Por: João Vicente Machado
O jornal Senado Notícias traz uma matéria datada de ontem, 10/06/2020, com uma notícia que abalou os alicerces das instituições de ensino federais brasileiras por representar mais um golpe às instituições de ensino superior do país. Foi publicado no DOU de ontem, 10/06/2020, e a manchete principal diz: “Ministro da Educação pode nomear reitor sem consulta à comunidade acadêmica.”.
No corpo da matéria lê-se textualmente: “uma medida provisória editada pelo presidente Jair Bolsonaro autoriza o Ministro da Educação, Abraham Weintraub, a nomear reitores e vice-reitores de universidades federais, sem consulta à comunidade acadêmica. A regra pode ser aplicada para substituição dos dirigentes que tiverem mandatos encerrados durante a pandemia de corona vírus.”.
Além de dispensar a consulta à comunidade acadêmica, a MP 979/2020 desobriga a formação de lista tríplice, pratica democrática consagrada de há muito na academia, que sempre foi respeitada, levando-se em conta a autonomia universitária. Essa prática influenciou através do exemplo e induziu os estados a procederem da mesma forma em se tratando de universidades estaduais como a Universidade de São Paulo – USP, a Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP e até a nossa UEPB.
A MP também se aplica aos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia – IFETs e ao Colégio Pedro II, sediado no Rio de Janeiro.
É uma atitude que revela as intenções golpistas recorrentes do governo Bolsonaro, não somente nas Universidades, mas em todos os segmentos de governo.
Esta é a segunda tentativa de mudança das regras de escolha nas Universidades para escolha de reitores, pois a MP 914/2019 já tratava de escolher os reitores das instituições de ensino que constassem da lista tríplice sim, mas sem respeitar a ordem de votação que sempre pressupõe a escolha do primeiro colocado. Essa no dizer de Maiakovski foi à aproximação da primeira noite.
Essa mesmíssima prática foi usada com sucesso na escolha do Procurador Geral da República – PGR Augusto Aras, que concorreu à eleição interna, não obteve votos suficientes para constar na lista, ficou na lanterna não sendo obviamente incluído na lista tríplice.
Pois bem, Bolsonaro rasgou o regimento, passou por cima dessa regra e escolheu Augusto Aras como Procurador Geral da Republica. Hoje, pelas atitudes subservientes que vem adotando, ele vem se revelando o Procurador Geral de Bolsonaro – PGB e dos amigos próximos, inclusive os filhos do presidente.
Em que pese constar no texto da MP que o efeito durará pelo tempo de duração da pandemia, esse é um precedente perigosíssimo que pode representar o fim da autonomia da Universidade Brasileira e pode ser considerada a segunda noite de Maiakoski.
Tudo isso acontece às claras e sob as barbas de um congresso cuja composição nos parece a pior da nossa história.
Com tanta indiferença aos seus desvarios ele já não se esconde e vai golpe após golpe, ferindo o chamado estado democrático de direito que parece existir para inglês ver e isso sem nenhum respeito às instituições, e aos demais poderes.
Será preciso muita luta para reverter esse desmonte. O congresso nacional subjugado, majoritariamente comprometido e cúmplice com esse estado de coisas só mudará a postura se houver reação e pressão popular.
Eduardo Alves da Costa dizia em poema atribuído a Maiakovski:
na primeira noite eles se
aproximam e roubam uma flor
do nosso jardim,
e não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se
escondem.
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
até que um dia,
O mais frágil deles entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta,
e já não podemos dizer nada.