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O Gigante adormecido: Sucateamento do CT&I

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Em 13 de abril de 1994, em pleno ano para as eleições de presidente, governadores, deputados e senadores, o jornal londrino, Financial Times, publicou, pela primeira vez, o termo Brasil “gigante adormecido” e vinculou tal tese à crise política no México e ao aumento da taxa de juros nos EUA. Na mesma matéria, credita-se às reformas políticas e econômicas estruturais, bem como às privatizações, a conjuntura básica para a modernização da economia nacional. Sucessivas crises financeiras nacionais ou mundiais ou problemas políticos internos se deram depois desse episódio, e em todos os períodos, a educação foi uma das estruturas do Estado que mais foi afetada com cortes ou contingenciamento.

Passados 8 (oito) anos da publicação dessa matéria, eu iniciei meus estudos na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), quando a Instituição estava vivenciando um momento delicado financeiramente, sendo necessário o apoio dos estudantes, em questões básicas, como a aquisição de papel comum A4, papel carbono, tinta e álcool para as cópias em Mimeógrafos. A Biblioteca Central e as Setoriais continham centenas de livros velhos com folhas soltas ou rasgadas; as cadeiras eram quebradas e os ventiladores de teto e de paredes sem eficiência. A falta de equipamentos de informática – naquela época – era algo normal diante de tantos problemas estruturais, físicos e de logística, como, por exemplo, os inúmeros veículos quebrados, depenados – para fazer manutenção preventiva de peças para outros veículos circularem – e abandonados na garagem da Instituição, os quais deveriam estar à disposição dos docentes e discentes para aulas práticas em campo.

Nos anos posteriores, expansão de políticas para a educação superior desenvolvidas durante os governos de Luíz Inácio Lula da Silva (2003-2010) e Dilma Rousseff (2011-2016) fizeram a diferença nas Instituições Federais de Ensino Superior – Universidades Federais e Institutos Federais – e suas marcas estão presentes até os dias atuais.

Algumas crises financeiras e políticas foram vivenciadas nos últimos anos de forma estarrecedora e com consequências irreparáveis a curto e médio prazo, como a crise mundial das hipotecas do subprime (2008) – queda do índice Dow Jones motivada pela concessão de empréstimos hipotecários de alto risco; impeachment ou Golpe da presidenta Dilma Rousseff do PT (2016); Reforma Trabalhista instrumentalizada pela Lei Federal n° 13.467 de 13 de julho de 2017, que alterou significativamente a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT); Emenda Constitucional n° 95, de 15 de dezembro de 2016 ou PEC do Teto dos Gastos Públicos, que alterou a Constituição Brasileira de 1988 para instituir o Novo Regime Fiscal; Emenda Constitucional n° 103, de 12 de novembro de 2019 ou PEC da Reforma da Previdência, que alterou a Constituição Brasileira de 1988 para modificar as regras de aposentadoria e pensão aplicáveis aos trabalhadores segurados do Regime Geral de Previdência Social e aos servidores públicos civis; e Pandemia da COVID-19 (2020).

Ao entrar no universo acadêmico universitário em 2002, passei a viver cotidianamente um ambiente mais intenso de leituras e interpretações críticas e reflexivas, tanto do ponto de vista técnico quanto do ponto de vista socioeconômico, no qual as pessoas, as coisas e as estruturas do Estado estão inter-relacionadas, regidas sob a batuta da democracia.

Pensar o espaço e o território sem antes entender e compreender como se deu a chamada revolução Técnico-Científico-Informacional e as formas de uso e ocupação em âmbito regional ou local via Divisão Social do Trabalho e modos de produção – forças produtivas e relações de produção –, não representaria a excelência de uma tomada de decisão correta sobre uma possível solução de intervenção ou de reparo ambiental, de engenharia, de saúde, de questões socioeconômicas, enfim, não contribuiria efetivamente para a melhoria da qualidade de vida da sociedade e seus desafios contemporâneos.

Esse universo de pensar proposituras técnicas e científicas requer tempo, estudos e pesquisas, e isso não custa barato para a sociedade moderna – entes públicos ou privados –, a qual desembolsa muito dinheiro, seja de forma direta ou indireta, às empresas, instituições ou pessoas físicas que desempenham seus papéis profissionais e suas habilitações na resolução de problemáticas distintas do dia a dia.

No Brasil, de acordo com a Constituição Federal Brasileira de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) – Lei Federal n° 9.394, de 20 de dezembro de 1996 – as Instituições de Ensino Superior – particulares e públicas – são as responsáveis pela essência da pesquisa científica e da inovação tecnológica nacional. A responsabilidade primária do Governo Federal em garantir o ensino superior público gratuito remete ao direcionamento de aporte de recursos financeiros para as ações e atividades ligadas à Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) que se dão nos laboratórios das Instituições Federais de Ensino Superior – Universidade Federais e Institutos Federais –, e são, na maioria, gerenciadas pelas agências fomentadoras do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

No momento atual, o presidente Bolsonaro (ex PSL), desde que assumiu o Governo em 01 de janeiro de 2019, vem realizando um desmonte do ensino superior sem precedentes até porque parte da premissa de “combater o esquerdismo, a ideologia de gênero, o progressismo e o chamado marxismo cultural engendrado na educação superior”. O desrespeito à autonomia universitária e os cortes de orçamento nas Instituições Federais de Ensino Superior aprofundou a gravidade da situação de gestão e de orçamentos nas Universidades Públicas.

Segundo a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), desde 2019 o orçamento das Universidades Públicas de Ensino Superior caiu de 6,06 bilhões de reais para 4,49 bilhões em 2021, o que representa uma queda de 1,57 bilhões de reais no orçamento, um rombo significativo para o avanço da ciência, tecnologia e inovação.

Segundo as propostas de Lei Orçamentária Anual (LOA) encaminhadas pelo Executivo, ao longo dos últimos 2 (dois) anos, o corte de orçamento direcionado para as políticas das Instituições de Ensino Superior – Públicos e Privados – também vem sendo deliberado de forma proeminente pelo Governo Bolsonaro graças ao “freio de arrumação” com a chamada “gastança”, que passou de 33,79 bilhões de reais em 2019, passando pelos 28,25 bilhões em 2020, até chegar nos 13,76 bilhões de reais no ano corrente (2021), o menor orçamento dos últimos 12 (doze) anos. Tendo como base as informações da base Web of Science, compiladas pela Clarivate Analytics, das 50 Instituições que mais publicaram trabalhos científicos no Brasil nos últimos 5 anos, 43 são Universidades Públicas, 5 são Institutos de pesquisa, 1 é Instituto Federal e apenas 1 é uma Universidade Privada.

O Governo Bolsonaro também realizou um corte de 68,9% da cota de importação – benefício fiscal definido todo ano pelo Governo Federal – de insumos de pesquisa segundo o CNPq, que passou de U$ 300 milhões de dólares em 2020 para U$ 93,2 milhões no ano corrente (2021), o que afeta diretamente os insumos e equipamentos necessários às pesquisas em andamento, inclusive as voltadas ao combate ao novo coronavírus (SARS-CoV-2).

Quando se vê declarações como as proferidas pelos ex’s Ministros da Educação Ricardo Vélez Rodriguez, em 2019, de que a “educação superior não é para todos” e “a ideia de que o ensino superior deve ser para todos não existe”, e Abraham Weintraub, em 2019, de que “as universidades que, ao invés de pesquisar como melhorar a performance acadêmica, estão fazendo balbúrdia”, percebe-se uma despreocupação entre o Governo Federal, o ensino superior e as Universidades Públicas. Observam-se ataques contínuos à educação superior, aos professores e pesquisadores; constata-se a disseminação de notícias falsas, de comentários agressivos, de ameaças e perdas de direitos.

A ciência, a tecnologia e a inovação são fundamentais para o avanço de qualquer sociedade, o que impõe ao Estado o papel constitucional de regular a forma de educação, através de planos e políticas públicas, visando uma melhoria na estratégia de desenvolvimento, de qualidade e formação do conhecimento dos seus cidadãos.

É como afirmava o nosso querido patrono da educação brasileira, Paulo Freire: “a educação não transforma o mundo. Educação muda as pessoas. Pessoas mudam o mundo”.

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3 COMENTÁRIOS

  1. O texto do companheiro Jancerlan Rocha é de fundamental importância para os leitores de um modo geral e para os professores, estudantes, pesquisadores dedicados ao nosso desenvolvimento tecnologico.
    Jarcerlan conseguiu dissecar a governança do ensino superior e da pesquisa tecnológica com rara capacidade de transmissão, nos trazendo informações que poucos têm. Parabéns!

  2. Grande Jan, me senti um nostálgico, saudosista. E olha que sou "novo"… E pensar que tive o prazer de ver e viver áureos períodos de investimentos na educação (notadamente de ensino superior na UFPB) com tantas outras iniciativas e fomentos que agora estão definhando: FIES, PROUNI, Ciências Sem Fronteiras, disponibilidade de bolsas de mestrado e doutorado, financiamento a pesquisas científicas, projetos de extensão. Quando lembro que o CNPQ vai ter R$ 22 milhões de investimento em 2021 para pesquisa, e que em 2020, R$ 15 milhões serviram para leite condensado…

    "Há coisas que são atemporais no cosmos."

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