Por: Emerson Monteiro;
Inícios da década de 70, quando vivi na Bahia, em Salvador, e cursei Comunicação (com habilitação em Jornalismo), na Escola de Biblioteconomia e Comunicação, da Universidade Federal. Era o representante dos estudantes no Departamento de Jornalismo.
Uma tarde, quando menos esperávamos, eis que se nos depara Luiz Gonzaga Júnior (Gonzaguinha). Isto numa época político ultra vigiada, sem o mínimo de flexibilização cultural, em que havia censura de tudo quanto era lado. Vimos o artista subir as escadas do edifício e logo o reconhecemos. Eram diversas as salas, porém numa delas cabia mais alunos, e foi exatamente nesta que resolvi convidar Gonzaguinha a falar às turmas, que compareceram em massa naquele momento inesperado.
Fiz rápida organização, expliquei os objetivos daquela atividade e transferimos a palavra ao convidado que, em fala demorada, descreveu o quadro cultural brasileiro da ocasião. Os professores, inclusive o diretor da unidade, fizeram de conta que tudo aquilo estivesse em nossas mãos, instante esse que marcou profundamente a todos nós.
Eu me dedicava mais à disciplina de Fotojornalismo, tendo sempre comigo uma câmera. Realizei, então, algumas fotos, as quais, possivelmente, ainda existam nos acervos que me acompanham.
Lembro bem, e chego a reviver com emoção, aquele momento raro, sob o crivo da exceção nacional. Gonzaga Junior significava dos raros compositores que produziam à busca de liberdade de expressão, dentre eles, Ivan Lins, Chico Buarque, Antônio Marcos, Caetano Veloso, Edu Lobo, Gilberto Gil, Milton Nascimento e o Clube da Esquina, Jorge Mautner, Egberto Gismonti, Taiguara, Walter Smetak, etc. Tempos bicudos, de sonhos e clandestinidade, que deixaram marcas inesquecíveis na alma da gente, e hoje representam fase de luta, incerteza, esperança… Isso numa Bahia de muitas novidades e tanto movimento libertário.
Lá adiante, depois de voltar ao Cariri, uma manhã, ao chegar no Banco, me deparo com Gonzaguinha sendo atendido num dos caixas. A ele me encaminho, quando conversamos um pouco e eu lhe recordei daquela vez de Salvador, naquele instante de audácia e afoiteza, a risco doutras consequências.
Hoje recebi de meu amigo Edmar Dino, a música Estradas, desse valioso compositor e me veio à memória isso que aqui pude narrar, sentindo saudade e certeza do quanto existem das tantas histórias a circular na eternidade das memórias do nosso coração.