2023, 33 milhões de idosos do Brasil. Ou seja, 15, 1% de nossa população é idosa. Como minha tia, recebe apenas um salário mínimo como aposentadoria. Como ela é solteira e vive ainda em sua casa, são necessárias 3 cuidadoras para que ela tenha o amparo necessário. Agora vem a pergunta que todos devem estar fazendo: Como é possível uma pessoa que recebe como aposentadoria sobreviver e arcar com o custo de 3 cuidadoras, a medicação, alimentação e custos com a custeio de uma casa (água, luz e telefone)?

Muitos podem responder: coloca-se numa casa para idosos. Sim, pode até ser essa a única saída para muitos que não tem família, ou como vemos comumente, a família abandona, pois, “velho dá muito trabalho”. Criança também. A diferença é que temos nossos pais que são eles que cuidaram de nós e, hoje, estão nestas condições.

Não posso deixar de usar esse grande espaço, para levar ao pequeno número de leitores que temos, a reflexão de que PRECISAMOS URGENTEMENTE DE UMA POLÍTICA VOLTADA PARA O IDOSO. Não estou me referindo a casas que muitos são colocados, nas quais se faz necessário a doação para a instituição de 70% do salário que recebem para bancarem sua estadia.

Se em nossas casas, o salário mínimo não é suficiente, como seria em uma instituição? Estas instituições, na grande maioria, precisam da boa vontade de doadores e voluntários para que sobrevivam. Mas só para lembrar, estamos falando de seres humanos que passam a vida inteira produzindo e contribuindo para que tenhamos hoje, em termos de economia, produção de conhecimento e muitas vezes, produção de tecnologia. Mas, como tiveram a “sorte” de viver muito, tornaram-se um peso para a sociedade e as famílias.

Precisamos relembrar que cada ser humano é parte da Criação, da divindade. Que em qualquer situação, principalmente os mais vulneráveis precisam urgentemente de POLÍTICOS E POLÍTICAS que realmente assegurem saúde, medicamento, alimento e amparo verdadeiro. Não falo de “casas-depósito” de idosos, falo de lugares onde lhes sejam possibilitas uma vida com prazer, alegria e estímulo para viverem. Nos idosos, incontáveis vezes, a primeira doença que chega é a depressão. Por que será? Quantos geriatras, ou neurologistas, psiquiatras existem nas Unidades Básicas de Saúde que saiam de seus lugares e visitem o idoso em sua casa?

O que vemos são idosos esquecidos pelo poder público como se fossem peças descartáveis, um produto que não contribui com mais nada.

Para concluir, quero deixar uma frase de nossa mãe, que encontrei em um livro que comprei por volta de 1970. Estava revendo alguns livros e, para minha felicidade, estava escrito na obra de Orígenes Lessa – O feijão e o Sonho: “Nunca sabemos o bem que fazemos quando fazemos o bem”.

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