Memória de um tempo onde lutar por Direito, Liberdade e Justiça é um defeito que mata.

Por: Cristina Couto;

“São tantas lutas inglórias, são histórias que a história qualquer dia contará”. Foi à história de injustiça, crueldade e perversidade provocada pela inveja, pelo ódio e pela cobiça que exterminou a vida de um jovem médico de 26 anos de idade, recém-formado, recém-casado e porque não dizer recém-vivido.

Dr. Ildefonso Augusto de Lacerda Leite era o seu nome, ele foi expulso do palco da vida por não professar a fé vigente da sua época e contestar de forma clara e direta os dogmas e preceitos impostos a um povo leigo e ignorante que seguia uma religião cheia de culpas paralisantes, de cruéis castigos atribuídos a um Deus vingador que empunha pesados fardos nos ombros de pessoas que nem mesmo entendiam o que era a vida.

Eram rápidos e precisos para julgar e condenar e lentos demais para acolher e perdoar. Aliás, o perdão era um dom que somente Deus possuía agora condenar e matar era uma conduta legal e moral como forma de punição para aqueles não seguissem os caminhos estabelecidos por uma sociedade que formava verdadeiros adestradores de animais.

Foi expondo seu ponto de vista, tentando tirar das trevas em que as pessoas estavam submetidas, buscando justiça social, direito para todos e liberdade de expressão que o jovem médico foi punido da forma mais cruel e sórdida: a execução sumária.

Assim como toda pessoa que defende a vida, a liberdade, o direito e a justiça é sacrificada para servir de exemplo e mostrar o que acontece com quem tenta segui-la.   E assim a história vem escondendo o extermínio de muitos jovens que ousam desafiar o sistema autoritário, fanático e fascista no sentido da palavra.

A Tragédia de Princesa não foi e nem será um fato isolado, ela não aconteceu somente no alvorecer do século XX, ela vem se repetindo século após século, década após década, ano após ano, essa tragédia se repete todos os dias em todas as cidades, em todos os países, e em todo o mundo.

Hoje, Dr. Ildefonso é nosso farol, a luz que não se apaga. Sem pressa ele esperou em silêncio por mais de um século e ficou escondido nas entrelinhas dos poemas, nas cartas de amor, nos retratos dentro dos cofres dos velhos casarões, na tese de doutorado e na cabeça dos amantes.

Ele sempre soube que a verdade e a justiça um dia seriam feitas, ele não queria vingança, talvez, tenha sido por essa razão que seus algozes foram abatidos pela peste que o levou ao lugar da tragédia. A própria doença puniu os culpados.

A vingança planejada pela sua avó era arrasadora e avassaladora, ela queria sangue e destruição como punição, como era usual na sua época: o bacamarte e a pólvora escreveriam o epílogo da tragédia, mas, Dr. Ildefonso Leite queria justiça e verdade como pensavam os intelectuais do seu tempo, ele preferia a caneta e a tinta como penalidade. E esperou o tempo necessário para que tudo fosse esclarecido, que os fatos fossem desvendados, os envolvidos nomeados, colocando tudo em seus devidos lugares.

E, hoje, no dia 05 de dezembro de 2024, na terra onde Dr. Ildefonso Leite iniciou seu caminho intelectual entrego nas mãos de vocês a história da sua trajetória de vida e a história da sua trágica morte. A história triste de um jovem que só desejava curar, amar e viver.

Pesquisando os autos do processo, os artigos de jornais e o Memorial de Erasmo Campos, a trama e o modo de como tudo aconteceu causa indignação e desperta o senso de justiça em quem deste material tem acesso.

A covardia e a injustiça levaram sua avó, Dona Fideralina Augusto Lima, enviar para o local da tragédia um contingente de cem homens para matar apenas três, mas na verdade a velha matriarca queria destruir a vila de Princesa inteira, porque, no fundo ela sabia que todos conspiraram contra seu neto. A vingança precisava ser sórdida, cruel e arrasadora. O que aconteceu ainda não se tem certeza, é mais um mistério a ser desvendado. O Ceará tem uma versão e a Paraíba outra.

O fato é que depois do ocorrido a velha matrona se consolidou como coronela em todo o Nordeste brasileiro, sendo respeitada como tal; acabou adquirindo mais poder, fama e prestigio. Foram tantas as histórias a seu respeito que hoje é uma figura lendária, lembrada como valente, mandona e corajosa.

Sabe-se que as orelhas vindas de Princesa completaram as contas do seu rosário, no qual, ela rezava todas as noites.

 

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