Por: Rui Leitão;
O general José Machado Lopes, comandante do III Exército, dirigiu-se ao Palácio Piratini disposto a falar com o governador. Temia-se que tivesse a intenção de prender Brizola. Em torno de 50 mil pessoas se postavam ao redor do palácio, dispostas a impedir que a ordem fosse cumprida. No entanto, na reunião com o governador, o comandante declarou que defenderia a Constituição e garantiria a posse de João Goulart, quebrando a hierarquia ao descumprir uma ordem do ministro da Guerra para reprimir a resistência liderada por Brizola.
A resistência gaúcha ganhava adesões em todo o país. Na Paraíba, o governador Pedro Gondim aderiu à campanha, defendendo a legalidade constitucional e a posse de Goulart. O governador de Goiás, Mauro Borges, arregimentou voluntários para formar um “exército da legalidade”, tendo avisado a Jango que as forças sob seu comando garantiriam sua chegada a Brasília, por terra, a partir de Goiânia. A União Nacional dos Estudantes (UNE) transferiu sua sede para Porto Alegre, e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) se manifestou contra o golpe. O marechal Lott e outros integrantes do Exército lançaram um manifesto à população brasileira, conclamando-a à enérgica defesa da legalidade. Em razão disso, Lott foi preso por ordem do ministro da Guerra, marechal Odílio Denys.
O vice-presidente chegou à capital gaúcha no dia 1º de setembro, já informado de que havia a proposta de uma emenda à Constituição, tornando o país parlamentarista como forma de impedir que, ao assumir, tivesse plenos poderes para executar as reformas de base que defendia. O deputado Tancredo Neves teria ido ao seu encontro, em Montevidéu, para convencê-lo a aceitar a solução parlamentarista. Jango então se viu diante de duas opções: a primeira, apresentada por Brizola, era marchar até Brasília com o III Exército; a segunda, aceitar o acordo com os militares e voltar ao poder num regime parlamentarista. Preferiu a segunda opção. Em discurso dirigido à multidão que o escutava em frente ao Palácio Piratini, justificou sua decisão como forma de evitar uma suposta guerra civil e, com ela, um banho de sangue. O povo, no entanto, não aceitou suas alegações e respondeu com vaias e apupos. Jango teve que sair pela porta dos fundos do Palácio, com a ajuda de Brizola.
Tomada a decisão, Jango partiu de Porto Alegre para Brasília. Oficiais da FAB (Força Aérea Brasileira) encheram de tonéis a pista da base aérea, tentando impedir o pouso do avião que o transportava. O chefe da Casa Militar, general Ernesto Geisel, ao tomar conhecimento do plano, mandou liberar a pista e afirmou: “Já que os senhores [ministros militares] resolveram dar posse, ele toma posse.”
Na madrugada do dia 2 de setembro, o Congresso votou a emenda que instituía o regime parlamentarista no Brasil. Embora inconformado com a decisão de Jango, Brizola entendeu que, de qualquer forma, o movimento por ele liderado conseguiu evitar o golpe militar, numa demonstração do quanto é importante a mobilização popular em defesa da democracia. João Goulart tornava-se o primeiro presidente da República do regime parlamentarista. Mas foi por pouco tempo. Por plebiscito o povo aclamou a volta ao presidencialismo, em 1963.
Rui Leitão