Por: João Vicente Machado;
A Câmara Federal insiste mais uma vez, numa prática que vai se tornando uma rotina. Recentemente e na calada da noite, aquela casa legislativa aprovou através de uma célere votação digital que não sem contou com a presença da grande maioria dos parlamentares, uma profunda e lesiva modificação na legislação que rege o licenciamento Ambiental no Brasil.
Às vésperas da COP-30, que será realizada em Belém do Pará, a Câmara dos Deputados aprovou , em sessão semipresencial e quase silenciosa, uma mudança drástica e danosa, no licencia,[mento ambiental brasileiro. Em plena madrugada do dia 17 de julho de 2025, um projeto apelidado ironicamente de “estruturante” para a polítrica socioambiental foi votado com quórum reduzido, ignorando debates e atropelando a democracia. Agiram conscientes de que as alterações que propunham, iriam provocar grandes impactos ambientais contra os nossos preciosos biomas, contra à natureza e por extensão contra o planeta terra, no qual eles também habitam e dele não podem se mudar.
O deputado Hugo Motta-REPULICANOS-PB, presidente da Câmara, repetiu um padrão preocupante; convocou sessão em cima da hora por meio de redes sociais, e permitiu uma votação remota, em um dos temas mais sensíveis da pauta nacional. Assim, como já havia procedido com a reforma do IOF, o parlamentar manobrou para esvaziar o debate público e garantir a aprovação de um projeto com graves consequências ambientais. A ele, cabe de oficio, pautar todas as matérias legislativas elaboradas para a apreciação dos seus pares.
Nessa azáfama desenfreada para votar de afogadilho e já próximo das 0;00h ou da meia noite, com um plenário quase vazio, ele colocou a matéria em votação numa silenciosa votação virtual. O placar foi elástico e contabilizou 217 votos a favor e 116 votos contrários, para aprovar um PL que na verdade, foi o maior retrocesso de todos os tempos na legislação ambiental brasileira.
É pertinente que fique registrado para a posteridade, a composição da mesa que dirigiu os trabalhos daquela noite, com nomes e a legenda partidária dos parlamentares. Estavam presentes e compondo a mesa: o Presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Mota (REPUBLICANOS-PB) Dep. Bia Kicis e (PL- DF) Dep. Rodolfo Nogueira. (PL-MS)
Para um melhor entendimento dos leitores e dos internautas, julgamos pertinente descrever em detalhes mas de forma sucinta, o rito processual de como é obtido o licenciamento ambiental, que com algumas exceções é mais ou menos esse:
1 – Licença Prévia: (LP) O interessado na construção de quaisquer empreendimento ou atividade, de moto próprio ou através de um preposto credenciado, dará entrada de forma digital a um pedido de licença prévia, dirigido ao órgão ambiental competente. No pedido ele solicitará uma LP, que a rigor é um atestado de viabilidade, emitido pelo órgão oficial suscitado. De posse desse instrumento, ele poderá sem necessidade de um projeto executivo elaborado com dispêndio financeiro, avaliar a real possibilidade ou até mesmo a impossibilidade de realização da atividade ou do empreendimento pretendido. Com a LP ele terá uma sinalização positiva ou negativa para a realização do seu projeto. A partir de então, o projeto executivo poderá ser contratado, para dar seguimento a execução.
2 – Licença de Instalação: (LI) Em continuidade ao processo a LI autoriza em caráter oficial, a instalação do empreendimento ou da atividade. Tudo em fiel obediência ao projeto executivo apresentado e, de acordo com as especificações constantes nos planos, programas e projetos aprovados na LP, incluindo rigorosamente, as dimensões, a forma de controle ambiental, além dos demais condicionantes ditados pelo órgão ambiental competente. .
3 – Licença de Operação: (LO) Autoriza o funcionamento do empreendimento quando da conclusão da obra, não sem antes verificar in loco e através da fiscalização, tanto a obediência ao projeto executivo, quanto a todas as recomendações constantes nas licenças pretéritas, com as medidas de controle ambiental cabíveis.
4 – Licença de Alteração: (LA) Se por acaso no decorrer do funcionamento o empreendedor concluir que deverá alterar ou ampliar o projeto do empreendimento ou atividade e, desde que a LO esteja vigendo, o órgão ambiental competente poderá autorizar a ampliação através de uma LA.
5 – Licença Simplificada: (LS) É uma licença diferenciada que será concedida para localização, implantação de empreendimentos ou atividade exclusivamente de porte micro. O prazo será no máximo de 2 anos.
6 – Licença de Instalação e Operação: (LIO) É um tipo diferenciado de licença ambiental concedida exclusivamente para autorizar ou regularizar a implantação de projetos de Reforma Agrária, conforme as especificações do projeto básico, o tamanho da área e as condições do projeto ambiental a ser rigorosamente cumprido. O prazo de viabilidade mínima será de 3 anos.
7 – Autorização Ambiental: (AA) Será concedida para condicionar a realização de empreendimentos ou atividades, pesquisas e serviços temporários ou para execução de obras que não caracterizem instalações permanentes. Caso contrario será exigida a licença ambiental correspondente em substituição à autorização.
E.T: 1- Todo rito do licenciamento está à disposição no inciso I do art.8° da resolução CONAMA n° 237 de 19 de dezembro de 1997.
2- Esse é o licenciamento mais frequente. Em se tratando de empreendimentos grandiosos e mais impactantes quase sempre é necessário um Estudo de Impacto Ambiental-EIA e se necessário um Relatório de Impacto Ambiental-RIMA.
Apreciemos agora as radicais alterações feitas e os impactos que elas poderão causar aos Biomas, às pessoas, à natureza e ao planeta.
. Licenciamento Simplificado: A licença simplificada que já era uma prática dos Órgãos Ambientais e que contemplava exclusivamente empreendimentos de porte micro, foi modificada para ser concedida para quaisquer empreendimento ou atividade de baixo impacto, com o risco de aumento mais célere do desmatamento e da contaminação dos recursos hídricos.
. Auto-declaração de Conformidade: As próprias empresas ficam autorizadas a emitir auto-declaração de conformidade ambiental. Isso significa a redução ou eliminação da fiscalização, aumentando consideravelmente a probabilidade de crimes ambientais como é o caso do rompimento de barragens.
. Redução da Participação Social: As comunidades tradicionais e povos indígenas teriam menos direito á consulta prévia em empreendimentos ou atividades que afetam suas terras, uma exclusão de viés possessivo que pode levar a grandes conflitos, além de ser uma violação de direitos dessas comunidades.
. Aceleração de Empreendimentos: Empreendimentos ou atividades que envolvam obras de infraestrutura, mineração e agronegócio teriam prazos mais curtos para aprovação, mesmo em áreas sensíveis com risco de pressão sobre biomas como a Amazônia e o Cerrado.
. Fragilização da fiscalização: Os estados e municípios teriam a autonomia ampliada para definir regras ambientais. Essa abertura inconsequente poderá ser o estopim de uma guerra fiscal entre as instancias estaduais, na disputa por padrões ambientais mais baixos e atrativos, aumentando consequentemente a desigualdade no tocante á proteção ambiental.
A atitude Câmara dos Deputados em aprovar o que foi chancelada como Lei da Devastação, indubitavelmente traz consequências, as mais lesivas ao meio ambiente, além de comprometer a imagem do Brasil perante um mundo preocupado com a 6ª extinção de espécies. Logo no Brasil que em novembro próximo estará sediando em Belém do Pará, em pleno bioma da Amazônia, a COP-30.
Esse PL que o mundo espera que seja vetado pelo Presidente Lula, com certeza trará consigo:
. Aumento do desmatamento e da consequente degradação ambiental:
A dispensa do licenciamento preconizada pelo PL para as atividades de baixo impacto é uma abertura tentadora no sentido de abrir caminho para uma expansão de fronteira agrícola indevida, como também para a exploração de recursos naturais sem o mínimo controle ambiental.
. Contaminação dos recursos hídricos: Em tempos de escassez mundial crescente dos recursos hídricos, todo e qualquer cuidado com a água nossa de cada dia ainda é pouco. Tanto no aspecto quantitativo quanto no aspecto qualitativo, por ser a água um recurso natural único e insubstituível.
. Conflitos Socioambientais: As comunidades tradicionais e principalmente os povos indígenas, têm as florestas como habitat e vivem do extrativismo sustentável. A redução da participação social desses povos, a aceleração desenfreada de empreendimentos em áreas protegidas e a perspectiva de devastação iminente, é um fator de apreensão para esses povos e de aumento desses conflitos que nessa modalidade que se torna exclusiva desses povos, com certeza irão gerar conflitos mais intensos.
. Prejuízos à saúde Humana: Quaisquer atividades humanas, seja ela qual for, sempre irá provocar impactos na natureza. Para um uso sustentável, a apropriação desses recursos deverá obedecer rigorosamente aos protocolos ambientais.
As transgressões a esse regramento poderão acarretar contaminações diversas, de efeitos deletérios à saúde da população, notadamente em áreas próximas de empreendimentos de alto potencial de impacto.
. Conclusão: É por essas e tantas outras que os movimentos sociais e ambientais estão se mobilizando em defesa do veto presidencial. O argumento usado além de outros, é que o PL representa um grande retrocesso em relação a todas as conquistas ambientais pretéritas que podem ser desastrosas ao meio ambiente e por extensão a população, inclusive os que aprovaram essa excrescência legal.
Referências:
Página Inicial — Superintendência de Administração do Meio Ambiente (Sudema;);
Arquivos pessoais de João Vicente Machado;
Fotografias:
Câmara aprova ‘PL da Devastação’ em votação na madrugada – Giro Marília Notícias;
CRIMES AMBIENTAIS: Extração ilegal de madeira aumentou 19% na Amazônia – Rondoniaovivo.com;
Seis meses depois da lama da Samarco, comunidades do Rio Doce lutam por justiça – Agência Pública;
O que você precisa saber para entender a crise na Terra Indígena Yanomami | Instituto Socioambiental;
Desmatamento no Cerrado: Goiás apresenta maior redução em área afetada – Rádio 105.7 FM;
Rios na Amazônia tem risco muito alto de contaminação por mercúrio | Agência Brasil;
Eldorado dos Carajás, 25 anos do massacre | Outras Palavras;