Ondas midiáticas

Por: Mirtzi Lima Ribeiro;

A cada período surgem ondas de apelos midiáticos, incluindo o repasse massivo de vídeos e mensagens ressaltando o assunto “x” ou “y”. Quem promove tal conteúdo? Eis a questão que precisaria ficar clara, entretanto, seus mentores estão ocultos. E todo anonimato é pernicioso.

A bola da vez traz uma trilogia sintomática. A questão dos “bebês Reborn”, das “esposas ou namoradas troféus” e os “cursos para aprender a ser homem”. Eu classificaria esse tripé como uma bomba conceitual retrógrada, tendenciosa e até criminosa. Por que isso? Esta tríade tem em comum um alvo: as mulheres.

Proliferam no ambiente da web vídeos, “memes” e mensagens excêntricas, inclusive de mulheres com os seios à mostra simulando dar de mamar a um “bebê Reborn”, além de supostos pedidos de pensão a ex-maridos através de advogados, por causa desses bonecos de borracha e hipotéticas solicitações de atendimento médico desses brinquedos que imitam criancinhas recém-nascidas.

Qual seria o objetivo da divulgação maciça desse teor? O que querem demonstrar?

O que fica patente é que passam uma imagem distorcida. O que eles ressaltam? Mulheres com distopia cognitiva da realidade e a necessidade de serem contidas, controladas e reorientadas pelo homem.

Se pensarmos sem paixões e sem assombro, nós iremos perceber que há mais apelo midiático do que realidade e do que fatos nesses vídeos que impactam. É mais assustador o que deve existir por trás deles!

Mas, deixando de lado nosso espanto, esses disparos em série nos apontam para uma campanha macabra orquestrada para reduzir a pó, à insignificância, à ideia de demência ou de falta de cognição, que querem atribuir à figura da mulher, já tão massacrada ao longo de milênios por um patriarcado vertical que boicotou a sua importância.

Tais vídeos e “memes” têm origem duvidosa e estão recheados de objetivos lesivos. Qual é a procedência deles? Quem os financia e patrocina? As mulheres que neles aparecem não estão identificadas e nem sabemos se são atrizes pagas ou inteligência artificial. Mesmo assim, sem se questionar sua origem, estão sendo multiplicados potencialmente pelos ferozes algoritmos, de modo a alcançar cada vez mais acessos. E ainda há os inocentes úteis que os replicam incessantemente, colaborando com os terríveis algoritmos. As empresas que veiculam isso na web estão envolvidas? Possivelmente até sua espinha dorsal e recebem recursos financeiros para essa veiculação ao maior número de usuários.

Associado a esse quadro, corre em paralelo a exposição de mulheres por parte de namorados ou maridos como uma conquista ou objeto, por se enquadrarem numa espécie feminina esteticamente perfeita, dentro da demanda atual de sensualidade e de desejo. Geralmente, nesses casos, a mulher abdica da carreira para ser sustentada pelo homem, mesmo que tenha qualificação profissional para ter a sua independência financeira. Querem com isso uma volta ao passado, ao “sonho americano” (EUA, década de 60), de mulheres aptas exclusivamente para cuidar e servir aos caprichos do homem?

Um caso extravagante ocorreu em uma premiação mundial recente em que um ícone levou sua esposa, inicialmente coberta por um caríssimo casaco de pele. Mas, ao sinal do marido, diante dos fotógrafos, a jovem esposa de 30 anos deixou cair seu rico casaco, expondo seu corpo completamente nu, sem nenhuma roupa íntima, envolto apenas em um minivestido de malha transparente, deixando à mostra cada linha e traço de seu corpo dos pés à cabeça. Após esse vexame que deixou fotógrafos, investidores e público atônitos, deram-lhe um vestido vermelho para colocar sobre a malha que nada cobria. O ato inusitado custou ao protagonista da cena a perda de contratos com empresas que não aceitam tal comportamento, por serem marcas consagradas e de estilo.

O terceiro elemento nessa trilogia estranha que cito, são os “cursos para aprender a ser homem”, em que o sentido seria ele “assumir” sua voz de mando, de controle, de figura máxima e supremacista em relação à mulher.

Esse cenário pode passar despercebido para quem está desatento, mas, não escapa às pessoas que observam o padrão de comportamento da sociedade e das mídias sociais com olhar atento, analítico e cru, que não se deixam dominar nem cooptar por elas.

Há de se ter uma visão crítica, enxuta e objetiva dos conteúdos que estão sendo disparados para bilhões de pessoas abstraídas da análise tanto do ambiente real quanto do virtual.

É um retrocesso tentar desqualificar, descredenciar e vilipendiar a imagem da mulher e de seu emocional, através do uso de ferramentas de grande alcance de usuários na web, com vistas a implantar a ideia de que as mulheres não são capazes.

Este fato recente de desqualificar a mulher nos lembra muito a época em que todas as reivindicações dela eram catalogadas como “histeria”. Ainda é bem recente a data de quando ela não tinha nenhum direito a ter qualquer direito.

Ora, no Brasil, a mulher só teve acesso à garantia de ter direitos a partir de sua inclusão na Constituição Federal pela igualdade legal entre os gêneros. E isso se deu há apenas 37 anos. Ainda hoje, a mulher briga para ver esses direitos aplicados na prática. E já querem abortar esse avanço módico enquanto o machismo estrutural ainda impera?

Antes de todo o movimento por sua emancipação, a mulher era considerada incapaz de tomar qualquer atitude sozinha e era tutelada pelo pai ou pelo marido. Apenas a partir de 1961 (há 64 anos de distância de hoje, ano de 2025), com o Estatuto da Mulher Casada, ela teve direito a trabalhar sem pedir autorização do tutor (pai ou marido), a abrir conta bancária, a ter um cartão de crédito em seu nome. O pior era quanto ao desquite (figura anterior ao divórcio), em que só era direito do homem dar entrada e com isso ele ficava com a tutela geral dos filhos. A mulher só pôde pedir o desquite e pleitear a guarda de seus filhos a partir desta lei.

Percebam: se uma pessoa (homem ou mulher), estiver psicologicamente afetada, com algum tipo de dependência emocional ou sofrendo do fenômeno da transferência e isso tiver conotação anormal, ela será endereçada a um tratamento terapêutico, psicológico ou psiquiátrico.

Logo, a esfera é outra, não nas mídias sociais, não como piada, não como disparos algoritmos, não quando é para denegrir a imagem da mulher, atribuindo-lhe supostas tendências de substituição do afeto que seria de uma criança ou de um animal de verdade, por um boneco de borracha que imita um ser humano bebê.

Então, ficam as perguntas: o que se vê no ambiente da web nesses vídeos estranhos é real ou um crime contra a dignidade feminina? Por que querem depreciar o conceito de mulher, que agora é alvo de bullying por algo que não é comum e nem é com a maioria? Se houver, seriam casos pontualíssimos e isolados, dignos de tratamento personalizado.

Você também acha estranha essa onda sistematizada e levada a efeito por algoritmos que operam a serviço de mentes que direcionam as massas a acreditar no que elas querem?

Fiquemos atentos: nem tudo o que vemos no ambiente da web é verdade, nem tudo o que os vídeos e imagens trazem são reais, nem tudo o que mentes doentias querem nos fazer acreditar, existe de fato.

Que sejamos seletivos ao repassar bizarrices mundo afora. Façamos uma triagem e nos perguntemos se o que estamos divulgando é saudável, é real, é pertinente e é adequado. Principalmente: a que objetivo servem?

Vamos dar voz a essas mentes ocultas que promovem e patrocinam campanhas hediondas e difamatórias com objetivos obscuros? Pensemos bem antes de sairmos divulgando e funcionando como um instrumento útil nas mãos de manipuladores cruéis.

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