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Rogaciano Leite |
Na escassez de inspiração, hoje me vali de Rogaciano Leite para publicar essa poesia de autoria do poeta de Itapetim Pé, segundo Magda Dayse Rangel, é considerada O Ventre Imortal da Poesia.
Por ela o poeta foi homenageado na antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas e pelo que consta nos registros históricos está guardada num museu da Praça Vermelha.
A situação vivida pelo mundo do trabalho recomenda a publicação.
Os Trabalhadoresde Rogaciano LeiteUma língua de fumo, enorme, bandoleante,Vai lambendo o infinito – espessas e fatigada…É a fumaça que sai da chaminé bronzeadaE se condensa em nuvens pelo espaço adiante!Dir-se-ia uma serpente de inflamada fronteQue assomando ao covil, ameaçadora e turva,E subindo… e subindo…assim, de curva em curva,Fosse enrolar a cauda ao dorso do horizonte!Mas, não! É a chaminé da fábrica do outeiro– Esse enorme charuto que a amplidão bafora –Que vai gerando monstros pelo céu afora,Cobrindo de fumaça aquele bairro inteiro.Ouve-se da bigorna o eco na oficina,O soluço da safra e o grito do martelo…Como tigres travando ameaçador dueloAs máquinas estrugem no porão da usina!É o antro onde do ferro o rebotalho impuroFaz-se estrela brilhante à luz de áureo polvilho!É o ventre do Trabalho onde gera o filhoQue estende a fronte loura aos braços do Futuro!Um dia,de uma ideia uma semente verte,Resvala fecundante e,se agregando ao solo,Levanta-se… floresce… e ei-la a suster no coloOs frutos que não tinha – enquanto estava inerte!Foi o germe da Luz,a flor do PensamentoMultiplicando a ação da força pequenina:– De um retalho de bronze uma oficina!– De uma esteira de cal gerou um monumento!Trabalhar! Que o trabalho é o sacrifício santo,Estaleiro de amor que as almas purifica!Onde o pólen fecunda, o pão se multiplicaE em flores se transforma a lágrima do pranto!Mas não vale o Trabalho andar a passo largoQuando a estrada é forrada de injustiça e crimes…Porque em vez de frutos dúlcidos,sublimes,Gera bagos mortais e de sabor amargo!Ide ver quanto herói, quanto guindaste humanoSob a poeira exaustiva e o calor fatigante,Os músculos de ferro, o porte gigante,Misturando o suor o seu pão quotidiano.Sua força é milagre! A redenção bendita!O seu rígido braço é a enérgica alavancaO escopro milagroso,a chave que destrancaO Reino do Progresso onde a Grandeza habita!Sem os pés desse herói a Evolução não anda!Sem as mães desse bravo uma nação nas cresce!A indústria não produz! A campo não floresce!O comércio definha! A exportação debanda!No entanto,vê-de bem! Esses heróis sem nome,Malditos animais que ainda escraviza o ouro,Arrastam – que injustiça! – o carro do tesouro,Atrelados à dor, à enfermidade, e à fome!Quanto prédio imponente e de valor suntuárioErguido para o céu, firmado no infinito,Indiferente à dor, indiferente ao gritoDe desgraça que invade a choça do operário!De dia é no labor! Exposto ao sol e à chuva!De noite,na infecção de uma choupana escuraOnde breve uma filha há de tornar-se impuraNem mesmo o sono acolhe as pálpebras cansadas!O leite é a umidez dos fétidos mocambos!O pão é escasso e duro! As vestes são molambosE o calçado é paiol das ruas descalçadas!Ali,a Medicina é estranho um só prodígio!…Nunca um livro se abrirá em risos de esperançaPara encher de fulgor os olhos da criança,Apontando-lhe o céu… mostrando-lhe um vestígio!…Tudo é treva e descrença! O próprio Deus é tristeOuvindo esse ofegar de corações humanos…E a Lei – mulher feliz que dorme há tantos anos –Não acorda pra ver quanta injustiça existe!Onde está esse amor que os sacerdotes pregam?Os estão essas leis que o Parlamento imprime?O Código não pode abrir o seio ao Crime,Infamando o pudor que os Tribunais segregam!Vê-de bem da fornalha a rubra labareda!…Olhai das chaminés o fumo que desliza!…Pois é o sangue… É o suor do pobre que agonizaEnquanto a lei cochila entre os divãs de seda!Que é feito desse herói? Ninguém lhe sabe a origem!O Poder nunca entrou nas palhas do seu teto…Somente a esposa enferma,o filho analfabeto,E lá nos cabarés, – a filha… que era virgem!Existe essa legião de mártires descrentesEm cada fim de rua,em cada bairro pobre!É desgraça demais que num país tão nobreQue teve um Bonifácio e deu um TiradentesSerá preciso o sangue borbotar na lança?E o cadáver do povo apodrecer nas ruas?Tu não vestes, ó Lei, as próprias filhas tuas?Morre, pois, mãe cruel, debaixo da vingança!Mas eu vejo que breve há de chegar a horaEm que a voz do infeliz é livre – na garganta!Porque sei que esse Deus que nos palácios cantaÉ o mesmo Deus que pelos bairros chora!Quanto riso aqui dentro! E lá fora, os brados!Quantos leitos de seda! E quantos pés descalçados!Já que os homens não vêem esses decretos falsos,Rasga, cristo, o teu manto! Abriga os desgraçados!…